Horizontes da América do Sul
12.500 km de carro
entre Boa Vista-RR e Curitiba-PR,
pela costa noroeste da América do Sul
em 43 dias
em 43 dias
Essa foi uma viagem cuja ideia mexeu com a nossa imaginação e cuja realização nos marcou definitivamente, deixando lembranças extremamente relevantes a ressoar na nossa memória, dessas que, ao serem acessadas, provocam um discreto sorriso nos lábios.
Moramos os anos de 2009 e 2010 em Boa Vista-RR, e, ao final desse período, havia sido transferido pra Curitiba-PR. Precisávamos, portanto, fazer a mudança e "retornar ao Brasil". Pensamos então em aproveitar a oportunidade e colocar em prática uma velha ideia, de voltar de carro, saindo pelo norte, em direção à Venezuela, e de lá para a Colômbia, Equador, Peru, Chile e Argentina, entrando no Brasil pela tríplice fronteira de Foz do Iguaçu.
A maior preocupação inicial desse projeto era a questão da segurança, em particular na Colômbia, que, naquela época, ainda tinha histórias bem atuais da guerrilha local. Mas não havia muito o que fazer. Tínhamos apenas duas opções: ir ou não ir.
Pensamos em aliciar parceiros para a viagem, e, nesse sentido, chegamos a convidar alguns amigos que achávamos que poderiam topar a ideia, mas ninguém se animou a ponto de pensar sério na proposta.
Assim, resolvemos encarar a brincadeira sozinhos - a Mari, a Thaís (na época com oito anos de idade) e eu.
A máquina protagonista dessa viagem foi o Suzuki Grand Vitara (2.0 a gasolina, 4x4, ano 2009) que estava conosco havia pouco mais de um ano (ou seja, era praticamente novo).
Foi uma época bem tumultuada, do ponto de vista das demandas de organização e reorganização da vida. Tinha um mês de férias e um mês de trânsito pra desmontar o "acampamento" de um lado do país, fazer a viagem, receber a mudança e achar um lugar pra morar do outro lado, redefinir rotinas e voltar a trabalhar no novo posto. Pode não parecer, mas deu um baita trabalho toda essa manobra.
*** *** ***
Venezuela
06 Dez
1º dia
De Boa Vista-RR a Santa Elena de Uairen (Venezuela)
243 km
Saímos de Boa Vista às duas horas da tarde sob o peso da despedida de uma cidade e de uma fase da vida que ficava para trás, e sob a pressão de fazer dar certo o projeto no qual estávamos nos lançando. Um misto de pesar pelo que se encerrava com expectativa e receio pelo que estava por vir.
Neste dia fomos até Santa Elena, cidade venezuelana na fronteira com o Brasil, onde já havíamos ido algumas vezes. Chegando lá, no final da tarde, pegamos uma chuva torrencial que deixou toda a cidade às escuras por algumas horas. Começo difícil...
Despedida do Genor, irmão da Mari, e sua família, em Boa Vista
Partida: alegria e tristeza...
Fronteira Brasil-Venezuela
07 Dez
2º dia
De Santa Elena a Tumaremo
435 km
O dia foi marcado pela chuva e pelo céu cinza escuro praticamente o tempo todo. Além disso essa parte da Venezuela é como uma espécie de "farwest", meio inóspito, meio desolador e, já naquela época, bastante comprometido em termos de "sensação de segurança".
2º dia
De Santa Elena a Tumaremo
435 km
O dia foi marcado pela chuva e pelo céu cinza escuro praticamente o tempo todo. Além disso essa parte da Venezuela é como uma espécie de "farwest", meio inóspito, meio desolador e, já naquela época, bastante comprometido em termos de "sensação de segurança".
Do diário de bordo:
"A paisagem hoje começou soberba, com o trecho logo após Santa Elena. É a chamada Gran Sabana. Uns 150 km de campos suavemente ondulados, ponteados por buritizais, horizontes longínquos, ornamentados ainda mais ao longe pelos tepuis típicos da região. Aqui e acolá algumas tribos indígenas, rios, cachoeiras e aquele clima bucólico tão agradável. Depois veio um trecho de serra com muitas curvas e vegetação muito fechada. Mata nativa, verde escuro, com aspecto bem menos confortante. Mas a plasticidade da paisagem toda hoje ficou meio comprometida por conta do céu cinzento e da chuva agressiva que insistiu em cair quase a tarde inteira."
"A paisagem hoje começou soberba, com o trecho logo após Santa Elena. É a chamada Gran Sabana. Uns 150 km de campos suavemente ondulados, ponteados por buritizais, horizontes longínquos, ornamentados ainda mais ao longe pelos tepuis típicos da região. Aqui e acolá algumas tribos indígenas, rios, cachoeiras e aquele clima bucólico tão agradável. Depois veio um trecho de serra com muitas curvas e vegetação muito fechada. Mata nativa, verde escuro, com aspecto bem menos confortante. Mas a plasticidade da paisagem toda hoje ficou meio comprometida por conta do céu cinzento e da chuva agressiva que insistiu em cair quase a tarde inteira."
Aduana de entrada na Venezuela
08 Dez
3º dia
De Tumaremo a El Tigre
463 km
Nesse dia deixamos pra trás o aspecto de fim de mundo do sul da Venezuela e adentramos a uma região um pouco mais populosa e civilizada, mas ainda assim pouco interessante visualmente.
Do diário de bordo:
"Atravessamos então o Rio Orinoco por uma ponte muito alta e bonita. Às quatro da tarde alcançamos El Tigre.
Hoje não
houve postos de fiscalização do exército na estrada. Pelo jeito eles só atuam
nas lonjuras da Gran Sabana e da região de selva mais ao sul. Também não houve
chuvas torrenciais. Apenas chuvas esparsas. Mas o tempo continua fechado e
cinzento.
O venezuelano, via de regra, não é
exatamente um povo que podemos chamar de simpático, receptivo. O tratamento é
sempre um tanto ríspido, seco, sem abertura pra conversa. Parece que os caras
estão sempre de mau humor. Também não têm noção de distância. Não adianta
perguntar distância de nada. Ninguém sabe. No máximo respondem que “leva tantas
horas”... Desprezando um dado chamado velocidade.
Hoje
também tivemos o “prazer supremo” de encher o tanque do carro (cerca de 50
litros de gasolina) pagando cinco bolívares, ou seja, cerca de um real e vinte
e cinco centavos! O mesmo que uma coca-cola! Haja fôlego pra esse governo local
segurar essa onda. Viva o populismo latino americano!!"
40,13 litros de gasolina por 2,81 bolívares,
o equivalente a 70 centavos de real (menos de dois centavos
de real por litro!!)
09 Dez
4º dia
De El Tigre a San Carlos
561 km
Mais um dia de progresso lento e cansativo nas estradas da Venezuela. Saímos às oito horas, chegamos no destino às 19 h, e andamos apenas 560 km.
Do diário de bordo:
"A impressão que me dá quando vejo, in loco, o estado de vida
de um povo como o que vimos hoje, é que em algum lugar, em algum momento,
alguma coisa se perdeu na história da humanidade neste sofrido planeta. Parece
que as pessoas trabalham, correm de um lado para o outro, e vivem, enfim, uma
vida dura, nua e crua. Tão castigado e tão mal cuidado é o estado de tudo o que
vimos! Uma pobreza triste, feia, sem perspectiva, sem direção!...
Pode ser também (o que, aliás, é mais provável) que esta
rápida avaliação acima esteja completamente equivocada. Pelo motivo óbvio: é
uma opinião pessoal, com todo o modelo pessoal de mundo. Vai ver essas pessoas
não querem mesmo outra coisa da vida se não o que têm, do jeito que têm. Porque
se estivessem incomodadas já teriam dado um jeito de mudar.
Mais um dia difícil hoje, mas por motivos diversos dos dias
anteriores. Não choveu, em compensação o dia inteiro foi numa estradinha
tranqueira, ruim, ruim, ruim. Pista simples, sem acostamento, repleta de
buracos, ondulações, imperfeições, sem sinalização alguma, cheia de caminhões
velhos e mal cuidados (e, é lógico, com
pontos de retenção por conta de acidentes, locais com passagem para um só
veículo e por aí vai), e ainda por cima com uma paisagem sem graça e o pouco de
presença humana ao longo do caminho totalmente a la faroeste."
