Essa viagem foi uma das mais desejadas e belas que já fiz. E também uma das mais difíceis de implementar.
Naquela época estava no meu segundo ano em Boa Vista, e já transferido pra Curitiba a partir do ano seguinte. Estava sem moto havia quase dois anos, e estava muito sedento por voltar ao mundo das duas rodas.
A ideia de adquirir uma motocicleta do modelo GS, da BMW, habitava meu imaginário havia muito tempo.
O projeto original dessa viagem era do ano anterior (2009), e previa ir de moto de algum ponto no sudeste do Brasil até Boa Vista, pela costa oeste da América do Sul. Mas na ocasião não foi possível tirar as férias previstas devido a alguns probleminhas no trabalho...
O ano de 2010 começou e foi passando sem que conseguisse espaço pra sair da caixinha de rotina em que vivia. Em agosto saiu minha transferência pra Curitiba, e isso, de certa forma, tornou meio sem sentido levar uma moto lá pra cima para ter que traze-la de volta poucos meses depois. Tudo conspirava pra "deixar pra depois".
O ano de 2010 começou e foi passando sem que conseguisse espaço pra sair da caixinha de rotina em que vivia. Em agosto saiu minha transferência pra Curitiba, e isso, de certa forma, tornou meio sem sentido levar uma moto lá pra cima para ter que traze-la de volta poucos meses depois. Tudo conspirava pra "deixar pra depois".
Mas resolvi exercitar minha velha teimosia e decidi que faria uma viagem, qualquer que fosse, com a moto dos meus sonhos, naquele mês de outubro, que era o período de férias que tinha disponível.
Planejei então comprar a motocicleta em São Paulo (que, na época, era onde havia disponível na cor que desejava), e a partir de lá fazer um roteiro passando pelo Deserto do Atacama (Chile), depois descendo pra Santiago (Chile) e voltando por Mendoza (Argentina). Mas esses planos ainda seriam alterados pela realidade dos fatos.
Acertei a compra por telefone, fui pra São Paulo e lá terminei de montar o kit de equipamentos de que precisaria (malas laterais e top case, capacete, luvas, botas, etc.).
Pegar uma moto como aquela, zero km, direto da loja para o trânsito de São Paulo, e de lá para a estrada, foi uma experiência e tanto! Mas incrivelmente cerca de 300 km depois, descendo a serra em direção ao sul, o motor novíssimo da GS travou espetacularmente, sem nenhuma razão aparente. Foi o mais puro e verdadeiro anticlímax!
Pra resumir a história, alguns dias depois a BMW resolveu trocar a moto que havia quebrado por outra nova, mas essa manobra demandou mais uma semana de medidas administrativas e coordenações, o que comprometeu irremediavelmente o meu apertado cronograma.
Refeito todo o processo de montagem e emplacamento da nova moto, tive que renovar também minha confiança e entusiasmo pela máquina e pela ideia da viagem, e efetivamente começar de novo.
Revertendo a onda de dificuldades e contratempos predominante, fiz uma bela viagem até San Pedro de Atacama, no Chile, tendo tido que alterar apenas a rota de retorno, em relação ao que havia previsto, devido à falta de tempo.
As paisagens do Deserto do Atacama e da travessia da Cordilheira dos Andes foram um bálsamo de beleza em meio a um mar de desafios e insegurança que vinha vivendo. Absolutamente fantástica aquela região! Valeu demais o esforço.
Na volta ao Brasil, deixei a moto na casa dos meus pais, em Brasília, e só a peguei de volta cerca de quatro meses depois, após já estar instalado em Curitiba para a nova fase.
Relembrar essa viagem e as imagens que dela ficaram traz genuína alegria ao coração, e instiga novos voos e a busca por novos horizontes.
Muito bom!
(Curitiba, Janeiro de 2017)
P.S: os textos, imagens e vídeos abaixo são parte do diário de bordo da viagem, e retratam bem algumas emoções do momento, com o "calor" do momento.
Entrega da moto na concessionária de São Paulo.
A máquina com os maleiros e bolsa de tanque. Tudo novo, reluzente.
"Depois
de um longo período de gestação eis que "veio á luz" - pelo menos à
luz do meu mundinho pessoal... - uma máquina que atende pelo nome de BMW R 1200
GS - uma obra de arte em forma de motocicleta!
E lá está ela agora, na garagem do hotel em que me encontro aqui em São
Paulo. E aqui no quarto um monte de coisas espalhadas aguardando uma ordem
e um lugar...
E na cabeça ideias girando... conceitos, questões, planos, dúvidas,
preocupações."
(diário de bordo, 09 Out 2010)
Saindo do hotel em que estava em São Paulo.
"Às duas da tarde do domingo, 10 Out, na garagem de
um hotel no centro de São Paulo, apertei o botão de ignição da GS e o som
intimidador e grave do motor preencheu o espaço... Finalmente tudo pronto. Pelo
menos aparentemente, pelo menos nesse momento, porque esse é um processo
dinâmico, como tudo... Vai evoluindo, se aperfeiçoando, se adaptando.
Subi a inclinada rampa da garagem em direção ao mundo - com seus encantos e
seus riscos... E fui seguindo pelas ruas de São Paulo sob um céu cinzento e um
tempo frio, mas sem chuva. Avenida São João, Av Duque de Caxias, Marginal
Tietê, Rodovia Ayrton Sena e aí estou no habitat - estrada boa, paisagem
bonita, o motor ronronando suave, todos os sentidos e sentimentos ligados,
movimentos suaves, um tanto solenes, e perfeita adaptação ao
"contexto".
