Tiger 900 Rally Pro

Tiger 900 Rally Pro
Tiger 900 Rally Pro

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Viagem de moto a algum lugar (ou a lugar nenhum) - 23 e 24 Abr 2017









Prazeres e contratempos de uma voltinha de moto não planejada



Domingo, duas da tarde. Sou assaltado por uma enérgica sensação de inquietude. Resolvo dar vazão à demanda e sair pra dar uma voltinha de moto. Mas não apenas um passeio de ir ali e voltar daqui a pouco. Precisava dar uma saída um pouco maior. Decidi que iria pra algum lugar e voltaria no dia seguinte. Arrumei minhas coisas, avisei à Mari e à Thaís que estava saindo e fui.

Rápida parada no posto pra encher o tanque, calibrar os pneus e bora pra estrada! Peguei a BR 376 sentido sul. Já a caminho de lugar nenhum, pensei em dar um pulo em algum canto de alguma daquelas simpáticas cidadezinhas do interior de Santa Catarina. Lembrei-me que algum tempo atrás havia estado numa pousada bem simpática na pequena cidade de Doutor Pedrinho. Estabeleci então um objetivo!

Inseri o destino no GPS e vi que a distância prevista era de cerca de 250 km. Hora prevista de chegada: 18h 20min. ‘Beleza’.

Trânsito meio pesado na estrada, um pouco pior do que o normal, certamente por conta da volta do feriado da sexta-feira. Paciência. Vamos tocando.

Pouco antes de Joinville infleti para uma estrada secundária que atravessava grandes plantações de arroz. Um pouco menos de movimento e um pouco menos de pressa do tráfego local sinalizaram que estava na direção do que procurava – outro ritmo.

Pouco depois das seis horas escureceu. De repente, não mais do que de repente, me vi numa estrada de terra, dentro da escuridão, em meio à poeira, levado pelas indicações do fiel (e às vezes incerto) Garmin. Putz! Vamos lá! Podia voltar e buscar outro caminho, mas resolvi ver onde aquilo ia dar. Funcionou. Poucos quilômetros depois estava de volta à sensação de maior civilidade do asfalto.

Meia hora mais tarde chegava ao destino previsto. Nem o posto de gasolina estava aberto. Ninguém nas ruas. Só alguns poucos postes a iluminar as ruas desertas. Procuro daqui e dali até achar uma placa indicando o caminho da tal pousada em que pretendia ficar. Novamente uma estradinha de terra levava até o portão da hospedaria, que, pra combinar com tudo em volta, estava fechado, com cadeado, e tudo apagado lá dentro. Putz! Tudo bem...

Fiz meia volta e retornei ao centro da pequena cidade. Resolvi voltar pra Timbó, uma cidade um pouco maior cerca de 30 km distante. Já em plena noite, fui curtindo as muitas curvas da estradinha e apreciando o clima de sossego do ambiente em volta.

Chegando a Timbó, busquei opções de hospedagem no GPS, selecionei uma e fui dar uma olhada. Um hotel bem bacana, mas com um preço da diária acima do que gostaria de gastar naquele momento. ‘Vou ver mais umas opções’. Parei num posto de combustível, abasteci, pedi informações ao frentista e em seguida fui dar uma olhada no hotel que ele recomendara. Normal o hotelzinho, mas numa rua muito movimentada. Como ainda era cedo e estava uma noite bem agradável, resolvi tocar pra próxima cidade, Pomerode, pra curtir um pouco mais a oportunidade de pilotar sob o aconchego da escuridão.

Pomerode é uma cidadezinha bem simpática. Também já havia passado por lá há algum tempo numa viagem de bicicleta no Circuito do Vale Europeu. Até me lembrava de uma pousada bem aconchegante na qual havia me hospedado naquela ocasião. Busquei-a então no GPS e me dirigi para lá. Mas estava fechada. Ok, não tá morto quem peleia.