10 Dez
5º dia
De San Carlos a Merida
406 km
Nesse dia finalmente entramos numa área um pouco mais cênica e interessante da Venezuela, a região montanhosa da cidade de Merida, onde, de certa forma, começa a Cordilheira dos Andes.
Do diário de bordo:
"Hoje, tomando o café da manhã no
hotel em que passamos a noite, um homem, observando o nosso carro com placa de
um local já tão distante, se aproximou de mim e puxou conversa sobre a viagem.
Logo depois retornou e nos deu de presente um pequeno exemplar de bolso do
“livro sagrado do Zohar”, “para nos dar sorte e proteção”, disse. Um gesto simples,
mas significativo e cheio de boa energia.
“El Universo si inició,
no con un átomo o una partícula sub atómica, sino con un pensamiento en la
miente de Dios. Este pensamiento de creación abarcaba un mundo en el cual cada
ser humano podría disfrutar de uma felicidad y satisfacción total, libre de cualquier forma de caos o
dolor. Este es el deseo y el propósito del Creador.” – assim diz o Zohar.
No começo da tarde, faltando apenas
uns 140 km para chegar a Mérida, entramos numa estradinha secundária e de
repente, numa curva, a geografia e o aspecto da estrada mudaram radicalmente.
Para o bem e para o mal.
Típica estradinha de montanha:
estreita, sinuosa, e inclinada, subindo. Vegetação exuberante de muito verde.
Andávamos a uma média de 40 km por hora. Curva atrás de curva. Pelo caminho,
simpáticos vilarejos, e aquele clima bucólico e acolhedor, finalmente.
A estrada subiu a 3400 metros de
altitude e depois começou a descer. Os vilarejos foram se tornando mais
próximos uns dos outros, e o ritmo da viagem ainda mais lento.
Nas encostas das montanhas,
plantações sendo irrigadas, trabalhadores preparando a terra para o plantio e
casas isoladas ao longe davam o tom da paisagem.
Arquitetura alpina nos Andes
"Artesania" à beira da estrada.
11 Dez
6º dia
Mérida
Tiramos o dia pra descansar da estrada. Fizemos uns passeios pela cidade, almoçamos num lugar decente e dormimos duas noites no mesmo hotel.
Do diário de bordo:
"Mérida tem, como principal
argumento turístico, o mais longo e mais alto teleférico do mundo, que chega
aos 4800 metros de altitude e 13 km de extensão. Mas não está funcionando.
Fomos até o local de sua base, apenas pra conhecer. Havia uma senhora moradora
de uma casa ao lado do tal lugar estacionando o carro. Puxei conversa: “Está
cerrado para manutencion?” “Que manutencion que nada!! Política!!”, disse-me,
em tom meio revoltado. Em seguida disse-me que está fechado há mais de três
anos porque “Chaves não gosta dos ricos”. “Nem dos turistas”, disse-lhe. “Si,
si”...
A cidade de Mérida em si não tem
nada demais. Bonito é o entorno. A cidade é rodeada de altas montanhas cobertas
por densa vegetação. O centro tem um trânsito caótico e lentíssimo. Mas o
aspecto geral é infinitamente melhor do que o restante do país por onde
passamos.
Agora estou entendendo porque os
locais se referem a distância em termos de tempo. É porque o importante não é a
distância, é o tempo. Perguntei a alguns cidadãos locais a distância até San
Cristóbal (que, segundo alguns guias e mapas, é de 260 km), e os caras
respondem: “de cinco a seis horas”. Sinal de estrada difícil pela frente."
Mari e Thaís segurando uma cobra, no zoológico da cidade
Almoço num restaurante bacaninha
12 Dez
7º dia
De Mérida a San Cristóbal
270 km
Esse foi nosso último dia de estrada na Venezuela. Estradas difíceis e tempo chuvoso mais uma vez.
Do diário de bordo:
"Há muito tempo atrás (em 1999,
pra ser mais exato), na viagem solo que fiz pela Nova Zelândia, de bicicleta,
um dia, numa cidadezinha daquelas da costa oeste da ilha do sul, ao chegar num
hostel ao final de um dia de pedalada, vi na parede um quadro com uma foto
bonita (que não me recordo bem qual era) e os dizeres: “Grace under pressure”
(graça sob pressão). Entendi o espírito da coisa. E vou lhes dizer: não é fácil
viver esse conceito.
Saindo de Mérida hoje, a estrada
começou de forma bastante cênica. Descendo de 1650 metros de altitude (em
Mérida) para os 200 a 300 metros em cerca de 50 km, acompanhando um vale
magnífico com encostas de montanhas extremamente altas, um rio nervoso de águas
leitosas ao fundo, túneis cortando as montanhas e a estrada em si bastante boa.
Terminada a descida da serra a
paisagem mudou novamente: vegetação comum e estrada sem graça. Alguns
quilômetros depois nova serra e “lá vamos nós para cima de novo”. Mas a estrada
estava bem pior dessa vez, com várias encostas caídas e trechos da estrada
semi-destruídos. Pra piorar, começou a chover e uma neblina reduziu a
visibilidade drasticamente. Hummmmm... Estava demorando pra complicar...
Por volta de uma e meia da tarde
estávamos em San Cristóbal. O único probleminha é que todos os
postos de gasolina da cidade (e dos últimos 100 km) estavam fechados hoje.
Disse a recepcionista do hotel que amanhã eles reabrem normalmente. A mim
pareceu um problema de abastecimento mesmo (alguns tinham placas informando que
não havia gasolina). Coisas da Venezuela... Mas ainda temos certa autonomia."
Tempo fechado e chuva: condições difíceis de novo
*** *** ***
Colômbia
13 Dez
8º dia
De San Cristobal (Venezuela) a Cúcuta (Colômbia)
70 km
Esse dia ficou por conta apenas de atravessar a fronteira Venezuela-Colômbia e acertar os papéis de entrada do carro.
Do diário de bordo:
8º dia
De San Cristobal (Venezuela) a Cúcuta (Colômbia)
70 km
Esse dia ficou por conta apenas de atravessar a fronteira Venezuela-Colômbia e acertar os papéis de entrada do carro.
Do diário de bordo:
"Levamos uma canseira hoje pra
conseguir atravessar essa fronteira e regularizar todos os trâmites aduaneiros.
Precisamos de cerca de quatro
horas pra percorrer os 40 km de San Cristóbal até a aduana de saída da
Venezuela. Trânsito absolutamente caótico. Quilômetros e quilômetros de
engarrafamento, confusão, e gente pra tudo que é lado. A autêntica ‘cara’ da
América Latina. Se não fosse tão difícil, seria até engraçado.
A entrada na Colômbia não
demorou. O que foi muito enrolado foi a entrada do carro. Perdemos a tarde
inteira pra resolver todas as exigências da aduana.
Cucuta, a cidade colombiana
próximo à fronteira, é bem grande, e tem o mesmo trânsito nervoso e
desorganizado da sua vizinha venezuelana. A cidade é também igualmente suja e
de aspecto pouco simpático, mas parece que tem boa estrutura de comércio e
serviços (com exceção de postos de gasolina. A gasolina é vendida em galões em
cima das calçadas, tipo camelô. Certamente devido ao preço fora da realidade do
país vizinho)."
Trânsito extremamente confuso e lento na fronteira
14 Dez
9º dia
De Cucuta a Bucaramanga
200 km
Nesse trecho saímos do interior da Colômbia para uma área mais central, passando por regiões montanhosas bem bonitas e isoladas.
Do diário de bordo:
9º dia
De Cucuta a Bucaramanga
200 km
Nesse trecho saímos do interior da Colômbia para uma área mais central, passando por regiões montanhosas bem bonitas e isoladas.