Cento e cinquenta quilômetros depois estou em Taubaté. Tudo funcionou bem - a
moto, as malas, o piloto... Carece fazer alguns ajustes na bagagem (deixar
coisas), assimilar os acontecimentos, manter a concentração e "prosseguir
na missão". Grata missão.
Sentimentos predominantes: ainda um pouco de insegurança, o peso da
responsabilidade, e uma tranquilizadora paz de espírito.
E assim vamos levando a vida."
(diário de bordo, 11 Out 2010)
O sonho materializado.
O anticlímax absoluto.
"Como um espetáculo do paradoxo que permeia e
espreita nossa vida, a GS "pifou" em pleno palco. Saí hoje de manhã
de Taubaté, com um dia bonito e convidativo, em direção ao sul.
Passei pelo sempre meio confuso trânsito de São Paulo, peguei a
Régis Bitencourt e quando estava começando a ficar divertido senti algo
estranho na moto, uma ligeira falha no motor... pensei que tivesse sido engano
meu, talvez um movimento involuntário do acelerador... dois minutos depois
a máquina começou a perder potência e foi indo até apagar.
Encostei no
acostamento e tentei dar a partida. Fez um barulho muito estranho, como se
tivesse algo solto ou quebrado... Saquei rápido que era encrenca séria.
Resumindo: acionei o serviço de assistência da BMW e algum tempo depois estávamos
- moto e eu - sendo resgatados. Estou de volta a São Paulo e a moto foi
para uma base do tal serviço de assistência. Amanhã, na concessionária de
origem, vamos ver que história é essa!!
Bem, nessas horas é bom tirar da prateleira aqueles ditados prontos que podem
ajudar a lidar com a situação, como aquele que diz que "o importante não é
exatamente o que acontece, mas como reagimos ao que acontece", ou aquele
outro que prega que "devemos pensar na solução, e não no problema"...
E pensar com o espectro aberto, ou seja, "no final tudo dá certo".
Mas que é incrível o que aconteceu, isso é.
O que será que houve???"
(diário de bordo, 12 Out 2010)
"Cheguei de manhã cedo na concessionária e fui
direto pra oficina. A moto pelo menos já estava lá.
Não deve ter sido à toa que a marca BMW conquistou fama de qualidade e de
excelência no que faz, tanto em motos quanto em carros. Seus produtos, suas
lojas e seus preços impressionam, e assustam de vez em quando. Imagino que
entrar nesse mundo, a partir do mundo comum dos meros mortais assalariados é
tão incomum e surpreendente quanto a pane da GS no dia de ontem...
E a concessionária Officer aqui em São Paulo, onde comprei a máquina, não foge
à regra. A oficina fica no subsolo, numa ampla área onde se movimentavam alguns
funcionários ocupados com algumas dezenas de motos novas em caixa, sendo
desembaladas...
Procurei o chefe da oficina e começamos o papo. Ele me
perguntou o que houve, e eu lhe devolvi a pergunta. Ele pediu um tempo pra
analisar a moto. Dei uma saída e voltei alguns minutos depois. Ela estava numa
bancada, com as tampas de válvula abertas e o tal chefe dos mecânicos com uma
cara entre preocupado e constrangido... hummmm... senti o clima de problema
sério no ar.
Mas a conversa até que fluiu num tom amistoso e interessado das
duas partes. Diagnóstico e solução que é bom, nada. Ele me disse que tinham
entrado em contato com um engenheiro da BMW do Brasil (que fica aqui
mesmo em São Paulo, mas num outro bairro) para que ele fosse lá ver se
conseguia entender o que tinha acontecido... hummmmm... Saquei que a
concessionária estava querendo passar a bola pra fábrica, e eu ali...
Depois
disso subi e fui falar com o gerente/dono que havia acabado de chegar, e
já sabia do inusitado caso. Mais uma conversa sem muito o que dizer, a não
ser o repetido espanto: "isso nunca aconteceu antes..."
Se meter nessas histórias de comprar uma moto desse padrão (depois de infinitas
pesquisas e cálculos), do nada, acertar todos os detalhes, montar um roteiro de
viagem, planejar um cronograma, tendo saído lá das lonjuras das terras de Boa
Vista de Roraima, pegar a moto, partir e se ver nessa situação trezentos
quilômetros depois é mesmo pra testar a motivação
e a convicção de qualquer bom cristão... mas há que se ter calma
sempre, e saber o que se está fazendo...
Enfim, pra resumir a história: voltei na concessionária no meio da tarde pra
ver o que havia sido descoberto, ou investigado, ou resolvido, e a questão
mecânica continuava um mistério, mas em conversa com o gerente/dono, com quem
havia tratado da compra desde o início, chegamos a um acordo (não tão
facilmente, quanto pode parecer por essas rápidas palavras): a BMW vai
substituir a moto por outra idêntica, zero km ("esse procedimento não
é padrão, mas conseguimos", disse-me).
Agora é "pára tudo, desce todo mundo e vamos começar tudo de novo"...
Faturar nova moto, trazer do depósito, montar, fazer revisão de entrega,
emplacamento, etc e tal, e nessa brincadeira vai pelo menos mais uma semana...