Mais uma tentativa: um hotel com um nome alemão bem sugestivo. Cheguei lá e o local era acolhedor. No alto de uma colina, totalmente silencioso, jardim bem cuidado. Uma moça simpática me atendeu. Mas o preço era ainda mais alto do que o do hotel chique de Timbó. Agradeci e caí fora. Na verdade, quase cedi. Mas ainda era cedo e ainda não estava cansado o suficiente pra arregar para um preço um pouco mais alto do que queria. Talvez, no fundo, no fundo, quisesse mesmo era continuar cavalgando meu belo cavalo mecânico, não sei bem...

Retornei ao centro da cidade pensando no que fazer: procurar outra opção por ali ou voltar à estrada. Dei uma fuçada no GPS, fiz uns cálculos mentais e já que estava uma bela noite e estava bem à vontade com a situação, resolvi tocar em frente. ‘Vou-me embora pra Joinville. Lá sou amigo do rei.’ E bora pra estrada!

Pilotar à noite tem um duplo viés: a sensação boa de estar num mundo diferente do diurno e, ao mesmo tempo, a sensação um tanto tensa de domínio da situação um pouco menor do que se tem em plena luz. Tudo fica um pouco mais difuso, concentrado no facho do farol a iluminar o estreito ângulo à frente. Curtir o ronco grave do boxer da GS entre as pernas nesse clima de mistério que a noite inspira é bem instigante e altamente motivador. É incrível o potencial de prazer dessa máquina sobre rodas!

Por volta das dez horas estava em Joinville, de volta ao ritmo acelerado dessas cidades que se desacostumaram a dormir. Cheguei a pensar em fazer uma rápida parada e tocar direto de volta pra casa, mas achei que uma noite numa cama diferente faria bem à minha inquietude inicial.

Joinville tem pra mim o impagável gosto de volta ao passado, já que morei lá por cinco anos no começo da década de 90. Circular por algumas de suas ruas tem o efeito inevitável de trazer à tona lembranças e emoções vividas naquela época. Boas memórias! Interessante esse poder que o passado tem de nos inspirar esse sentimento de saudade, de perda, de página virada. Sentimento bom, ao mesmo tempo que um tanto melancólico.

Parei numa lanchonete e fiz um rápido lanche. Fui então para um hotel que imaginava que atenderia à minha expectativa de qualidade e preço. Hotel bacaninha, cheio de estilo. Ao perguntar o preço, o cara da recepção falou: “um-cinco-nove, mais 3% de ISS, mais dezenove de garagem”. Engraçado esse nosso mundo moderninho. O sujeito me vêm com “um-cinco-nove” como se fosse um eufemismo para cento e cinquenta e nove. E ainda tem a malandragem de separar o preço de um imposto do preço total. Quase fiz meia volta e caí fora, mas achei que estava de bom tamanho o meu passeio naquele momento, além de sacar que não ia adiantar muito ficar correndo atrás de outras opções pra encaixar a equação perfeita de custo-benefício. Relaxei e encerrei a brincadeira. Quase onze da noite. 404 km rodados. Estava devidamente “remediado” para uma boa noite de sono.

No dia seguinte cumpri os 130 km de volta para as alturas de Curitiba em uma hora e pouco, num trecho conhecido e bem divertido da BR 101, subindo a Serra do Mar. Cheguei em casa em tempo de pegar o almoço...

Às vezes me cobro que esses passeios são meras sensações, traços pueris num mundo de ilusões. Mas o que não é vão nesse nosso mundo material cheio de arestas? Se é pra ser meio sem sentido, que pelo menos o seja de forma divertida. Sim, talvez seja meio artificioso, mas de alguma forma parece que mantém o equilíbrio da equação, essencialmente dinâmica, assim como a vida.






"Obcecados por contos de fadas, 
passamos a vida procurando uma porta mágica e um reino perdido."
(Eugene O'Neill) 






Gratidão




Força Sempre









domingo, 23 de abril de 2017

Sobre "Por que o mundo existe?" - um mistério existencial








Lembro-me que no início da adolescência me ocorreu uma questão que ocupou minhas reflexões por algum tempo: por que existe um mundo? E como seria se não houvesse nada... Quer dizer, nada mesmo. Com o passar do tempo e o natural surgimento de outras demandas (mais pragmáticas), esses devaneios ficaram adormecidos. 