Do diário de bordo:
"O dia hoje começou com um
prognóstico sombrio. Amanheceu chovendo e com o céu completamente fechado,
carregado. Ao entregar as chaves do quarto na recepção do hotel em que ficamos,
perguntei á recepcionista qual a direção de saída para a estrada para Bucaramanga,
para onde nos destinávamos. A moça, muito simpática e solícita, explicou-me a
direção pedida, e, como informação adicional, sacou um rádio e fez contato
direto com a Polícia Rodoviária da estrada a que nos dirigíamos, e me passou
que a estrada estava aberta até um povoado a meio caminho do nosso destino, mas
além desse ponto não tinha informação. Esclareceu-me ainda que havia muitos
deslizamentos na estrada, e que era um caminho “mucho peligroso”. Hummmmmm....
Senti um clima de instabilidade no ar.
Ao pegarmos a estrada a chuva aumentou. Senti uma forte sensação de
insegurança e já começava a arquitetar alternativas (sendo que a única razoável
era voltar a Cúcuta e esperar a melhora do tempo e a eventual liberação da
estrada). Mas fomos tocando.
Aos poucos, incrivelmente, foi
parando de chover até que o tempo abriu totalmente e o céu chegou a ficar azul.
Então começou a montanha russa. A estrada começou a escalada às alturas e a
geografia ganhou contornos dramáticos. Na estrada, trânsito intenso de
caminhões e vários trechos com sinais de deslizamentos, árvores e pedras
caídas, e pontos com passagem para um só veículo.
Numa seqüência interminável e
alucinante de curvas, subimos até os 3200 metros de altitude. A velocidade não
passava dos 30, 40 km por hora. A paisagem ficava cada vez mais pitoresca e
interessante. Pequenos vilarejos, plantações de batata, caminhões e ônibus
típicos e aquele clima de montanha davam o tom do ambiente em que nos
encontrávamos.
Nos últimos 30 km, a estrada desceu
dos 3200 para 1000 metros de altitude, num zigue-zague realmente
impressionante. No meio da tarde, contrariando a perspectiva do início do dia,
e quase oito horas depois de partirmos, chegamos a Bucaramanga e instalamo-nos
num hotel.
Nesse trecho da estrada passamos
por uns quatro postos policiais e uns dois ou três do exército. Solicitaram que
parássemos umas quatro vezes. Pediram os documentos e fizeram algumas
perguntas, sempre de forma muito educada e respeitosa. A um dos policiais
perguntei a respeito da guerrilha, a que ele me respondeu: “no, no, mui
tranqüilo”. Mas vimos uma faixa (que infelizmente não fotografamos) num dos
povoados por que passamos, incentivando os guerrilheiros a mudar de vida –
alguma coisa como: “guerrilheiro, outra vida é possível – abandone as armas”.
Esse trajeto entre Mérida, na
Venezuela, e aqui onde estamos, era dos que mais me preocupava e instigava,
pela falta de informações e por passar por uma área muito do interior dos dois países,
em plena região amazônica. Agora, de certa forma, estamos numa rota mais
central na Colômbia, a Cordillera Oriental, no caminho de Bogotá, a capital, o
que, imagino, deve tornar o trajeto um pouco mais civilizado.
Assim é a venda de gasolina em Cucuta
Trânsito pesado e estradas estreitas
Muita chuva e deslizamentos ao longo da estrada
Bucaramanga, vista da estrada, antes de chegar à cidade
Igreja em Bucaramanga
15 Dez
10º dia
De Bucaramanga a San Gil
105 km
Fizemos uma pernada mais curta hoje pra tentar dar uma aliviada na pressão por que passamos nos últimos dias. Aproveitamos pra visitar um parque local e brincar um pouco com a Thaís.
Do diário de bordo:
10º dia
De Bucaramanga a San Gil
105 km
Fizemos uma pernada mais curta hoje pra tentar dar uma aliviada na pressão por que passamos nos últimos dias. Aproveitamos pra visitar um parque local e brincar um pouco com a Thaís.
Do diário de bordo:
"A geografia mudou radicalmente em
relação a ontem. A paisagem da estrada é fantástica. A cadeia de montanhas da
Cordillera Oriental é fabulosa. Tem mais cara de montanha, porque não tem
cobertura vegetal como as montanhas do trecho de ontem.
A estrada tem trechos
extremamente sinuosos. Muitas, muitas curvas. E muitos caminhões. O que torna o
trânsito muito lento, e as ultrapassagens, difíceis. A velocidade raramente
passa dos 50 km por hora. E muitas subidas, logicamente. É realmente muito
bonito e pitoresco. Pena que seja tão lento e trabalhoso.
Os colombianos são bastante
simpáticos e prestativos. Bem mais “fáceis” de lidar do que os seus vizinhos
venezuelanos. O pouco que vimos do país até agora também é mais interessante do
que vivenciamos na semana que passamos na Venezuela. Os preços das coisas, em
compensação, são mais altos."
Nessa região só tem montanha - geografia dramática!
O teleférico do Parque Nacional Chicamocha
16 Dez
11º dia
De San Gil a Bogotá
310 km
Do diário de bordo:
"Acho que, de certa forma, nossa
visão de mundo desses tempos modernos é altamente distorcida e irreal. Desde a
tal televisão até nosso fabuloso sistema acadêmico-universitário, passando por
nossas escolas, nossa sociedade, nosso sistema cultural... parece que tudo gira
em torno de idéias limitadas e parciais, querendo se passar por universais e
atemporais.
Passando por alguns povoados ao
longo da estrada, observando pessoas as mais diversas e inúmeras ao longo desses
dias, fico pensando que em cada uma dessas pessoas existe uma história de vida,
um mundo único e real, muito além do que imaginamos, do que vivemos, do que
ouvimos falar... Imaginemos então ao redor desse pequeno mundo chamado Terra.
Seis bilhões de pessoas...
O problema é a excessiva
concentração no nosso próprio quintal e nossos próprios valores. De certa
forma, viajar tem o poder de, independente da nossa intenção, quebrar essa
bolha de confiança que tende a se formar em torno do nosso dia-a-dia.
Hoje viemos bem de San Gil para
Bogotá. A estrada continuou difícil e interessante por quase todo o percurso. A
paisagem mudou um pouco novamente. A vegetação voltou a aparecer em campos bem
verdes e matas esparsas.
Passamos por alguns postos
policiais, mas em nenhum fomos parados. Aqui na Colômbia as estradas são
pedagiadas – hoje passamos por uns três pedágios (mais ou menos sete reais cada
um). Na Venezuela passamos também por várias estações de pedágio, mas todas
desativadas, abandonadas, caindo aos pedaços."
Chegando a Bogotá
Shopping Center em Bogotá, tentando entrar no clima de Natal
17 Dez
12º dia
De Bogotá a Armênia
294 km
Do diário de bordo:
Eu, que achava que tinha visto o
lado radical da Colômbia no trecho entre Cúcuta e Bucaramanga, tive que rever
as minhas avaliações hoje.
A gente tenta manter o contexto
da viagem dentro de um parâmetro de normalidade, de segurança, e, se possível,
de curtição, mas nem sempre dá. O final do dia hoje foi bem intenso. Às quatro
e meia da tarde estávamos a vinte quilômetros da cidade aonde pretendíamos
pernoitar, começando a descer uma serra gigantesca, quando o trânsito parou. Em
seguida começou a chover. Quarenta minutos depois começou a andar a passos de
tartaruga. Às cinco e meia já estava escuro, a chuva aumentou, a fila de
caminhões e carros descendo a serra andava devagar quase parando. Obras na
pista e neblina completavam o quadro sombrio. Continuamos no fluxo, devagar, e
acabamos chegando à cidade por volta das sete da noite, e totalmente por acaso
achamos um ótimo hotel (ufa!).
Antes disso o dia foi igualmente
intenso. Levamos duas horas pra sair da zona urbana de Bogotá. Quando
alcançamos a estrada, ela estava interditada não sabemos por que motivo. Fomos
orientados a pegar uma estrada secundária. Estradinha travada, travada,
travada! Estreita, cortando uma série de pequenos povoados, e despencando morro
abaixo: dos 2600 metros de Bogotá aos 300 metros em meros 80 km. Lógico que
também era muito bonita e pitoresca. Altas paisagens. Mas ao meio dia só
tínhamos feito 104 km!!!