E o meu cronograma e demais coordenações foram pro saco... mas essa história,
ou seja, esse período de férias, ainda não acabou, porque no
final tudo dá certo (pois é, se não está dando certo, é porque ainda não chegou
no final...)"
(diário de bordo, 13 Out 2010)
"O nosso mundo hi-tech pós-modernista tem uma aura de invencibilidade. Mais do que isso: tem a propaganda, a promessa, a fantasia da perfeição e do domínio de tudo (da natureza, das máquinas, dos ritmos da vida, da própria vida...). E nós, os tripulantes meio ao acaso dessa nave-mãe, temos a tendência de nos deixar embalar por esse canto da sereia. Aí começamos a achar, quase sem perceber, que a ciência sabe e pode tudo, que a tecnologia é sábia e infalível, e que nossa vida, circunscrita nessa redoma imaginária de pseudo-conhecimento e pseudo-segurança, está protegida e a salvo de contra-tempos e de colapsos... É ou não é mais ou menos assim?
Mas o fato é que nossa segurança e nossas garantias reais, em todos os sentidos, são inversamente proporcionais à força e ao poder que elas parecem ter. Em que pese teorias e opiniões (e desejos) em contrário...
Tem uma historinha bem legal que conta que "há muito tempo atrás, numa vila distante de um distante reino perdido nas montanhas das terras do sul, um jovem, certo dia, ao cuidar do seu rebanho de ovelhas nas redondezas da tal vila, tomou para si um bonito cavalo selvagem que a ele se achegou mansamente sem mais nem menos. E o povo da vila ficou comentando da sorte do tal rapaz... Alguns dias depois, ao montar o cavalo de forma mais repentina, acabou caindo e quebrando a perna... E as pessoas passaram a falar do azar que foi ele ter caído, justamente às vésperas de uma competição importante que ia ter com a povoado vizinho... Passaram-se mais alguns dias e o reino entrou em guerra com um outro reino, e o rei convocou todos os jovens para a guerra. Mas o jovem do cavalo selvagem não pôde ir por estar com a perna quebrada... Os vizinhos, tendo perdido seus filhos para a incerteza do combate, passaram a resmungar sobre a sorte que foi o rapaz estar com a perna quebrada em momento tão crítico... Algumas semanas mais tarde o tal cavalo fugiu do estábulo e desapareceu nas montanhas... E todos se referiram ao fato como muito azar, justo agora que iam começar os trabalhos de colheita e o animal ia ser de grande valia... Mas eis que dois dias depois o cavalo retorna trazendo consigo uma manada de cavalos selvagens, que foram prontamente tomados pelo jovem e sua família e postos a trabalhar em prol da vila... "Muita sorte", diziam todos..." E por aí vai.
Moral da história: não dá pra levar muito a sério avaliações imediatas e superficiais (e talvez nem mesmo as profundas) dos acontecimentos. Nossos caminhos são tão repletos de opções e possibilidades, cada um deles com outras tantas e incontáveis ramificações, que só de pensar desanima qualquer análise que se pretenda séria...
O que podemos fazer a respeito?
Talvez ter consciência e procurar fazer o melhor em cada situação.
E, ok, talvez seja producente colocar também uma fezinha..."
(diário de bordo, 17 Out 2010)
A "nova moto nova" sendo inicializada no computador da BMW.
"Hoje faz
oito dias desde a surpreendente pane na GS. Nesse tempo estive aqui
"elaborando" (ou tentando elaborar) essa situação. Precioso tempo...
Passei hoje na concessionária pra checar o andamento da preparação da
outra moto e tudo está de acordo com o previsto: a moto está pronta,
montada, revisada e a documentação fica pronta amanhã. Resta torcer para
que desta vez dê certo.
E saiu o diagnóstico do que houve com a "primeira" moto: segundo o
tal engenheiro da BMW uma certa trava se soltou dentro do motor, e na sequência
ocorreu um pequeno problema de entortamento de válvulas e comprometimento
do pistão, do cilindro e de tudo mais que tinha pela frente... "Ainda
bem" que foi uma encrenca grande. Acho que seria mais revoltante se
fosse uma besteira. Agora, o por que do por que não se sabe, quer
dizer: por que a tal trava se soltou só Deus sabe (vai ver um alemão
daqueles da linha de montagem lá na Alemanha dormiu mal a noite e deu
uma cochilada na hora de montar esse "detalhe"... vai saber...)
Mas esse troço não era pra ser "unstoppable" (esse é o slogan do
marketing da GS, que quer dizer algo como "que não pode ser
parada")? - pois é... é aquela história do excesso de confiança que o
nosso mundinho tenta nos passar...
Parodiando um desses ditados populares, diria que caldo de galinha e um
pouquinho de humildade não fazem mal a ninguém (estou pensando em sugerir à BMW
repensar esse slogan)..."
(diário de bordo, 19 Out 2010)
Novo começo: 1 km no odômetro.
"Resiliência
Conforme
prometido pela concessionária BMW Officer, de São Paulo, ontem à tarde, no
apagar das luzes, a nova 1200 GS estava pronta - máquina e documentos.
Um fim de
tarde bonito em São Paulo, misturado ao típico trânsito da hora do rush,
e uma lua tranquila no céu azul escuro deram o tom naquele momento sempre
um tanto marcante. Da parte da concessionária apenas o tratamento
rotineiro, como se vende pão na padaria da esquina...