Muitos anos depois, em algum momento do começo de 2013, vi, por acaso, uma resenha de um livro numa revista que me chamou a atenção. Tratava-se de um trabalho de um autor chamado Jim Holt, que se debruçara justamente naquela questão que me ocorrera espontaneamente muitos anos antes. 

"Por que o mundo existe?" (Editora Intrínseca, 2012) aprofunda-se na investigação filosófica (e também científica e religiosa) do por que existe um mundo e não simplesmente o nada, e é bastante interessante. 

Logicamente que, por ser uma questão estritamente metafísica e inescrutável, que não se deve esperar por uma conclusão cartesiana, didática, definitiva. O texto se desenvolve através do que já foi pensado a esse respeito ao longo da história da humanidade, do que pensam os cientistas, os religiosos, as pessoas comuns (e curiosas), e com isso constrói-se uma narrativa investigativa e que induz à reflexão, mas sendo o assunto que é, não há uma resposta conclusiva. O mérito está no caminho, e não no destino.

A título de ilustração, vejamos algumas passagens do texto:





"... qualquer explicação puramente cientifica da existência do universo está fadada à circularidade."

"Ninguém pode se dizer dotado de superioridade intelectual frente ao mistério da existência. Pois, como William James observou, 'nesse ponto somos todos indigentes'

"Se o meu ser, o microcosmo, é ontologicamente precário, talvez o mesmo se dê com o macrocosmo, o universo como um todo. Em termos conceituais, a pergunta 'Por que o mundo existe' rima com 'Por que eu existo?' ".

"Para Leibniz, a resposta era fácil. O motivo da existência do mundo, afirmava então, era Deus, que o criou por livre escolha, motivado por sua infinita bondade. Mas qual seria a explicação para a existência do próprio Deus?"

"Bertrand Russel assim resumia o consenso filosófico: 'devo dizer que o universo apenas está aí, e isso é tudo.' "

"Einstein estava convencido de que o universo era não só eterno mas também imutável de uma forma geral. Assim, em 1917, quando aplicou sua teoria geral da relatividade ao espaço-tempo como um todo, ficou perplexo ao constatar que suas equações indicavam algo radicalmente diferente: o universo deve estar se expandindo ou se contraindo."

"Assim como passou a existir com o Big Bang inicial, expandindo-se e evoluindo até a forma atual, ele também poderia vir a desaparecer num futuro distante com um Big Crunch, um grande esmigalhamento. (Uma das questões da cosmologia hoje é saber se o destino final do universo será um grande esmigalhamento, um grande congelamento ou um grande colapso.) Tal como nossas vidas, a vida do universo pode ser um mero intervalo entre dois nadas."

"Na metafísica de Schopenhauer, todo o universo é uma grande manifestação de luta, uma grande vontade. E a vontade, para Schopenhauer, é em sua essência sofrimento: nenhum objetivo, uma vez alcançado, é capaz de gerar satisfação; a vontade ou será frustrada e gerará infelicidade ou será saciada e provocará tédio."

"Heidegger estabelecia uma distinção entre medo, que tem objeto definido, e angústia, uma vaga sensação de não estar à vontade no mundo. Do que temos medo em nossos momentos de ansiedade? Do nada. Nossa existência sai do abismo do nada e acaba no nada da morte. Desse modo, o encontro intelectual que cada um de nós tem com o nada está permeado pelo temor do nosso iminente não ser."

