Tiger 900 Rally Pro

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domingo, 16 de agosto de 2015

Viagem de moto na Inglaterra (Kawazaki ZZR 600) - 07 a 16 Mai 1996






     Chegar em Londres com uma mochila nas costas depois de cinco semanas viajando pelo Nepal foi outro choque, dessa vez ao contrário do que havia experimentado quando desembarquei em Katmandu, mais de um mês antes. 

     Peguei o metrô do aeroporto para um bairro próximo ao centro, e lembro-me como se fosse hoje da sensação de sair da estação no começo da manhã, com as pessoas seguindo para suas atividades diárias de rotina e eu ali, me sentindo um completo alienígena na cena.





     Tinha cerca de dez dias pela frente até a data do voo de retorno ao Brasil, nada na agenda, pouco dinheiro no bolso, e nem se quer uma dica de onde me hospedar.







     Instalei-me num albergue da juventude e empenhei os primeiros dias em andar à toa pela cidade, divertindo-me com a brutal diferença de mundos que vivenciava, em relação à recente experiência. Visitei os principais pontos turísticos, conversei bastante com brasileiros que moravam e trabalhavam por lá e curti de verdade o astral cosmopolita da capital inglesa, com seu ar modernista e cult.




Palácio de Buckingham


London Bridge


Praça próximo ao Palácio de Buckingham


Imperial War Museum (museu da guerra)


O famoso ônibus vermelho "double deck" de Londres



             Estátua de Ayrton Senna no museu de cera




    





   
  Mas uns quatro dias depois fui "assaltado" por uma ideia fantástica. Perambulando por umas ruas meio da periferia da cidade, passei por acaso em frente a uma loja que parecia ser uma oficina de motos, ou uma revenda de motos usadas, em que havia uma placa anunciando "aluguel de motos".

     Entrei, só por curiosidade, e puxei conversa com os caras. Eles tinham vários modelos disponíveis para aluguel, mas normalmente trabalhavam com reservas (pré agendadas).

     Ficamos só na conversa. Fui para o hostel, mas a ideia não me saiu da cabeça. "E se fizermos uma 'loucura' e alugarmos um brinquedinho desses pra dar uma volta pela região?" - fiquei pensando comigo mesmo a noite inteira. O único problema dessa ideia era o custo, não muito acessível, principalmente considerando o meu contexto particular e momentâneo.

     No dia seguinte dei ganho de causa aos meus conselheiros internos mais entusiasmados (e menos ponderados), voltei à loja e acertei o aluguel de uma Kawazaki ZZR 600 para o outro dia. Pra maximizar o uso, contratei duas diárias, começando à uma da tarde. Assim, poderia fazer três pernadas (a tarde do primeiro dia, o outro dia inteiro e a manhã do terceiro), fazendo o passeio parecer maior do que realmente era.






     A ideia inflamou os meus ânimos. À noite abri um mapa rodoviário e tracei uma rota pra fazer em três dias, considerando ainda as dicas que os caras da loja me deram.

     Aliás, o atendimento e a boa vontade dos caras que me receberam na tal loja foi determinante para que tivesse decidido por aquela "loucura". Fui extremamente bem recebido, sem qualquer tipo de desconfiança ou de "forçar a barra" no sentido de me vender o serviço. Era uma loja simples, misto de oficina e de peças sobressalentes, mas havia ali o verdadeiro espírito motociclístico.







     A viagem foi espetacular. Saí de Londres para o sudeste em direção a Dover, pequena cidade portuária na ponta do estreito de mesmo nome. Olhando do alto dos morros à beira mar era possível avistar, ao longe, os contornos da cidade francesa de Calais, do outro lado do famoso Canal da Mancha.







     No segundo dia saí cedo e fui seguindo em direção ao oeste, contornando a costa. Passei por Brighton, Southampton, Bristol e fui parar em Cardiff, moderna cidade também à beira mar já no chamado País de Gales. 







     No terceiro dia cumpri, com um misto de prazer e já de saudade, os 300 km até Londres numa pernada rápida e muito prazerosa. Ao todo rodei cerca de 1000 km.

     Há que se destacar a condução na mão inglesa, o que, nos primeiros quilômetros é muito estranho e quase perigoso, principalmente nas rotatórias, em que o sentido de entrada e saída é todo invertido. Mas com um pouco de atenção, facilmente se pega o jeito.

     Merece ainda um comentário a performance fantástica da Kawazaki ZZR 600 (irmã mais velha da nossa ZX 6). Apesar de nunca ter pilotado uma moto esportiva antes, adaptei-me facilmente e, mais do que isso, apaixonei-me pelo modo de condução, pelo som hipnotizante do motor, pela suavidade e, ao mesmo tempo, força do propulsor e pelo estilo da moto em si. Tudo foi excepcionalmente bacana.







     Muitos meses depois, recordando-me desses dias, me dei conta que eu estava numa fase muito inspirada nessa época. Minha mente estava "limpa", não me lembro de preocupações que me afligissem, estava num estado de autêntico fluxo. 







     Cabe considerar todo o contexto da viagem. A rigor, ninguém do meu círculo de relacionamento sabia que eu estava dando aquela volta, o que só contribuía pra aumentar minha sensação de liberdade e euforia. A par da impossibilidade de poder contar com qualquer ajuda caso alguma coisa desse errado, havia essa inebriante sensação de estar fazendo algo muito além do que havia imaginado para a ocasião, sem qualquer planejamento prévio, sem qualquer complicação comum nesse tipo de coisa. Esse conjunto de condições meio que define a sensação do momento, e é muito, muito rara de se conseguir.

     De volta a Londres, devolvi a moto na loja, agradeci sinceramente aos caras que me auxiliaram na locação e até no planejamento da viagem, e tratei de me preparar para o retorno ao Brasil, marcado para dali a dois dias.

     A partir daí começaria outra fase. A dura volta à realidade. Mas isso já é outra história. 



P.S.

     Alguns meses mais tarde a revista brasileira "Duas Rodas", especializada em motociclismo, publicou uma reportagem na edição Nr 252 (ano 21) sobre essa viagem:














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