Mas cabe
aqui um reconhecimento à atitude profissional e honesta da empresa no
tratamento dessa questão da quebra da máquina na semana passada. No
primeiro dia útil após a pane já se decidiu pela troca da moto por uma nova,
antes mesmo do parecer conclusivo do engenheiro da fábrica. A demora foi devido
ao tempo inevitável do trâmite burocrático necessário. É aquela história:
nessas horas é bom ter por trás uma marca que respeita o seu cliente e que,
mais do que isso, respeita o seu próprio nome.
Hoje de
manhã cedo, sem mais perda de tempo, colocamo-nos (a moto e eu) na estrada,
rumo ao sul - Curitiba. A saída de São Paulo é sempre aquele tumulto meio
controlado, meio fora de controle. "Gerenciar" uma moto nova, com
carga total, com um trânsito nervoso, com ter que achar o caminho (placa/
mapa/ gps...), com ideias girando na cabeça é um processo bem
interessante.
E logo em
seguida o trânsito travado da Rodovia Régis Bitencourt, com congestionamento de
caminhões descendo a serra, e ainda aquele clima de urgência das cidades
grandes. Depois o ambiente foi mudando aos poucos, ficando mais desanuviado, e
a viagem rendeu bem. Toquei o solo em Curitiba no começo da tarde, bastante
satisfeito com o meu novo recorde de distância numa BMW sem quebrar [risos]...
Dirigi-me
então à concessionária local pra agendar a revisão de mil km pra amanhã.
"Sinto muito, mas só fazemos revisões de segunda a quinta..." -
disse-me o recepcionista da oficina. "Meu amigo, veja bem..." Um
pouco de conversa e tudo se resolveu: marcamos pra amanhã.
Mas como
até aquele momento só havíamos feito quatrocentos e poucos quilômetros,
fui obrigado a pegar a estrada de novo... Desci a serra do mar em direção ao
litoral, sem as malas laterais e o top case, "just for fun"... E foi
o passeio pra redimir esse passado recente dos últimos dias: céu azul, sol de
fim de tarde, paisagem bonita e lá estava o mar novamente... Que bom rever
o mar depois de tanto tempo. Uns minutinhos de contemplação, umas fotos e de
volta pra Curitiba."
(diário de bordo, 21 Out 2010)
Em Caiobá, litoral do Paraná. Dando umas voltas...
No interior do Paraná. Araucárias, névoa e ligeira desolação.
"Vastas
terras passando rápido pelos horizontes amplos da minha pequena máquina de
viajar. "De repente" estou em Resistência, uma cidade ao norte da
Argentina, porta de entrada da região do Chaco... E caminho para o Deserto do Atacama...
Ou para lugar nenhum...
Na sexta-feira, conforme o previsto, a GS parou pra revisão de mil km e passou
bem no teste: sem alteração. Troca de óleo, de filtro, uma consulta ao oráculo
chamado computador e "pau na máquina" por mais nove mil quilômetros.
Ontem saí de Curiitba em direção a Foz do Iguaçu sob um céu cinzento e previsão
de chuva. E no meio daquela paisagem extremamente bucólica do interior do
Paraná, em pleno sábado à tarde, debaixo de uma chuva fina, rodando na ponta
dos dedos por aquele asfalto "talvez escorregadio", meus pensamentos
foram parar nas terras de uma melancolia sem tamanho... Nananinanão!
Peguei meus pensamentozinhos pela mão e trouxe-os de volta para o lugar certo -
"desafio, meu caro!!".
Hoje a viagem tomou aquela cara de "expedição": cruzar fornteira,
outro país, outra língua, outra moeda, coisas diferentes... Estradas boas,
tempo bom, e altos e baixos de rendimento e de astral. Cheguei onde pretendia
por volta das cinco da tarde. O tempo estava com cara de chuva, e a próxima
cidade fica a 160 quilômetros de distância... Teria sido bom fazer mais essa
pernada pra facilitar a de amanhã, mas o meu "oráculo interno" me disse que estava de bom tamanho.
Aí palmas para o meu novo brinquedinho tecnológico - o GPS Zumo 660 - , que me
pegou pela mão e me trouxe fácil até um hotel próximo (uma hotelzinho bem
meia boca, diga-se de passagem, mas tudo bem, talvez fosse exigir de mais do
Zumo que ele tivesse esse discernimento, além do que, cansado como estou, tudo
é festa)."
(diário de bordo, 24 Out 2010)
Saindo do Brasil, por Foz do Iguaçu.
Estradas argentinas.
"Rally del Chaco
Foi assim que me senti hoje, como se estivesse
participando de um rally de um homem só: estrada tranqueira, paisagem monótona,
povoados muito pobres, muitos animais na beira da estrada e quilômetros que não
acabavam mais exigiram um degelamento rápido das minhas habilidades
motociclísticas. Essa é a Estrada do Chaco, que, olhando no mapa, são quase 500
km de reta. Na prática não é exatamente assim, porque tem umas curvinhas sutis,
mas ainda assim é bem reto.
Ínteressante ver a geografia mudando ao longo do dia, com o passar dos quilômetros. Na
região da Estrada do Chaco é tudo plano, não se vê um morro; vegetação seca,
pobre, com aquele aspecto hostil. Depois começaram a aparecer uns morrinhos ao
longe e a paisagem ficou mais normal.