"E quanto ao nada absoluto, a total ausência de tudo? Seria possível? Certos filósofos afirmam que não é. Para eles, a própria ideia é contraditória. Se estiverem certos, o enigma do ser tem uma solução fácil e das mais triviais: existe algo e não apenas nada simplesmente porque o nada é impossível. No dizer de um filósofo contemporâneo, 'não há alternativa ao ser'. Seria verdade? Feche os olhos, por favor, e tape os ouvidos, Agora, imagine-se num vazio absoluto. Tente projetar no não ser todo o conteúdo do mundo. Você pode começar (...) imaginando o desaparecimento de todos os homens, mulheres, árvores, plantas, pássaros e animais, o céu e a terra. E não apenas o céu, mas tudo o que nele se encontra. Imagine todas as luzes se apagando no cosmos: o sol desaparece, as estrelas se extinguem, as galáxias deixam de existir uma a uma, ou bilhão a bilhão.  Em sua mente, todo o cosmos resvala para o silêncio, o frio, a escuridão - sem que haja mais nada para ser silencioso, frio ou escuro. Você conseguiu imaginar o nada absoluto. Mas será mesmo? Quando o filósofo francês Henri Bérgson tentou imaginar a aniquilação universal, constatou que inevitavelmente restaria algo no fim da experiência: seu eu interior. (...) Ele considerou impossível imaginar o nada absoluto sem algum resíduo de consciência se manifestando na escuridão, como uma luzinha por baixo da porta. Concluiu então que o nada deve ser uma impossibilidade."

"O universo é contingente. Poderia não ter existido. Considerando-se que existe, deve haver uma explicação. Deve ter sido gerado por algum outro ser. Suponhamos que também esse ser seja contingente. Também deverá haver, dessa forma, uma explicação para a existência dele. E assim por diante, Só que ou essa cadeia explicativa chega ao fim em algum momento ou não. Se de fato chega ao fim, o último ser na cadeia só pode ser auto explicativo. Se ela prossegue ad infinitum, o que precisa de explicação é toda a cadeia de seres. Ela deve ter sido causada por algum ser de fora da cadeia. Portanto, a existência desse ser é que deve ser auto explicativa. Em qualquer caso, a existência de um mundo contingente deve ser explicada, em última análise por algo cuja existência seja auto explicativa."

"Nós claramente vivemos nos remanescentes diluídos, resfriados e em expansão da grande explosão cósmica que ocorreu há cerca de catorze bilhões de anos. O que poderia ter causado essa explosão primeva? E o que a precedeu, se que é algo a precedeu?"

"A possibilidade de o mundo existir sem nenhuma razão o deixa perturbado? "

No epílogo o autor conta como teve a inspiração pra se dedicar por tanto tempo e com tanto afinco a essa questão de "por que existe o mundo e não simplesmente o nada". Conta ele que, certo dia, estava em Paris e viu, meio por acaso, um programa de TV em que esse tema era abordado:

"Sintonizo um programa sobre literatura do conhecido apresentador (...). Os convidados da noite são um padre dominicano, um físico teórico e um monge budista. Eles estão à volta com uma profunda questão metafísica, originalmente enunciada três séculos atrás por Leibniz: por que existe algo e não apenas o nada?
Cada um dos convidados tem sua maneira diferente de responder à pergunta. O padre, jovem bem apessoado, mas carrancudo, (...) afirma que a realidade não podia deixar de ter uma origem divina. Assim como cada um de nós passou a existir por um ato de nossos pais, diz o padre, também o universo deve ter passado a existir pelo ato de um criador. Ele acrescenta que Deus não foi a primeira causa num sentido temporal, pois Deus criou o próprio tempo. Deus estava por trás do Big Bang, mas não era anterior a ele.
O físico é um sujeito mais velho (...). Mostra-se irritado e impaciente com toda essa bobajada sobrenatural. A existência do universo é uma pura questão de flutuações quânticas aleatórias, diz. Do mesmo modo que uma partícula e sua antipartícula podem surgir espontaneamente de um vácuo, também acontece com a semente de um universo inteiro. Assim, a teoria quântica explica por que existe algo e não apenas o nada. Nosso universo surgiu por acaso de uma flutuação quântica do vazio. E ponto final.
O monge, trajando uma túnica vermelha e açafrão, com os ombros nus e a cabeça raspada, apresenta o ponto de vista mais interessante sobre a questão. (...) Em contraste com a cara de santo do jovem padre e a irritabilidade do velho físico, o monge exala felicidade. (...) Como budista, diz, ele acredita que o Universo não teve início. O nada jamais poderia dar origem ao ser, afirma, pois se define em oposição àquilo que existe. Nem um bilhão de causas poderiam fazer com que um universo passasse a existir a partir do que não existe.
(...) O monge budista protesta, gentil, que não está fugindo da questão das origens. Ele a usa, isso sim, para explorar a natureza da realidade. O que é o universo, afinal de contas? Não é naturalmente o nada. Mas é algo muito próximo: um vazio. As coisas não tem, de fato, a solidez que lhes atribuímos. O mundo é como um sonho, uma ilusão. Todavia, em nosso pensamento transformamos sua fluidez em algo fixo e de aparência sólida."

