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" 'Correntes históricas dirigem a humanidade com uma imposição ferrenha rumo a um alvo inevitável. Nenhuma sociedade pode resistir às leis naturais.' Afirma Karl Marx, em O Capital. Hegel e Fichte ensinaram que ser racional consiste em compreender que a razão humana é fútil, e que forças não humanas governam o mundo. Os homens são livres na medida em que aceitam seu destino, pois a liberdade humana não significa o poder do homem de tomar decisões livres. Consiste em compreender o destino. Acrescenta Freud que os fenômenos mentais são sujeitos a leis inflexíveis de causa e efeito como os fenômenos físicos. Vivemos, corpo e alma, num mundo predeterminado.
Nos fenômenos mentais nada acontece por acidente. A liberdade psicológica é uma quimera. Não há lugar para o acaso no mundo mental como não o há no mundo físico."
(Jerome Frank, Destino e Liberdade)
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A convite de amigos da Escola de Filosofia Nova Acrópole, no dia 26 de março fizemos um trekking de reconhecimento ao Salto dos Macacos, bela queda d'água situada em meio à Mata Atlântica, nas imediações do maciço do Marumbi, município de Morretes-PR.
A trilha demanda de uma hora e meia a duas horas (ou mais) para ser realizada (somente ida), dependendo do ritmo de caminhada. O local é efetivamente muito bonito e inspirador. Além do salto d'água que dá nome ao local, há várias piscinas naturais de água cristalina (e gelada) e algumas vias de "tobogãs", lajes de pedra transformadas em grandes escorregadores por força da ação constante da água sobre elas. Há ainda a imponente mata em volta, e, ao longe, a visão hipnotizante das montanhas da Serra do Mar.
A trilha, bem demarcada, acidentada e íngreme em certos trechos, pode ser também cenário de um excelente treino de corrida em trilha/ montanha, com o bônus extra de um revigorante banho de cachoeira ao final.
No domingo seguinte era o dia previsto para fazer o trekking com um grupo maior, composto por alunos da Escola, familiares e amigos, mas devido ao tempo chuvoso e instável, achou-se melhor reverter o roteiro para uma outra trilha naquela região (já que a trilha do Salto dos Macacos atravessa dois rios e torna-se bem escorregadia sob condições de chuva).
Num grupo de dezoito pessoas, fizemos então uma caminhada até a Estação Marumbi e arredores (cachoeira do Cemitério dos Grampos), em cerca de duas horas de subida pela estradinha de terra, mais um tempo lá por cima e depois o retorno.
Além da oportunidade de poder estar por algumas horas junto à natureza daquela bela região, aproveitamos ainda para interagir entre nós, ora em conversas triviais, ora abordando temas mais especificamente filosóficos, de acordo com a proposta da Escola.
Às vezes a simplicidade de certas oportunidades nos faz distorcer a noção de valor da experiência. Poder reunir um grupo de amigos pra fazer uma caminhada junto à natureza, longe da cidade, desligados do aparato tecnológico cada vez mais onipresente nas nossas vidas, por algumas horas, num domingo chuvoso, é realmente uma vivência a ser valorizada e reconhecida com gratidão.
Este belo vitral faz parte da arquitetura da Estação de trem Marumbi, uma estação ao sopé da cadeia de montanhas de mesmo nome, que é um dos ícones do montanhismo no Paraná - uma bela localização. Atualmente a estação e tudo em volta encontra-se com aquele inescapável aspecto de abandono da coisa pública no Brasil, ao qual, de certa forma, já nos acostumamos. Fico imaginando um lugar como esse no Canadá, ou na Europa... Limpo, bem cuidado, com pessoas simpáticas e bem informadas monitorando o espaço... Quem sabe um dia...
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Observe a pedra grande apoiada sobre duas outras bem menores.
Imagine a cadeia de eventos que levou ao momento em que essas pedras
se assentaram nessa posição...
Sobre liberdade ou determinismo
Certamente um dos temas mais instigantes da Filosofia, e da vida, é a questão da engrenagem por trás dos fatos que acontecem, e, particularmente, dos fatos que nos acontecem. Haverá uma "lógica" pra cada acontecimento? Haverá uma inteligência que coordena tudo? Haverá um Deus que olha por nós e nos protege? Haverá espíritos ou entidades espirituais que velam por nós e nos orientam? Haverá um destino do qual não podemos escapar? São questões que em um momento ou outro, mais cedo ou mais tarde, cada pessoa já deve ter se feito, diante de acontecimentos cruciais ou triviais da vida.
É muito comum, na nossa cultura, quando algo indesejado acontece em nossa vida (particularmente morte de familiares e amigos), buscarmos consolo em conceitos do tipo: "Deus sabe o que faz", ou "Deus escreve certo por linhas tortas"... E o que isso quer dizer? Que existe um destino maior do que nós mesmos, e que devemos nos resignar a ele. Parece que há um traço de sabedoria por trás desses ditos populares.
Observo que, nesse sentido, a maioria das pessoas com quem costumo conversar sobre isso acredita que "nada acontece por acaso". A própria Filosofia nos ensina, alinhada com os ensinamentos de outras áreas de estudo (como o espiritismo de Allan Kardec) que tudo que acontece é apenas parte de uma grande cadeia de causas e efeitos, a lei da ação e reação, ou Lei do Carma.
Há uma teoria chamada "efeito borboleta", parte de um estudo chamado "teoria do caos", que ilustra bem essa cadeia ao afirmar que o simples bater de asas de uma borboleta poderia, ao final de uma cadeia de eventos, causar um tufão do outro lado do mundo.
Tem um trecho de um filme, chamado "O curioso caso de Benjamin Button", que também ilustra bem essa questão da liberdade versus determinismo em acontecimentos cruciais. Veja no link abaixo:
Pessoalmente penso que certos aspectos dessa questão são inquestionáveis, como o fato de não termos o controle dos acontecimentos e o fato de existir uma clara cadeia de causas e efeitos em tudo o que fazemos e em tudo o que nos acontece.
Já em relação à "crença" de que "nada acontece por acaso", que todo acontecimento tem uma "razão" que o regula e o legitima, digamos assim, tenho minhas reservas... Penso que até pode ser assim, mas talvez numa escala muito maior do que a que podemos tentar abarcar.
Acho que tentar entender certos acontecimentos que nos ocorrem pode ser tremendamente ingrato e frustrante, simplesmente por não dispormos das condições existenciais para tal tarefa.
No final das contas, vale mesmo a afirmação de Jerome Frank (citado no começo deste post): "os homens são livres na medida em que aceitam seu destino". O resto é especulação.
Força Sempre
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