O tempo esteve bom o dia todo. No final da tarde começou a nublar e esfriou um
pouco.
Estou em San Salvador de Jujuy - uma cidade no noroeste da Argentina, a uns 300
km da fronteira com o Chile. Resolvi ir até San Pedro do Atacama, pra conhecer
o Deserto e ver como é a região. Com esse roteiro, amanhã é o dia de atravessar
a Cordilheira dos Andes, pelo Passo de Jama, que fica, parece, a 4700
metros de altitude. Vamos conferir.
Hoje de manhã um erro de avaliação me custou um pequeno incidente: estava
rodando na estrada e senti a necessidade de parar pra colocar a balaclava,
porque estava um pouco frio. Diminuí a velocidade e entrei para o acostamento,
que não é bem um acostamento, mas sim aquele trecho de terra que fica entre a
estrada e a vegetação. Só que, devido à chuva da noite, estava molhado e havia
lama. Não deu outra: a GS derrapou e não houve como segurar: um tombo bobo,
quase parando. Felizmente sem consequências, nem para a moto nem para o piloto,
a não ser o susto e aquela indigesta sensação de insegurança. Devidamente
redimida ao longo do dia.
Apenas três dias desde que saí de Curitiba. Mas parece muito mais. É aquela
dimensão relativa do tempo. Tempo vezes quilômetros é igual a sensação de muito
mais tempo... Caramba, isso daria uma tese..."
(diário de bordo, 25 Out 2010)
Próximo de Purmamarca (Argentina), no sopé da Cordilheira dos Andes.
Feirinha de artesanato em Purmamarca. Cultura andina.
Subindo a Cordilheira, Argentina.
No alto da Codilheira dos Andes, deserto a perder de vista.
"Posto de gasolina" em Susques (Argentina).
Abastecimento próximo de Susques.
A beleza e a vastidão impressionantes da Cordilheira dos Andes.
Fronteira Argentina-Chile, Paso de Jama, 4.320 m sobre o nível do mar.
A imponência singular do Vulcão Licancabur (Chile).
A fantástica descida para San Pedro de Atacama (Chile).
Chegada em San Pedro de Atacama (S. P. A.).
"Qualquer
coisa que eu escreva aqui vai ser infiel à vivência da jornada de ontem. No
mínimo eu teria que dominar a arte de escrever em versos, mas como esse dom
está fora do espectro das minhas habilidades, vou ter que me resignar à limitação
desse pobre quebra-cabeça de palavras em prosa.
Absolutamente
encantador e revigorante o trajeto entre San Salvador de Jujuy e San Pedro de
Atacama, onde estou. Paisagens de tirar o fôlego!... Cerca de uns 50 km depois
de Jujuy a estrada começa a escalada rumo às alturas. Por uma sequência
interminável de curvas de 180 graus, a estrada vai serpenteando as encostas das
montanhas e a pilotagem fica na base de segunda, terceira e às vezes quarta
marcha, bem devagar e bem gostoso.
Já no
alto começam as paisagens cinematográficas da Cordilheira dos Andes, embaladas
por uma estrada espetacular (asfalto perfeito, pouquíssimo movimento), curvas
suaves, velocidade mais empolgante. As montanhas se revezam com horizontes sem
fim, tudo colorido pelo azul chocante de um céu sem nenhuma nuvem e pelos
diversos tons de marrom e cinza (e suas nuances) das encostas. E silêncio,
vento e nenhum sinal de presença humana, e nada de vegetação. Somente
areia e pedra. Tudo isso sob o fundo musical de um motor boxer roncando a
suaves rotações em rápidas e constantes mudanças de marcha... Será que deu pra
ter uma ideia?
Beleza é
um tema bastante complexo. A mim, a beleza da natureza exerce um encantamento
muito especial. É como um bálsamo. E, de todos os ambientes naturais, as
montanhas têm, definitivamente, uma magia peculiar. O mar é bonito. O campo é
bonito. A selva tem a sua força. Mas as montanhas têm um que de sagrado, de
desligamento do mundo. São uma espécie de outro mundo.
É
impróprio comparar belezas, mas me metendo nessa impropriedade, eu diria que a
beleza do Deserto do Atacama está no mesmo nível das Montanhas Rochosas do
Canadá e do Himalaia, no Nepal - outras regiões em que já estive. São lugares
diferentes, e são contextos diferentes, mas o encantamento e a sensação de
plenitude são os mesmos.
Depois
que passei pelo Passo de Jama, que é a fronteira entre a Argentina e o Chile,
ainda a 160 km de San Pedro de Atacama, a situação começou a ficar um pouquinho
mais, digamos, complicada. O vento ficou bem mais forte, obrigando-me a reviver
aquela pilotagem maluca com a moto inclinada, brigando com o vento. O frio, até
então comportado, começou a fustigar. E a altitude (variando de 4200 a 4700
metros), e o seu típico ar rarefeito, começou a cobrar o seu tributo: um certo
enjôo, dificuldade de respirar, sutil tontura e mão no acelerador, porque o
bicho começou a pegar.
Os
últimos 30 km antes de San Pedro são ainda mais alucinantes, porque
"despenca-se" de quatro mil e poucos metros de altitude para os dois
mil e quatrocentos daqui de San Pedro numa descida só, quase toda
reta. Dá pra ver a cidade a 20 km de distância, com um céu enorme sobre a
cabeça e a sensação de estar descendo do Espaço para a Terra."