A colocação do monge budista, no trecho transcrito acima, meio que desarma o 'enredo' da história. Enquanto todos estão engajados em decifrar o 'mistério do mundo', o cara pergunta: "que mundo?"







Pessoalmente acho esse tipo de questão a um só tempo fascinante, instigante, irrelevante e apaixonante. 

O que me ocorre quando me dedico a pensar um pouco sobre esse tipo de assunto é quão limitados, pequenos e ignorantes nós somos em relação ao universo e à vida. De alguma forma, esse tipo de reflexão me inspira certa humildade, certa reverência e um sentimento meio angustiante de solidão.

A sensação que tenho é que fazemos parte de uma história muito maior e mais complexa (ou mais simples...) do que somos capazes de imaginar. 

Será que "algum dia" seremos capazes de entender um pouco melhor tudo isso?

E você, o que acha dessa questão?







Cordilheira do Himalaia, vista do alto do Kalapatar, Abril de 1996
Um "grão de areia" do nosso universo incognoscível...







Força Sempre









sexta-feira, 14 de abril de 2017

Pedal MTB Curitiba-Morretes-Curitiba, 08 Abr 2017









Há algum tempo alguns amigos e eu combinamos que "um dia" desceríamos pra Morretes de bicicleta. Na quinta feira, dia 6 Abr, o Castagnino, um dos guerreiros, acionou a turma pra fazermos o passeio no sábado. O Paulo Célio, o Hipólito e eu confirmamos presença. Assim, às oito e meia da manhã do sábado encontramo-nos num posto no começo da BR 277, estrada que liga Curitiba ao litoral, para colocarmos nossos planos em prática.

A ideia era ir até Morretes, distante cerca de 70 km da capital, descendo a Serra do Mar em parte pelo asfalto da BR e em parte por uma estradinha de terra conhecida pelo estranho nome de Serra do Anhaia. 







(Crédito da foto: Paulo Célio)




O trecho da BR transcorreu rápido e sem sustos, com destaque para o setor especificamente de serra, marcado por uma descida empolgante, cheia de adrenalina e uma boa dose de risco. Mas divertido mesmo foi o downhill da estradinha de terra do tal Anhaia! Declive acentuado temperado por pedras, buracos, curvas fechadas, galhos de árvores caídos na estrada e a monumental moldura da mata fechada em volta. Muito bacana!











Concluído o trecho da descida, demos uma paradinha num rio que corria ao lado para um relaxante banho nas corredeiras, pra curtir o ambiente em volta e pra trocar as impressões do caminho até então percorrido. 










De volta às bikes, em mais alguns minutos por uma agradável estrada de terra simpaticamente assentada em leve declive chegamos à cidade de Morretes, por volta das onze e quinze. Demos uma volta pelo centro, visitando as barraquinhas da feirinha local, tomamos um caldo de cana, batemos um papo e começou-se a pensar na volta, programada pra ser feita de ônibus. 