À tarde continuou a montanha
russa: a estrada escalou até os 3120 metros de altitude, numa geografia
dramática e fascinante. Encostas altamente inclinadas, bastante vegetação, e
uma estrada abusada, apinhada nas encostas e zigue-zaguendo montanha acima.
Tudo isso misturado a um trânsito nervoso de caminhões e carros.
Nas curvas mais fechadas (ou
seja: todas) as enormes carretas invadem inescrupulosamente a faixa oposta pra
conseguir fazer o giro. E quem vem nesse sentido oposto que se vire pra
desviar. Quando é um carro até que não é muito problema. Cada um se espreme pra
um lado e dá-se um jeito. Mas quando duas carretas se encontram nessas curvas
aí é encrenca. Tem até manobrista em algumas curvas! É realmente incrível.
Neste momento, quase dez da
noite, a chuva continua intensa e os telejornais locais noticiam as inundações
e os estragos da chuva em várias áreas do país... E nós estamos aqui novamente
lidando com a incerteza de poder prosseguir.
Definitivamente o ritmo da viagem
por essa bandas é fora de qualquer parâmetro. Hoje levamos praticamente dez horas
pra fazer meros trezentos quilômetros!! E dá-lhe braço e atenção na estrada!
Salto de Tequendama, próximo de Bogotá
Placa de advertência comum nas estradas da Colômbia
Casamata de um posto de controle do Exército na estrada
18 Dez
13º dia
De Armênia a Popayan
310 km
Do diário de bordo:
"Estar num contexto estando, ao
mesmo tempo, fora dele, é muito interessante. Caminhar por ruas de uma cidade
desconhecida, ouvindo um idioma diferente, sem passado e sem compromisso com o
local cria uma atmosfera especial de observador da realidade que, nessa
situação, mais parece um teatro, uma cena de um filme... Sensações de viajar...
Hoje passamos para a Cordillera Occidental – um maciço de
montanhas que domina todo o lado ocidental do país e que faz parte da
Cordilheira dos Andes.
Após o dia difícil de ontem, partimos hoje de
Armênia psicologicamente preparados para “o que der e vier”, meio que na
expectativa de dificuldades e estrada ruim. Mas, felizmente, o dia se manteve
na normalidade. O primeiro trecho foi muito agradável: paisagem bonita, estrada
muito boa, retas com curvas suaves, vilarejos bem cuidados, e aquele clima
bucólico do campo.
Depois de uns 100 km o panorama
mudou um pouco, ficou mais comum, mas a estrada continuou boa, estando
inclusive muito bem sinalizada.
Após passarmos por Cali começaram
as curvas e a subida de uma serra, mas nada comparado à epopeia de ontem. Chegamos
a Popayan sem dificuldades por volta das duas da tarde.
Popayan (a 1675 metros de
altitude) é uma cidade com cerca de 250 mil habitantes, sem grandes atrativos.
Mas a amabilidade e boa vontade dos colombianos se fazem presentes da mesma
forma que no restante do país.
Por aqui (em toda a Colômbia),
quando agradecemos por alguma coisa (dizendo “muchas gracias”) as pessoas respondem “con mucho gusto”, o que soa muito simpático e elegante.
No trecho de hoje passamos por
vários postos policiais. Por quatro vezes solicitaram que parássemos e
verificaram a documentação. Nenhum problema. Também reapareceram os postos de
controle do exército. Nestes não pediram que parássemos, mas os soldados têm
olhar atento e, com gestos, perguntam se está tudo bem.
Nesta região também percebe-se
uma ligeira mudança na etnia do povo, com maior predominância de negros e uma
menor incidência do traço indígena típica do restante do país.
Agora há pouco, perguntando ao
rapaz da recepção do hotel sobre a estrada para a próxima cidade, ele me disse,
na maior naturalidade, que ela está fechada (!!!), devido a um “grande
derrumbe” (deslizamento de terra), mas que pode ser que até amanhã esteja
liberada. Me recomendou esperar até um pouco mais tarde amanhã e consultar,
antes de partir, la policía de la
carretera para saber das condições da estrada. Por enquanto, a incerteza
permanece."
19 Dez
14º dia
Popayan
O que vinha se prenunciando há dias se concretizou em Popayan: a estrada foi bloqueada por um grande deslizamento de terra. Começava ali um grande teste de paciência e administração da incerteza.
Do diário de bordo:
"Saímos do hotel hoje sabendo,
pelo rapaz da recepção e pelo periódico local, que a estrada estava fechada por
um grande deslizamento alguns quilômetros ao sul de Popayan. Mas fomos
‘assuntar’ in loco.
Logo na saída da cidade vimos os
postos de combustível cheios de caminhões parados – sinal do problema. Cerca de
40 km depois chegamos à fila de caminhões que havia se formado no local do
bloqueio. Paramos e fui puxar conversa com os caminhoneiros para averiguar os
fatos e prognóstico da história. Na verdade, não havia muito a dizer. Houve um
deslizamento, a estrada estava completamente bloqueada (inclusive para motos),
estavam trabalhando para liberá-la e a previsão (incerta) era abrir para carros
pequenos amanhã ou no outro dia... Hummmmm...
Então fizemos meia volta e
retornamos à cidade. Agora resta esperar que o problema seja resolvido o quanto
antes.
Chegamos a pensar em caminhos
alternativos. Estudamos o mapa e até tem uma estrada que dá uma volta bem maior
e acaba chegando num ponto mais ao sul, mas, conversando com um morador aqui da
região fomos enfaticamente desencorajados a sair da rodovia principal, por
questões de segurança. Segundo ele, esta é uma "área vermelha".
Em viagens desse tipo, em que a
incerteza é ingrediente constante da fórmula, é preciso saber lidar com uma
série de questões, mas, sem dúvida, lidar com esperas indeterminadas é uma das
mais chatas. Mas faz parte. Uma hora se resolve."
20 Dez
15º dia
Popayan
Continuamos parados em Popayan, aguardando a liberação da estrada. Mais um dia difícil e desgastante.
Do diário de bordo:
"Situação de crise por aqui. A
estrada continua bloqueada e parece que o problema é um pouco mais sério que um
deslizamento. Pelo que soubemos, o que houve, na realidade, foi que um pedaço
da estrada desabou.
De manhã, seguindo a regra de ir
ver, ao invés de ouvir falar, desenganchamos do hotel e fomos pra estrada.
Chegamos ao ponto da paralisação por volta das nove e meia. Às três da tarde havíamos
andado três quilômetros.
Situação quase caótica na
estrada. Muitos, muitos caminhões, vários carros, um monte de motos pequenas,
estrada estreita, chovendo, céu cinzento e informações contraditórias.
Entretanto, a policía caminera estava
presente e fazendo o possível para manter a ordem. Aliás, em toda a Colômbia
vê-se a forte presença da Polícia e do Exército nas ruas e estradas.
Às quatro e meia a organização
das filas, que estava sendo mantida sob forte atuação da Polícia, começou a
degringolar, e o negócio começou a virar bagunça. Hummmm... As minhas
‘anteninhas internas’ acenderam a luz vermelha. Fizemos a volta e retornamos a
Popayan.
Pelo que percebemos, e pelo que
ouvimos no local, estão passando poucos carros por vez, e apenas em um sentido.
Parece também que estão trabalhando para fazer uma obra de emergência, mas não
se sabe ao certo quando o tráfego será normalizado.
Estamos em dúvida se tentamos
amanhã novamente ou se esperamos mais um dia. Vamos ver.
Hoje de manhã, na saída do hotel,
tivemos um encontro muito interessante com um grupo de viajantes brasileiros –
seis amigos - que está vindo dos Estados Unidos em duas motos custom (uma
Harley e uma Shadow), uma pick-up com reboque e um jipe com reboque. Nesses
reboques tinham mais umas duas motos trail, mountain bikes, e outros
equipamentos acessórios. Tá vendo? Quando a gente começa a pensar que está
inventando encrenca demais, aparece alguém muito mais capaz de inventar
histórias complicadas [risos]...
Estão na estrada há um mês, e
queriam ter chegado ao Brasil ontem, ou seja, estão bem atrasados em relação ao
seu planejamento.