(diário de bordo, 27 Out 2010)
Parece cena de filme do Indiana Jones, mas é apenas o cotidiano de San Pedro.
Rua de San Pedro, sob um céu maravilhosamente azul.
"San Pedro
de Atacama tem uma atmosfera realmente muito especial e peculiar. A cidadezinha
parece aqueles povoados medievais do interior da Espanha, ou o set de
filmagem de um filme de época... O lugar consegue reunir um aspecto rústico, a
um clima cult, a um jeitão alternativo, a uma estrutura turística
completa e de fácil acesso. De quebra tem excelentes restaurantes e barzinhos
super bem transados, com boa comida, boa música, bom atendimento, uma decoração
descolada, e um astral sempre empolgante... Incrível.
Aliás,
vale destacar aqui a organização e profissionalismo dos chilenos no que diz
respeito ao turismo na região. Simplesmente impecável. Desde a farta orientação
e informação disponíveis, passando pela conservação dos locais de maior acesso
turístico até a atitude para com os visitantes. Infelizmente bem diferente de
alguns lugares no Brasil (com, por exemplo, a Chapada Diamantina).
É
interessante observar que os caras se dão ao luxo de ter as principais estradas
da região muito bem asfaltadas e manter as ruas da cidade na terra batida...
Asfaltar ou calçar essas ruas seria matar esse jeito aconchegante e
extemporâneo que a cidadezinha tem.
Fantástico
aqui, entre outras coisas, é o céu: sempre perfeitamente azul, sem nenhuma
nuvem (diz-se que a cidade tem 330 dias de sol no ano).
A
temperatura é amena durante o dia, chegando a fazer calor, e um tanto fria à
noite.
Ontem à
tarde fiz um passeio muito difundido por aqui, num lugar conhecido como Vale da
Lua. Paisagens e pôr do sol simplesmente mágicos, ao som de "The
Division Bell" e "The Final Cut", Pink Floyd, no meu Ipod...
Absurdo...
Hoje de
manhã fiz outro passeio clássico da região, ao Geyser del Tatio (um campo
geotérmico, com buracos que espirram água quente do subsolo) - a 100 km de
distância de San Pedro, na fronteira com a Bolívia - , com saída às quatro
da manhã e temperatura no local de 8 graus negativos (gelado, gelado,
gelado!!!), a 4320 metros de altitude. Também muito interessante, mas sem muita
emoção.
Querendo, e tendo tempo e grana,
a região oferece inúmeras opções de atividades e de passeios. Daqui pode-se,
por exemplo, ir ao Salar de Uyuni, na Bolívia, ou se encaixar numa
expedição de dois ou três dias para escalar um dos vários vulcões das
redondezas, com altitudes acima dos 5000 metros e visual que dá pra imaginar,
não? Também é possível alugar mountain bikes para dar uma volta pela área
(aliás, pedalar nessas paragens deve ser sensacional) e inúmeras outras
opções para todos os gostos..."
(diário de bordo, 28 Out 2010)
A simples e bela igrejinha no Centro de San Pedro.
Vale de La Luna, nos arredores de S.P.A.
Magnífico pôr do sol nos arredores de S.P.A.
Gêisers del Tatio, a cerca de 100 km de S.P.A.
Iniciando o retorno.
"Voltando
De volta à travessia da Cordilheira dos Andes. Agora de oeste pra leste.
Muito mais vento e frio do que na ida.
Termômetro da moto marcando zero grau logo após sair de San Pedro. Aquecedor de
manopla ligado, luva para frio e mãos geladas! Corpo tremendo... Também, estava
sem a tal "segunda pele"... Depois coloquei e melhorou.
Uma hora e meia pra fazer a saída na aduana do Chile (tinha um grupo de turistas
europeus na frente...). Meia hora pra dar a entrada na Argentina...
Encontrei um casal de holandeses numa viagem de 7 meses por vários países, numa
BMW 800 GS.
De novo aquele visual espetacular da Cordilheira. Lindo! Lindo! Lindo!
No trecho final, depois de descida a Cordilheira, calor! Termômetro chegou a 42
graus!!! Caramba!!!
Chegada aqui em Salta foi complicada. Tá tendo uma tal peregrinação de uma
santa amanhã... E os hotéis estão todos lotados... Trânsito, calor, barulho,
procura num hotel, não tem vaga, procura em outro, não tem vaga, até que
encontrei o escritório de turismo da cidade, e eles me encaminharam... É...
Manhã tensa por conta do frio e do vento. Pilotagem difícil, exigente,
cansativa. Mas um barato, é lógico. Faria duas vezes aquele trajeto pra não
precisar entrar nessas cidades e fazer essa romaria atrás de hotel...
Rodar, rodar, rodar... Uma hora chega."
(diário de bordo, 29 Out 2010)
"Há algo de ancestral em se viajar de
moto...
Uma semelhança, talvez, com os nossos antepassados e suas jornadas a cavalo por terras distantes, desconhecidas, inóspitas...
Há algo nesse processo que escapa, transcende, à minha própria compreensão...
Um que de incoerência lógica...
Um que de rebeldia inocente...
Um que de necessidade, disfarçada de livre arbítrio...
"Feito eu perdido em pensamentos sobre o meu cavalo"...