Dei uma olhada no relógio, consultei meu oráculo interno e pensei: "por que não voltar também pedalando?"... A Serra da Graciosa estava logo ali, a poucos quilômetros de distância, o clima estava bom (sem chuva, sem calor excessivo), a bicicleta estava em ordem, então resolvi usar a velha "teoria do Jaques" ("já que estou aqui...") e aproveitar a oportunidade pra fazer um pedal um pouco mais longo. Já havíamos pedalado cerca de 60 km até ali. Pra fazer a volta pela Graciosa e retornar pra casa estimei que ainda faltariam cerca de 70. 











Despedi-me dos meus companheiros, subi na montaria, respirei fundo e coloquei os pedais em movimento. Até o sopé da Serra da Graciosa foram 15 km planos e suaves. A subida da Serra é, sempre, uma brincadeira que merece respeito. São 14 km só subindo, com inclinação de "média" a "bastante forte". O ambiente da estrada, no entanto, compensa facilmente o rio de suor cobrado como "pedágio". No finalzinho começa a dar aquela sensação meio incômoda de "esse negócio não vai acabar mais?". Mas uma hora acaba... No topo da Serra, mais um caldo de cana, pra comemorar, e bora pedalar.











O trecho seguinte segue pela Estrada da Graciosa, num sobre e desce constante e um belo visual em volta, até desembocar na estrada do Contorno Leste de Curitiba, por volta das quatro da tarde. Ok, agora é só continuar girando os pedais até chegar em casa!... 









Devo confessar que essa sensação de intenso cansaço de pedalar por várias horas seguidas causa um certo "estado de transe" que é fantástico. Os pensamentos começam a percorrer terras até então impensadas; o corpo, já completamente adaptado à demanda do momento, equilibra-se entre uma dorzinha aqui e ali e um certo anestesiamento; a sensação dominante é de força e contentamento! Muito bom.








No finalzinho da tarde estava em casa, com o odômetro marcando 145 km rodados desde de manhã cedo. Foi um belo passeio! 







 1ª parte: Curitiba a Morretes





Altimetria da 1ª parte






 2ª parte: Morretes a Curitiba







Altimetria da 2ª parte





P.S.: Meus agradecimentos aos companheiros de pedal - Castagnino, Paulo Célio e Hipólito. Que a parceria possa render outras boas histórias ciclísticas. 






"Com as nossas mãos, com as mãos do espírito e da vontade,
do amor e do destino, tecemos devagar 
a verdade de cada dia e de cada momento.
O que parece que nos chega pronto,
como uma surpresa da vida,
é muitas vezes esse tecido que fiamos ao longo do tempo,
esquecidos de que o fiamos.
De uma só vez, e de algum modo milagroso,
somos a um só tempo o tecelão e o usuário,
que se encanta com as cores ou se surpreende com a aspereza desse tecido."
(Luiz Carlos Lisboa)






Força Sempre





Gratidão







domingo, 9 de abril de 2017

Trekking ao Salto dos Macacos e Estação Marumbi, Morretes-PR - 26 Mar e 02 Abr 2017








*  *  *

" 'Correntes históricas dirigem a humanidade com uma imposição ferrenha rumo a um alvo inevitável. Nenhuma sociedade pode resistir às leis naturais.' Afirma Karl Marx, em O CapitalHegel e Fichte ensinaram que ser racional consiste em compreender que a razão humana é fútil, e que forças não humanas governam o mundo. Os homens são livres na medida em que aceitam seu destino, pois a liberdade humana não significa o poder do homem de tomar decisões livres. Consiste em compreender o destino. Acrescenta Freud que os fenômenos mentais são sujeitos a leis inflexíveis de causa e efeito como os fenômenos físicos. Vivemos, corpo e alma, num mundo predeterminado.
Nos fenômenos mentais nada acontece por acidente. A liberdade psicológica é uma quimera. Não há lugar para o acaso no mundo mental como não o há no mundo físico."
(Jerome Frank, Destino e Liberdade)



*  *  *




A convite de amigos da Escola de Filosofia Nova Acrópole, no dia 26 de março fizemos um trekking de reconhecimento ao Salto dos Macacos, bela queda d'água situada em meio à Mata Atlântica, nas imediações do maciço do Marumbi, município de Morretes-PR.

