Estive pensando que o formato compacto e muito
consistente (tipo um rolo compressor...) da nossa sociedade moderna nos molda de tal forma que facilmente
nos convencemos e nos acomodamos aos seus conceitos. Quero me referir
especificamente à (confortável) sensação, que a vida enquadrada nesses moldes
nos proporciona, de achar que tudo o que nos cerca é necessário e não poderia
ser de outro jeito. Assim, nos acostumamos aos dias da semana, às muitas horas
diárias dedicadas ao trabalho, à onipresente pressão financeira envolvendo
tudo, e assim por diante.
Sair desse “formato” pode ser
perigoso, mas também pode ser bem enriquecedor.
Aonde quero chegar? Ao ponto do
por que fazemos o que fazemos. A rigor, nada é exatamente necessário, nada é
absolutamente certo (no sentido de “precisão”), imprescindível, definitivo. No
final das contas, talvez o real motivo por trás de tudo seja apenas e
simplesmente a velha e boa vontade (muito embora provavelmente muitas vezes não
percebamos isso).
E a liberdade de opção e de
escolha pode ser uma dádiva, mas também pode ser um “problema”...
Pois é... a vida não é como um trilho...
Nesse domingo me propus fazer um
passeiozinho com a GS num local que há muito imaginava que poderia ser
divertido – chegar até a estação de trem abandonada Hugo Lange, aos pés do
maciço do Marumbi, na região de Morretes.
Saindo de Curitiba, desci a
conhecida Serra da Graciosa e, na altura em que a estrada cruza sobre o Rio
Inhundiaquara, peguei a estradinha de terra que, margeando esse curso d’água,
vai subindo vale adentro.
O bacana de lugares assim é a
oportunidade de se afastar de aglomerados de gente. A rara e altamente
gratificante sensação de se sentir sozinho no raio que a vista e os ouvidos
alcançam.
Pouco depois fiz uma parada num
cantinho da estrada, desci da moto e fiquei um bom tempo apenas curtindo o
tranquilizador barulhinho do rio correndo ali do lado, a mata em volta, um ou
outro pássaro que passava de vez em quando.
De volta à estrada, passei pelo
posto do Instituto Ambiental do Paraná, onde é feito o controle de acesso à
região do Parque Estadual do Marumbi. O rapaz do posto pediu pra eu avisar o
outro agente do IAP que fica na Estação Marumbi (para onde me dirigia) que uma
árvore havia caído na estrada e rompido o fio de energia que liga os dois
postos, e por isso eles estavam sem comunicação.
A partir dali a estradinha começa
a ganhar contornos dramáticos de irregularidades do seu piso e de inclinação em
certos trechos. Tanto que apenas veículos 4x4 off road são autorizados a subir.
Percorrer trechos como esse numa big trail como a 1200 GS não é tão fácil como pode parecer. O
peso da moto não deixa margens a uma segurada com a perna ou a manobras mais
ousadas em termos de equilíbrio. De tal forma que foi com um misto de apreensão
e espírito de desafio que encarei o tortuoso caminho.
Nos trechos mais íngremes não há
como parar, recuar ou pensar muito no que se está fazendo. O jeito é acelerar
e, apoiado nos estribos, confiar que a dinâmica vai funcionar. No final das
contas deu tudo certo, mas custou algum suor e um bom nível de tensão. Há que
se considerar ainda que estava sozinho [se alguma coisa desse errado, iria
demorar pra aparecer alguém pra ajudar] e, pra piorar a situação, estava com o
pneu traseiro no final da sua vida útil, além de ser um pneu prioritariamente para
asfalto, ou seja, estava com bem pouca tração ali atrás, e a estradinha ainda
estava úmida do sereno da madrugada... “Ai meu deus!” [risos]
A estrada termina na Estação Hugo
Lange. De lá fiz uma rápida caminhada de uns vinte minutos até a Estação
Marumbi, um pouco acima, dei o recado da árvore caída ao camarada do posto de
fiscalização e fiquei um tempo por ali, curtindo o silêncio do lugar,
apreciando a bela visão do maciço do Marumbi, tirando umas fotos, lendo um
pouco e aproveitando a agradável sensação daquele começo de tarde.
(by Mavic)
(by Mavic)
Maciço do Marumbi, visto de 500 metros de altura
(by Mavic)
Estação Marumbi
(by Mavic)
(by Mavic)
A descida pela estradinha de
terra foi, como imaginara, ainda mais tensa do que a subida. Passei por vários
“quase” (buracos inesperados, pedras grandes demais “fora do lugar”, etc), mas
sobrevivemos ilesos (moto e piloto).
Mais uma vez devo registrar aqui
minha admiração por essa bela máquina, também nesse tipo de ambiente totalmente
travado e irregular. A motinha é show!
A volta pra Curitiba foi pela BR
277, subindo a Serra do Mar numa bela sequência de curvas e visuais de cartão
postal.
É bom ter em mente que o “grande
motivo” pra fazer o que quer que seja é apenas a vontade de fazer. Outros
motivos serão sempre coadjuvantes, ainda que aparentem o contrário. Mas nem
sempre é fácil identificar essa vontade... Bem como pode acontecer de não ser
fácil reunir a energia necessária requerida para fazer o que se quer... Mas a
graça é essa – juntar o quebra cabeça e conseguir criar uma “imagem” que faça
sentido. Começar é sempre uma boa forma de colocar essa energia em movimento.
Viva a vida!
Painéis pintados na fachada de um velho prédio em Morretes
"O objetivo de toda civilização é converter o homem,
animal de rapina, num ser manso e civilizado,
isto é, num animal doméstico."
(Nietzsche, em A Genealogia da Moral)
Gratidão
Força Sempre
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Recentemente "descobri" uma bela música com a qual me identifiquei muito:
(de Vicente Barreto e Paulo César Pinheiro)
"Um dia eu senti um desejo profundo
de me aventurar nesse mundo,
pra ver onde o mundo vai dar.
(...)
Saudade, não sei bem de que,
de me aventurar nesse mundo,
pra ver onde o mundo vai dar.
(...)
Saudade, não sei bem de que,
tristeza, não sei bem por que,
vontade até sem querer de chorar.
Angustia de não se entender,
um tédio que a gente nem crê,
anseio de tudo esquecer e voltar."
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