Hoje, sobre o meu cavalo,
entre cálculos matemáticos de quanto acelerar, quanto inclinar, quantidade de combustível versus distância a percorrer, alertas de cansaço do corpo, e todo o contexto da estrada, meus 'pensamentos pensaram' a viagem perfeita: aquela que se faz apenas por fazer, não por ter feito, não pra chegar, não pra contar...
Aquela que não precisa de pressa, porque o tempo é apenas esse.
Sem ansiedade, sem expectativas, sem cálculos...
Mas logo me perdia de novo nas mãos da realidade, e voltava a pensar em chegar, em quanto tempo faltava, e coisas desse tipo...
Há algo de infantil e de romântico em viajar de moto...
É interessante: quando viajantes de moto se cruzam na estrada se cumprimentam como membros de uma mesma tribo, parceiros de um mesmo ideal, como irmãos... que se reconhecem e se identificam... Encontrar-se pessoalmente então, é uma festa.
Há algo de mágico nessa brincadeira,
que deixa esse incrível e raro sentimento de realização...
Um dia bom hoje, sobre o meu cavalo."
Uma semelhança, talvez, com os nossos antepassados e suas jornadas a cavalo por terras distantes, desconhecidas, inóspitas...
Há algo nesse processo que escapa, transcende, à minha própria compreensão...
Um que de incoerência lógica...
Um que de rebeldia inocente...
Um que de necessidade, disfarçada de livre arbítrio...
"Feito eu perdido em pensamentos sobre o meu cavalo"...
Hoje, sobre o meu cavalo,
entre cálculos matemáticos de quanto acelerar, quanto inclinar, quantidade de combustível versus distância a percorrer, alertas de cansaço do corpo, e todo o contexto da estrada, meus 'pensamentos pensaram' a viagem perfeita: aquela que se faz apenas por fazer, não por ter feito, não pra chegar, não pra contar...
Aquela que não precisa de pressa, porque o tempo é apenas esse.
Sem ansiedade, sem expectativas, sem cálculos...
Mas logo me perdia de novo nas mãos da realidade, e voltava a pensar em chegar, em quanto tempo faltava, e coisas desse tipo...
Há algo de infantil e de romântico em viajar de moto...
É interessante: quando viajantes de moto se cruzam na estrada se cumprimentam como membros de uma mesma tribo, parceiros de um mesmo ideal, como irmãos... que se reconhecem e se identificam... Encontrar-se pessoalmente então, é uma festa.
Há algo de mágico nessa brincadeira,
que deixa esse incrível e raro sentimento de realização...
Um dia bom hoje, sobre o meu cavalo."
(diário de bordo, 30 Out 2010)
"Terra Brasilis...
De volta
ao Brasil.
Dia
bonito hoje: sol, céu azul, temperatura agradável. Estrada com trechos bem
bacanas, alguns com bastante movimento, mas a maioria até que nem tanto. O dia
rendeu bem.
À tarde
resolvi mudar a "política do silêncio" no meu capacete, "me
autorizando" a curtir uma música do meu Ipod. A combinação de um
belo trecho de estrada, um sol maravilhoso e a balada ritmada do Creedence
("Chronicle" Vol I - "Who'll Stop The Rain")
produziu um momento realmente especial dessa viagem... Junte-se a essa
fórmula a sensação de estar chegando de volta ao seu país, após uma semana
fora e dá pra ter uma ideia do clima.
Trâmites
de aduana, de saída (da Argentina) e de entrada (no Brasil), feitos, minha
energia mudou um pouco, e o encanto se quebrou de vez quando entrei no hotel
aqui em Foz e dei de cara com uma televisão ligada no Domingão do Faustão...
Nãããããooooo!!!!!!!!....... Foi demais para o meu estado quase alterado de
consciência [risos].
Na sequência, pra completar o processo de volta à
realidade, saí pra comer alguma coisa e a cidade tá naquela zoeira de domingo, misturado com uma baderna do resultado de uma certa eleição, me parece que para
presidente do Brasil... Definitivamente...
Estou
enrolado em responder a uma pergunta que volta e meia alguém me faz: "de
onde você é?"... Nem eu sei! Bem, moro em Boa Vista, no Estado de Roraima,
mas estou de mudança para Curitiba no começo do ano que vem; a moto tem placa
de São Paulo e estou indo pra Brasília (onde meus pais moram)... De onde sou?
[risos]
Amanhã: trocar o óleo da
princesa (já tá com mais de 5000 km rodados) e seguir viagem por esse
Brasilzão."
(diário de bordo, 31 Out 2010)
No interior do Paraná, a caminho de Brasília.
"Tudo o
que não se pode ter numa viagem de moto é pressa.
É preciso
respeitar o ritmo e o tempo que as coisas exigem. E isso é muito legal: ficar
atento a esse pulsar do mundo, do tempo, das distâncias. Estar sozinho nos traz
essa abertura, de prestar atenção a como fazemos as coisas, a como as coisas se
sucedem, à Terra girando rápido em torno do Sol...
Engana-se
quem pensa que as motos de grande cilindrada são para andar mais rápido, a
maior velocidade do que as menores. Nananão!! A velocidade cruzeiro
padrão para mim, numa viagem como essa, é entre 110 e 130 quilômetros por
hora, dependendo, é lógico, da estrada, do tráfego, do clima. Mais do que isso
é sinal de impaciência, e a segurança e o prazer decrescem na medida inversa em
que aumenta o stress da pilotagem.