Disseram-me que são trabalhadores
da construção civil de Nova Iorque, e estão indo para o Brasil – sul de Minas
Gerais – ali pelo interior do Peru, entrando pelo Acre. Disseram ainda que
tiveram um grande atraso (12 dias) na travessia do Panamá para a Colômbia, onde
os carros e motos tiveram que ser embarcados em navio.
Falaram também que tiveram muitos
problemas e aborrecimentos nas fronteiras e com a Polícia da América Central,
em virtude de terem placas americanas nos carros e motos (e também por estarem
transportando muita tralha). É o anti-americanismo em ação.
A propósito vale dizer que quando
a Polícia nos pára por aqui e dizemos que somos do Brasil, sentimos de
imediato, via de regra, uma boa vontade por parte dos policiais. É interessante
como o Brasil realmente goza de uma boa reputação internacional em termos de
relacionamento e receptividade – pode-se dizer que praticamente em qualquer
lugar do mundo. E muito desse perfil deve-se certamente ao nosso magnânimo
futebol.
Os nossos compatriotas tinham um
jeitão bem despojado e aquele ar meio cansado de quem está na estrada há muito
tempo. Partiram um pouco antes de nós e voltamos a cruzar com eles na fila da
estrada. Estavam “encalacrados” entre os caminhões. Boa viagem pra eles!"
21 e 22 Dez
16º e 17º dias
De Popayan (Colômbia) a Tulcán (Equador)
58 km + 260 km
No dia 21 saímos do hotel em Popayan às cinco horas da manhã dispostos a encarar definitivamente a fila de espera pra passar no local onde a estrada havia ruído. Longa espera. Somente às 21:40 h conseguimos passar no local onde havia acontecido o deslizamento, e apenas cerca de duas horas depois é que conseguimos finalmente sair do gigantesco congestionamento. Ainda dirigimos até à uma e meia da madrugada até achar um hotelzinho onde paramos e fomos dormir, exaustos.
No dia seguinte saímos do hotel às nove e meia da manhã e seguimos viagem até a fronteira com o Equador, na cidade de Ipiales, onde chegamos às 15:30. Por sorte conseguimos fazer as duas aduanas, de saída da Colômbia e de entrada no Equador ainda nesse final de tarde, e fomos dormir já no Equador, numa pequena cidade chamada Tulcán.
Uma verdadeira odisseia, esses dois dias!
Do diário de bordo:
"Nessas longas horas de espera acabamos fazendo amizade com dois senhores, colombianos, moradores das cidades próximas, que estavam um pouco atrás de onde estávamos na fila. Tivemos ótimas conversas sobre a situação do país, a guerrilha, a questão da segurança pública e outros assuntos. Os dois são irmãos, estavam cada um no seu carro, indo para cidades diferentes e nos deram uma grande ajuda e apoio. Seguimos com eles, em comboio, após passar pelo ponto do desmoronamento até por volta de uma e meia da madrugada, quando eles nos deixaram numa pousada na beira da estrada e seguiram viagem até um pouco mais à frente.
(...)
16º e 17º dias
De Popayan (Colômbia) a Tulcán (Equador)
58 km + 260 km
No dia 21 saímos do hotel em Popayan às cinco horas da manhã dispostos a encarar definitivamente a fila de espera pra passar no local onde a estrada havia ruído. Longa espera. Somente às 21:40 h conseguimos passar no local onde havia acontecido o deslizamento, e apenas cerca de duas horas depois é que conseguimos finalmente sair do gigantesco congestionamento. Ainda dirigimos até à uma e meia da madrugada até achar um hotelzinho onde paramos e fomos dormir, exaustos.
No dia seguinte saímos do hotel às nove e meia da manhã e seguimos viagem até a fronteira com o Equador, na cidade de Ipiales, onde chegamos às 15:30. Por sorte conseguimos fazer as duas aduanas, de saída da Colômbia e de entrada no Equador ainda nesse final de tarde, e fomos dormir já no Equador, numa pequena cidade chamada Tulcán.
Uma verdadeira odisseia, esses dois dias!
Do diário de bordo:
"Nessas longas horas de espera acabamos fazendo amizade com dois senhores, colombianos, moradores das cidades próximas, que estavam um pouco atrás de onde estávamos na fila. Tivemos ótimas conversas sobre a situação do país, a guerrilha, a questão da segurança pública e outros assuntos. Os dois são irmãos, estavam cada um no seu carro, indo para cidades diferentes e nos deram uma grande ajuda e apoio. Seguimos com eles, em comboio, após passar pelo ponto do desmoronamento até por volta de uma e meia da madrugada, quando eles nos deixaram numa pousada na beira da estrada e seguiram viagem até um pouco mais à frente.
(...)
Pouco antes da aduana encontramos
novamente os nossos amigos brasileiros de Nova Iorque. Mas só uma parte do
grupo deles. Um dos carros, a pick-up, havia ficado para trás no
congestionamento e ainda não havia chegado. E eles estavam sem contato e sem
saber onde os companheiros estavam... Contamos a eles que na noite anterior, quando
a Mari saiu para fazer aquele reconhecimento, cruzou com eles cem carros à
nossa frente na fila. Ou seja, teoricamente já era para eles terem chegado.
Mas, apesar do desencontro, os quatro com quem falamos estavam bem e otimistas
que em breve os outros dois chegariam."
Na fila. Longa espera.
Mari expandindo os limites do improviso -
cozinhando um miojo dentro do carro
Thaís estudando geografia in loco
O jeito colombiano de andar de ônibus...
Encontro com nossos amigos brasileiros que estavam vindo de Nova Iorque
Finalmente no Equador!
*** *** ***
Equador
23 Dez
18º dia
De Tulcán a Quito
263 km
Entrar no Equador nos trouxe a sensação boa de estar num mundo mais organizado e mais parecido com o nosso, além de ter vencido com êxito (ainda que não facilmente) a temerária etapa da Colômbia.
Do diário de bordo:
"Houve uma época, não muito
distante, em que fotografia era na base dos rolos de filme, e se pensava bem
antes de apertar o botão para abrir o diafragma da máquina. E as fotos só
podiam ser vistas depois de reveladas; normalmente vários dias depois. E era
comum mandar cartões postais dos locais visitados em viagens – cartões esses
que levavam dias, ou semanas, pra chegar. E ouvíamos músicas de fitas cassete,
em aparelhos tipo walkman que consumiam pilhas vorazmente... Informações de
viagem só eram disponíveis em guias de viagem, ou, eventualmente, nas poucas
revistas especializadas no assunto. Na volta das viagens, montávamos grandes
álbuns de fotos, que compartilhávamos apenas com os amigos mais próximos, em
animadas conversas lado a lado. E os diários de viagem eram pequenos cadernos
de espiral, em que escrevíamos histórias que ninguém nunca ia ler.
Hoje esses aspectos mudaram
radicalmente, mas a magia de conhecer lugares distantes, diferentes e além dos
nossos horizontes mentais continua o mesmo. Assim como nossos receios, nossas
dúvidas e nossa capacidade limitada de absorver esse mundo tão diverso e
mutante.
Ainda bem que nem tudo mudou.
Fizemos uma pernada tranqüila
hoje de Tulcán aqui para Quito. A primeira grande diferença em relação à
Colômbia é a qualidade das estradas: muito melhores por aqui – asfalto de boa
qualidade, boa sinalização e um aspecto geral de organização e bons cuidados.
A moeda do Equador é o dólar
americano, e os preços, de forma geral, são bem mais em conta do que no país
anterior.
A paisagem continua belíssima, com
as estradas seguindo bem em cima da Cordilheira dos Andes, a uma altitude média
de 2500 a 3000 metros. Muitas curvas e encostas altíssimas completam o quadro
inspirador."
Thaís com habitantes locais, em Tulcán
Gasolina: US$ 2,25 por galão (=4
litros), ou seja: US$ 0,56 por litro, ou mais ou menos R$ 1,02 por litro (da
gasolina mais cara - SUPER).
24 Dez
19º dia
Quito
Dia de descanso e passeios por Quito.
Do diário de bordo:
"Neste nosso pequeno-grande
planeta somos todos, a um só tempo, muito diferentes e muito parecidos uns com
os outros. Cada um de nós tem o seu mundo, a sua história, os seus sonhos, os
seus limites, e temos também aspirações bem parecidas – viver bem, em paz, ter
amigos, ser amado, amar - , mas apenas por um certo tempo, ou por um incerto
tempo...