Paradas
sempre que o nível de atenção diminui, além das necessidades, digamos, técnicas
- abastecimento de combustível, etc.
É preciso
ter atitude em cima de uma moto na estrada. Tem que ser firme, sem ser
violento, ser delicado sem ser indeciso.
Pilotar é
uma arte, que requer controle total das emoções. Se se deixar irritar ou se
impacientar é melhor parar num canto e reconectar a energia.
É preciso
entender e sentir. A máquina, a estrada, os outros motoristas, o vento, o sol,
a chuva, as curvas...
Mas, na verdade, não sei nada desse negócio de pilotar moto...
Ontem, de
volta às estradas do Brasil, me vi de volta também à gasolina mais cara da
América do Sul, a uma cobrança extorsiva de pedágio (R$ 31,10 nessa pernada
entre Foz e Ourinhos!!/ detalhe: na Argentina motos não pagam pedágio...), e às
estradas cheias de imperfeições, quebra-molas, obras intermináveis e montes de
caminhões fumacentos andando a 60 km/h, junto com carros apressados que querem
andar a 140, e motociclista que se pretende prudente tentando andar a 110...
Mas é a vida.
De manhã
cedo fiz o procedimento previsto de troca do óleo do motor da GS. Fui muito bem
atendido e recebido na concessionária da Yamaha em Foz do Iguaçu - Pico Motos -
, que, além de fazer um serviço cuidadoso e atencioso (pode ser simples trocar
o óleo do motor de uma moto, mas a diferença está nos detalhes...), ainda
rendeu um ótimo papo com o dono da loja, o Seu Pico, motociclista apaixonado,
que está planejando uma viagem de moto para o Alaska... Muito legal.
No final da tarde acabei
esticando um pouco a tocada pra chegar até Ourinhos, uma cidade um
pouco maior na região, e tive a grata satisfação de pilotar alguns quilômetros
à noite - bonito contemplar o cair da tarde na estrada (com um colorido pôr do
sol), o escurecer, o painel da GS à noite, que em conjunto com o Zumo deu
um belo painel de controle e sentir o céu noturno se abrindo sobre nossas
preocupações e expectativas, enquanto o mundo gira, indiferente a tudo e a
todos."
(diário de bordo, 02 Nov 2010)
Renovando o "sangue" da máquina.
"Hoje
mudei o meu "modo de funcionamento": de "turismo" para
"andar-andar-andar". Nada de fotos, nada de ficar olhando a paisagem,
nada de ficar pensando na morte da bezerra. Só estrada-estrada-estrada, curva,
caminhão, acelerar, ultrapassar, acelerar, parar-abastecer-comer, e
estrada-estrada-estrada! Cascando fogo do escape e dos pneus... Intimidade
total com a GS!
Acabei
saindo meio tarde de Ourinhos - nove horas da manhã - , em função de um certo
cansaço que vem se acumulando. Por volta das cinco da tarde o bicho começou a
pegar: o tempo virou e começou a chover fininho, obra numa ponte e
engarrafamento de quilômetros (tudo desviado por entre os carros e caminhões, mas
mesmo assim...), e aquele tráfego nervoso chegando a Goiânia (acho que por
causa da volta do feriado, sei lá...). Às sete e meia caiu a noite e dá-lhe
chuva e carro pra tudo que é lado... Huuummmm... Nananão!!...
Perdeu a graça a brincadeira. Saquei um hotel da manga e tirei meu time de
campo."
(diário de bordo, 02 Nov 2010)
"Uma
pernada fácil e rápida ontem me trouxe de Anápolis aos arredores de
Brasília, para a casa dos meus pais e para o final “oficial” da viagem ( 7253
km no odômetro) – e para a quebra do encanto, da tensão, do viver na estrada,
da solidão, do mundo raro do não cotidiano...
Viagens
como essa, intensas, ainda que, de certa forma, simples, repercutem e
amadurecem muito além do seu término. E certamente vou continuar curtindo seus
ecos ainda por muito tempo aqui dentro do mundinho das minhas lembranças e
devaneios.
O
sentimento desse momento é muito mais de pesar e de lamento do que propriamente
de alívio ou de felicidade. Mas a vida tem que seguir seu rumo."
(diário de bordo, 04 Nov 2010)
Itinerário de ida.
Itinerário de volta.
No final das contas, foram 7.253 km rodados
(com a nova moto).
P.S: Agradecimento especial ao amigo Caio, de São Paulo, que me prestou um importante apoio na fase de aquisição da moto e posteriormente, por ocasião da troca pela motocicleta nova.
"Aceita corajosamente os desapontamentos e eles se tornarão um desafio para um esforço maior.
Se as ambições merecem ser alimentadas, merecem o nosso sacrifício.
O preço pode, às vezes, parecer exorbitante, mas ele transformará uma derrota em vitória.
Os milagres ainda sucedem hoje.
São geralmente o resultado do trabalho do homem levado até o fim -
e, depois, um passo além do fim, e desta forma, até a vitória invisível."
(Dorothea S. Kopplin)
Gratidão.
Mais uma grande aventura compartilhada e lançada na pintura da tela da vida de nosso amigo Assis. Otimamente escrita, retrata com realidade e perfeição as emoções vividas. Continue pintando e compartilhando conosco. Grande abraço amigo. Lincoln - Curitiba
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