Um Feliz Natal a
todos os nossos amigos e familiares. Que essa data especial seja um motivo para
refletirmos sobre nossas vidas e nossos valores, e que sejamos capazes de
reconhecer e dar valor ao que é realmente importante.
Paz e luz."
Thaís no hotel em que ficamos
Aconchego de mãe e filha...
Visitando uma igreja local
Teleférico em Quito
Ceia de Natal
25 a 28 Dez
20º ao 23º dias
Quito
Por ironia dos fatos, no dia em que mais queríamos estar bem e curtir certo relaxamento - 25 Dez -, a Thaís foi acometida por um sério mal estar, que foi se intensificando e nos preocupou enormemente.
Tivemos que acionar nosso seguro de saúde de viagem, que, depois de muitas ligações e insistência, nos enviou um médico que a atendeu no quarto do hotel em que estávamos. Como não foi possível fazer um diagnóstico no local, levaram-na para um hospital, onde ela passou por uma extensa bateria de exames e acabou ficando internada por três dias, para observação e recuperação.
Ao final, concluiu-se que pode ter sido algum tipo de infecção intestinal, que felizmente evoluiu bem e foi superada.
O lado bom da história, se é que podemos dizer assim, é que tivemos um atendimento de primeira qualidade, tanto dos médicos, quanto com relação às instalações hospitalares e de todo o tratamento realizado. De certa forma, tivemos sorte por esse problema ter surgido no lugar em que estávamos naquele momento.
Outra detalhe importante foi termos contratado o seguro de saúde de viagem. Caso contrário, as contas decorrentes seriam uma preocupação e um problema a mais a ser resolvido.
29 Dez
24º dia
De Quito a Ambato
200 km
Programamos e cumprimos um percurso curto nesse dia, a fim de ver como a Thaís se readaptaria à rotina da viagem e ao contexto da estrada. Nesse sentido deu tudo certo. Felizmente ela se sentiu bastante bem durante todo o dia.
Pela manhã, antes de partir, fomos visitar um Parque nos arredores de Quito chamado de "Ciudad Mitad del Mundo", cujo tema é a peculiaridade geográfica da linha do Equador passar por ali, dividindo o globo terrestre em norte e sul.
Do diário de bordo:
"Ambato, a cidade em que estamos, tem ruas estreitas, trânsito
lento e barulhento, montes de gente nas ruas, música tocando em volume alto
pelas lojas e um aspecto nada aconchegante. Mas é como é."
Latitude zero grau: retornando ao hemisfério sul
Etnia latina
Thaís com um pé no hemisfério norte, e o outro no sul
30 Dez
25º dia
De Ambato a Cuenca
330 km
Nesse dia as coisas começaram bem, com estradas boas, paisagem bonita e tempo aberto. Mas por volta do meio dia esse quadro se inverteu. O tempo fechou, começou a chover e o aspecto dos lugares por onde passávamos não era muito animador.
Pra completar a dramaturgia do dia, no começo da tarde tivemos um pneu furado, ao passar por um pequeno povoado. Aliás, furado não, rasgado. Perdemos o pneu porque, apesar de ter sido consertado, perdeu a confiabilidade, tão grande foi o tamanho do corte.
Por conta desse incidente, mais uma vez andamos menos do que havíamos planejado.
Do diário de bordo:
"Hoje o dia começou bem, com o céu querendo ficar azul,
paisagem altamente inspiradora – vulcões com os picos nevados, montanhas a
perder de vista -, estrada boa e bom rendimento. A estrada seguia o tempo todo
exatamente por cima da Cordilheira dos Andes, numa altitude média de 3000 a
3400 metros. Nas encostas das montanhas rebanhos de ovelhas sendo pastoreadas
por crianças de 9, 10 anos, com os rostos queimados pelo frio e trajando
aquelas típicas roupas coloridas, com ponchos e chapéus – muito legal."
Visibilidade da estrada no começo da tarde
O pneu danificado
Conserto não confiável...
Thaís no hotel em que ficamos em Cuenca
*** *** ***
Peru
31 Dez
26º dia
De Cuenca (Equador) a Talara (Peru)
520 km
Neste último dia do ano resolvi fazer mais uma alteração no roteiro inicialmente previsto e descer da Cordilheira dos Andes em direção ao litoral, a fim de tentar sair daquele ambiente de estradas travadas e clima instável da alta montanha. Nesse sentido a decisão foi acertada, mas o dia foi longo.
Pouco depois de deixarmos Cuenca demos de cara com uma interdição da estrada principal, o que nos conduziu para um desvio por uma estradinha de terra no meio das montanhas. Apesar da preocupação inicial com esse caminho alternativo, deu tudo certo, e acabamos fazendo um bonito trecho da viagem.
No meio da tarde, já na planície junto ao litoral, chegamos à fronteira com o Peru. Fizemos todos os procedimentos necessários e resolvemos prosseguir, animados com o tempo que havia melhorado e com os novos ares daquele espaço geográfico.
Mas isso foi um erro, pois chegamos às sete da noite a uma pequena cidade à beira mar, no último dia do ano, e a situação estava meio caótica, com muito movimento, tudo lotado e nenhuma vaga nos hotéis e pousadas da região.
Com isso tivemos que retornar à estrada e seguir até a próxima cidade, onde só chegamos por volta das dez e meia da noite, exaustos. Não houve disposição nem clima pra comemorar o ano novo, mas havíamos cumprido mais uma etapa da viagem.
Descendo a Cordilheira, no desvio da estrada principal
Desvio da estrada principal, entre Cuenca e Machala
Entrando no Peru
Aduana do Peru: contêineres no meio do nada
1º Jan 11
27º dia
De Talara a
Trujillo – Peru
530 km
O primeiro dia do ano trouxe um novo fôlego e ânimo à viagem. Deixamos
os ares das montanhas definitivamente pra trás e passamos a conviver com o
ambiente do deserto peruano.
Surpreendemo-nos com as boas estradas e a precária estrutura urbana do
simpático Peru.
Foi muito bom começar um novo ano em um novo país.
Do diário de bordo:
"Durante praticamente todo o dia estivemos atravessando uma região
desértica chamada de “Desierto de Sechura”. Muito, muito bonito. Horizontes
amplos, aquela paisagem monocromática, dunas de areia, muito vento e algumas
montanhas ao longe compuseram o contexto.
O contato inicial com o Peru foi amistoso. Tudo é muito diferente dos
vizinhos mais ao norte. O povo é bem simples e há muito lixo espalhado por todo
lado, e onde há gente há desorganização e aquela bagunça típica da América
Latina."
02 Jan 11
28º dia
De Trujillo a Lima – Peru
550 km
Andamos bem nesse dia, curtindo o visual e fazendo a viagem avançar
rumo sul. Essa região do Peru é um
grande deserto. Só se vê areia por todo lado.
Do diário de bordo:
“Surpreendentemente bela essa região norte do Peru! Realmente
excitante. Montanhas de areia, vastidões de areia, tempestades de areia, dunas
de areia, um céu enorme e um mar infinito compuseram a plasticidade visual
mágica de hoje.
A estrada, de asfalto muito bom e grandes retas, alternadas com
algumas curvas e subidas, também foi uma grata surpresa. Tem-se a sensação de
estar num outro mundo.
Só o que não é legal são as poucas cidades e povoados ao longo do
caminho. O mesmo perfil de muito lixo espalhado, muita desorganização e muita
pobreza.”
03 Jan 11
29º dia
De Lima a
Nazca – Peru
480 km
Nesse dia saímos de Lima bem cedo, antes das seis horas da manhã, pra
evitar o pesado trânsito local. Deu certo, pois dessa maneira não perdemos
muito tempo e o dia rendeu bem.
No começo da tarde chegamos ao nosso destino do dia: a cidadezinha de
Nazca. Ao longo do caminho pudemos admirar algumas das famosas “linhas de Nazca”,
a partir de mirantes instalados à beira da estrada.
Do diário de bordo:
“O dia novamente teve ótimo rendimento e no começo da tarde estávamos
chegando ao nosso destino do dia. Demos uma parada na estrada pra observar
algumas das famosas e misteriosas linhas de Nazca, de um mirante de uns quinze
metros de altura feito especialmente pra isso. Muito interessante a experiência
e o visual não só das linhas, mas do deserto em volta também. Muito cênico e
inspirador.”
Linhas de Nazca
Caminhão na estrada: um tanto carregado demais, não?
Estradas um tanto precárias...
04 Jan 11
30º dia
Nazca – Peru
Saímos de Nazca pela manhã com a intenção de seguir até Cuzco (em dois
dias) e, de lá, visitar Machu Pichu. Mas pouco mais de cem quilômetros após a
partida já estávamos a mais de 4 mil metros de altitude e a Thaís começou a se
sentir mal em função da rarefação do ar e das muitas curvas da estrada. Como a
previsão era que essas condições perdurassem ao longo de todo o dia, resolvemos
abortar a ideia, e, assim, retornamos a Nazca e decidimos seguir pelo litoral
em direção ao Chile no dia seguinte.
Do diário de bordo:
“Saindo hoje de Nazca em direção a uma cidade chamada Abancay, na
direção de Cuzco, fomos brindados com um dia inspiradoramente bonito. Mas a
estrada ganhou contornos dramáticos logo nos primeiros quilômetros. Curvas,
curvas, e mais curvas, e subindo forte e constantemente.
A paisagem, em compensação, era belíssima. Montanhas a perder de
vista, encostas altíssimas, silêncio, vento, aspereza.
Exatos cem quilômetros (e duas horas e pouco) depois de sair dos 600
metros de altitude de Nazcar batemos nos 4.000 metros de altitude.”
Observem a altura dessas encostas.
Mãos firmes no volante e atenção total na estrada.
Sem direito a vacilos.
05 Jan 11
31º dia
De Nazca a
Arequipa – Peru
570 km
Belas e surpreendentes paisagens marcaram esse dia, evidenciando o
prazer de viajar por lugares desconhecidos e não famosos.
Do diário de bordo:
“A pernada que fizemos hoje de Nazca para Arequipa é um exemplo
clássico de uma região sem a menor fama, mas extraordinariamente bonito. Muito
bonito mesmo. Espetacular. Uma natureza dramática, ampla, intocada, hostil e
comovente.
O Peru, na realidade, é um grande deserto. Um grande nada. Um grande
vazio. Anda-se horas e horas sem passar por uma cidade. Apenas pequenos
vilarejos e povoados. Pode-se contar nos dedos as cidades um pouco maiores.
Nas estradas o movimento é muito pequeno. Poucos caminhões e
pouquíssimos carros. O trecho de hoje deu um pouco mais de trabalho do que as
fáceis retas da parte norte do país. Hoje houve vários trechos em que, de
repente, a estrada começava a se contorcer para driblar a agressiva geografia
do terreno – e aí dá-lhe curvas e mais curvas.”
*** *** ***
Chile
06 e 07 Jan 11
32º e 33º dia
De Arequipa a Moquegua – Peru, e de Moquegua – Peru a Arica – Chile
220 + 250 km
A chegada ao Chile foi marcada pelo encontro casual com a caravana do
Rally Dakar. O clima de festa nos contagiou e fez com que encurtássemos uma
pernada que estava prevista pra ser maior, para poder, assim, curtir melhor o clima da competição e apreciar as belas máquinas participantes
do evento.
Do diário de bordo
“Não foi planejado. Foi uma feliz coincidência chegar hoje aqui em
Arica e dar de cara com a festa de chegada do Rally Dakar à cidade. Muito,
muito legal!
Realmente muito bacana esse clima de festa da competição. Muito bacana
também poder ver as motos, carros e caminhões bem de perto. Máquinas
fantásticas, imponentes, bonitas. Um espetáculo único e emocionante!”
Mari e Thaís junto a um veículo da organização do Rally
Motociclista chegando à área de lavação das motos, dando autógrafos
Festa nas ruas pra receber o Rally: pessoal animado
08 Jan 11
34º dia
De Arica a Iquique – Chile
320 km
Optamos por fazer um percurso curto nesse dia, assim pudemos ter a
tarde livre para as meninas curtirem a praia de Iquique e descansarmos um pouco
do ritmo da estrada.
Do diário de bordo:
“A estrada continua excelente.
Asfalto perfeito, grandes retas, boa sinalização. A paisagem também ainda é de
puro deserto. Areia e pedra, sem nada de vegetação – causa uma sensação boa de
distanciamento do mundo urbano, mas às vezes é meio desolador. E o clima está
excelente: sol, céu azul, temperatura agradável. Podia ser sempre assim...”
Chegando a Iquique
Mari e Thaís curtindo a praia de Iquique
Gasolina no Chile:
Gasolina de 95 octanas: 685 pesos chilenos por litro,
ou R$ 2,48 por litro
09 Jan 11
35º dia
De Iquique a
Calama – Chile
420 km
Calama, a cidade a que chegamos nesse dia, é uma das principais do
conhecido Deserto do Atacama. Tudo em volta é areia e deserto, causando uma
sensação ao mesmo tempo emocionante e desoladora, temperado com belas
paisagens.
Do diário de bordo:
“Cruzamos ainda com alguns competidores de moto do Dakar, inclusive
com a chegada de uma das etapas pelas montanhas-deserto. Passamos também pelo
competidor brasileiro Jean Azevedo, com sua KTM 690 verde-amarelo-branco,
saindo da especial e entrando na estrada. Ô cena bonita!!
Calama é uma cidade aparentemente muito bem estruturada para uma
região tão isolada e desértica. A paisagem em toda essa região é o mesmo
deserto árido, grande, bonito. Muito vento e muita poeira. Tudo tem um aspecto
meio rústico, meio duro, castigado.”
Motociclista do Dakar, chegando de uma das etapas
O brasileiro Jean Azevedo (Rally Dakar), na estrada
Thaís conduzindo uma série de exercícios de alongamento
10 Jan 11
36º dia
De Calama a
San Pedro de Atacama – Chile
100 km
Nesse dia chegamos a San Pedro de Atacama, a emblemática cidadezinha
que é praticamente um símbolo do Deserto do Atacama (e sua base turística mais
conhecida). Instalamo-nos num pequeno hotel e à tarde saímos para fazer alguns
passeios pela região.
11 Jan 11
37º dia
San Pedro de Atacama – Chile
Esse foi um dia de passeios em San Pedro de Atacama e arredores. Muito
interessante caminhar pelas ruas estreitas e pitorescas da pequena cidade,
observando as pessoas, os detalhes, a passagem do tempo... E deixar o mundo
girar em volta.
Do diário de bordo:
“Caminhar sem compromisso e sem pressa pelas ruelas de San Pedro é um
programa tão interessante e curioso quanto as atrações mais famosas e visitadas
da região. Cruza-se com pessoas de todos os “tipos”, ouve-se várias línguas e
vivencia-se um clima muito envolvente e bacana.”
*** *** ***
Argentina
12 Jan 11
38º dia
De San Pedro
de Atacama – Chile a Purmamarca – Argentina
420 km
Saindo de San Pedro de Atacama,
atravessamos a Cordilheira dos Andes pelo passo de Jama, nesse percurso que é
extremamente cênico e inspirador. Montanhas por todos os lados, frio, vento,
deserto, ninguém por perto. Além disso há a altitude: cerca de 300 km do
trajeto acontece a mais de 4 mil metros. Foi um belo dia de viagem, ao final do
qual nos encontrávamos em um novo país: Argentina, do lado de casa.
Do diário de bordo:
“Essa travessia da Cordilheira
dos Andes pelo Passo de Jama é, definitivamente, fantástica.
O visual é muito bonito. E não
apenas as paisagens, mas o céu, assim como o sol, é claro, vigoroso,
esplêndido. Há uma luminosidade radiante no ar. Isso, aliado à ausência de
qualquer vestígio de presença humana, ao vento, ao frio, ao horizonte
longínquo, às montanhas – constantes, altas, imponentes – compõem um quadro
realmente enternecedor.
A geografia dessa travessia é
também digna de nota. Saindo de San Pedro, sobe-se numa tacada só, sem trégua,
dos 2400 aos 4.000 metros de altitude em pouco mais de 30 km. A partir daí a
altitude varia dos 4 mil aos 4.800 pelos próximos 300 km. No final outra
descida abrupta: dos 4 mil aos 2200 metros em apenas 16 km! A vegetação é
praticamente inexistente, à exceção de alguns poucos e bonitos cactos que
aparecem no trecho final.”
Completamos hoje a significativa
marca de 10 mil km rodados (neste momento, exatos 10.006 km).”
Saindo de San Pedro de Atacama
Vulcão Licancabur, imponente e belo
Descida da Cordilheira, próximo a Purmamarca
As montanhas multi coloridas na região de Purmamarca
Feirinha de artesanato de Purmamarca
13 Jan 11
39º dia
De
Purmamarca a Corrientes – Argentina
940 km
Saindo de Purmamarca,
atravessamos a longa planície da região do chaco argentino, em um percurso que
nos fez bater nosso recorde de distância em um dia de viagem. As belas
paisagens das montanhas e desertos ficaram para trás. A sensação agora era de
estar chegando.
Do diário de bordo:
“De volta ao mundo conhecido das
baixas altitudes e das paisagens comuns!
A pernada de hoje contou com um trecho
de estrada na região do chaco argentino que assusta pela imensa reta e pela
monotonia do visual. São praticamente 400 km de uma única reta, ladeada por uma
vegetação sem graça e invariável de mato, e às vezes alguns pequenos arbustos.”
O hotel em que ficamos em Purmamarca, junto às montanhas
*** *** ***
Brasil
14 Jan 11
40º dia
De Corrientes – Argentina a Foz do Iguaçu – Brasil
640 km
De volta ao Brasil!
Do diário de bordo:
“Por mais que o conceito de
Pátria também possa ser relativizado, como tudo, o fato é que a profundidade e
a abrangência da cultura nacional de cada um são maiores e mais fortes do que
às vezes imaginamos (ou não imaginamos).
Essa ligação com as pessoas, com
a língua, com o jeito de ser da nossa gente, com os nossos defeitos (que
conhecemos e criticamos tanto), com nossas riquezas (que reconhecemos tão
pouco), com nossa história... Essa ligação transcende nosso racionalismo. É um
enlace de alma.
Viajar não é só ir e conhecer
outros lugares. É também, e, quem sabe, sobretudo, não estar no lugar de
sempre. O valor das viagens se destaca pelo contraste, pelo pano de fundo que
se cria.
Sentir esse prazer de retornar ao
nosso país é indizível. É único. E não é apenas por questões práticas ou por
conveniência. É afetivo mesmo.”
Rio Iguaçu: à esquerda o Brasil, à direita a Argentina
Aduana de saída da Argentina... finalmente "em casa"
15 Jan 11
41º dia
Foz do Iguaçu
Aproveitamos o dia pra fazer
alguns passeios turísticos em Foz do Iguaçu. Visitamos o Parque das Aves, as
cataratas (no Parque Nacional do Iguaçu), fizemos um passeio de barco até
próximo das cataratas e, depois, fomos nos encontrar com o tio e primo da Mari,
que moram na cidade e nos receberam super bem.
Parque das Aves
Tucano no Parque das Aves
Thaís exercitando o afeto com animais "exóticos"
As famosas Cataratas do Iguaçu
Mari e Thaís no barco do "Passeio do Macuco"
16 Jan 11
42º dia
De Foz do
Iguaçu a Quatro Pontes (PR)
240 km
Atendendo ao convite do primo da
Mari, Ezidio Júnior, pela manhã fizemos um belo passeio de helicóptero sobre as
Cataratas do Iguaçu, apreciando a vista aérea de toda a região.
De tarde seguimos para o
município de Quatro Pontes, próximo a Cascavel, pra visitar um dos irmãos da Mari,
que mora em um sítio na região.
Do diário de bordo:
“É interessante fazer aqui um
breve registro do estilo de vida desse simpático casal – Neivo e Preta. Os dois
moram numa casa que eles mesmos construíram – e não no sentido que se costuma
dizer por aí, mas no sentido literal de fazer com as próprias mãos. Os dois
filhos se casaram há poucos anos e já saíram de casa. Vivem das habilidades de
cultivar a terra – uva, soja, milho – e da criação de gado, suínos, galinhas,
etc. Não têm horário de trabalho. Nem feriados e finais de semana pra se
desligar do seu “negócio”. E estão o tempo todo atentos às viradas do tempo –
ventania, granizo, geada...
O local do seu sítio é muito
bonito e silencioso, e têm, ao alcance das mãos, frutas e verduras que dão por
ali. Muito bacana esse estilo de vida simples, livre, silencioso, desligado das
modernices desse nosso mundo urbano meio arrogante e convencido demais de suas
qualidades.”
Vista aérea das Cataratas do Iguaçu
Rio Iguaçu
O helicóptero no qual fizemos o passeio
Thaís no parreiral no sítio do seu tio Neivo
17 Jan 11
43º dia
De Quatro
Pontes a Curitiba (PR)
560 km
Finalmente concluímos a viagem, chegando a Curitiba no final da tarde desse dia. Predominava, nesse momento, mais uma sensação de certa preocupação como o que estava por vir do que de comemoração pelo que havíamos terminado de fazer, mas ainda assim estávamos muito satisfeitos e realizados.
Afinal, superamos nossos medos, apreensões, dúvidas, e partimos. E no caminho lidamos da melhor forma com os imprevistos, com os problemas, com os obstáculos que apareceram. E em meio a tudo isso ficou evidente o prazer de percorrer distâncias e conhecer um pouco do mundo, e constatar que "o mundo é bão, sebastião!", basta se dispôr a olhá-lo com boa vontade e com o coração leve.
Do diário de bordo:
“Hoje, na estrada, curtindo aquele
visual bucólico e aprazível dos campos do Paraná – plantações e araucárias a
perder de vista – a Mari comentou que acha mais bonita essa paisagem do que
aquela aridez dos desertos do Peru e do Chile. E eu fiquei pensando no quanto
de conceito existe nessa nossa sensação do belo...
Talvez o simples fato do contraste
e da raridade da oportunidade de estar em contato com certos ambientes nos
cause essa sensação de admiração e de perplexidade. Ou será que os povos que
vivem nessas áreas desérticas têm a mesma sensação que nós, que as vemos pela
primeira vez?
É verdade, os campos verdes e
cheios de vida do interior do Paraná são mesmo muito bonitos. Talvez só não
sejam mais bonitos por serem tão comuns, de tão fácil acesso, tão próximos do
nosso dia-a-dia.
A sensação de beleza tem diversos
componentes. O visual conta muito, mas não é só isso.
Hoje, olhamos para um mapa da América do Sul
de forma totalmente diferente. Enxergamos e conseguimos entender o que
significam aquelas fronteiras, aquelas estradas, aquele escurinho que representa
a Cordilheira dos Andes.
E nem tudo fica registrado em
fotos. O cheiro gostoso de madeira velha da igreja da praça central de San
Pedro de Atacama, o olhar dos meninos vendendo melão à beira da estrada na
Argentina, o andar sem pressa das pessoas na pequena praça de um vilarejo no
interior da Colômbia, a timidez das crianças pastoreando os rebanhos de ovelhas
nas montanhas do Equador, a sensação de desolação e de quietude dos desertos do
Peru... Sensações e lembranças que vão ficar ecoando nos nossos dias, em meio
aos afazeres e apelos que certamente virão.
É assim. O tempo presente das
viagens é apenas uma pequena parte dessas vivências. As lembranças, as fotos,
as sensações, são o legado que fica depois, e são imensuráveis."
*** *** ***
Blog "Horizontes da América do Sul"
Por ocasião da viagem escrevi, dia a dia, um blog contando um pouco da nossa vivência ao longo do caminho.
Os textos colocados aqui sob o título "Do diário de bordo" foram retirados desses relatos.
O blog pode ser acessado através do link abaixo:
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Meu muito obrigado a todos que, direta ou indiretamente, colaboraram para que tenhamos realizado essa viagem.
Gratidão
Força Sempre
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