A trilha demanda de uma hora e meia a duas horas (ou mais) para ser realizada (somente ida), dependendo do ritmo de caminhada. O local é efetivamente muito bonito e inspirador. Além do salto d'água que dá nome ao local, há várias piscinas naturais de água cristalina (e gelada) e algumas vias de "tobogãs", lajes de pedra transformadas em grandes escorregadores por força da ação constante da água sobre elas. Há ainda a imponente mata em volta, e, ao longe, a visão hipnotizante das montanhas da Serra do Mar. 

A trilha, bem demarcada, acidentada e íngreme em certos trechos, pode ser também cenário de um excelente treino de corrida em trilha/ montanha, com o bônus extra de um revigorante banho de cachoeira ao final.



































































No domingo seguinte era o dia previsto para fazer o trekking com um grupo maior, composto por alunos da Escola, familiares e amigos, mas devido ao tempo chuvoso e instável, achou-se melhor reverter o roteiro para uma outra trilha naquela região (já que a trilha do Salto dos Macacos atravessa dois rios e torna-se bem escorregadia sob condições de chuva).

Num grupo de dezoito pessoas, fizemos então uma caminhada até a Estação Marumbi e arredores (cachoeira do Cemitério dos Grampos), em cerca de duas horas de subida pela estradinha de terra, mais um tempo lá por cima e depois o retorno. 

Além da oportunidade de poder estar por algumas horas junto à natureza daquela bela região, aproveitamos ainda para interagir entre nós, ora em conversas triviais, ora abordando temas mais especificamente filosóficos, de acordo com a proposta da Escola. 

Às vezes a simplicidade de certas oportunidades nos faz distorcer a noção de valor da experiência. Poder reunir um grupo de amigos pra fazer uma caminhada junto à natureza, longe da cidade, desligados do aparato tecnológico cada vez mais onipresente nas nossas vidas, por algumas horas, num domingo chuvoso, é realmente uma vivência a ser valorizada e reconhecida com gratidão. 




















Este belo vitral  faz parte da arquitetura da Estação de trem Marumbi, uma estação ao sopé da cadeia de montanhas de mesmo nome, que é um dos ícones do montanhismo no Paraná - uma bela localização. Atualmente a estação e tudo em volta encontra-se com aquele inescapável aspecto de abandono da coisa pública no Brasil, ao qual, de certa forma, já nos acostumamos. Fico imaginando um lugar como esse no Canadá, ou na Europa... Limpo, bem cuidado, com pessoas simpáticas e bem informadas monitorando o espaço... Quem sabe um dia...



















*******************************************************





Observe a pedra grande apoiada sobre duas outras bem menores.
Imagine a cadeia de eventos que levou ao momento em que essas pedras
se assentaram nessa posição...




Sobre liberdade ou determinismo

Certamente um dos temas mais instigantes da Filosofia, e da vida, é a questão da engrenagem por trás dos fatos que acontecem, e, particularmente, dos fatos que nos acontecem. Haverá uma "lógica" pra cada acontecimento? Haverá uma inteligência que coordena tudo? Haverá um Deus que olha por nós e nos protege? Haverá espíritos ou entidades espirituais que velam por nós e nos orientam? Haverá um destino do qual não podemos escapar? São questões que em um momento ou outro, mais cedo ou mais tarde, cada pessoa já deve ter se feito, diante de acontecimentos cruciais ou triviais da vida.

É muito comum, na nossa cultura, quando algo indesejado acontece em nossa vida (particularmente morte de familiares e amigos), buscarmos consolo em conceitos do tipo: "Deus sabe o que faz", ou "Deus escreve certo por linhas tortas"... E o que isso quer dizer? Que existe um destino maior do que nós mesmos, e que devemos nos resignar a ele. Parece que há um traço de sabedoria por trás desses ditos populares. 

Observo que, nesse sentido, a maioria das pessoas com quem costumo conversar sobre isso acredita que "nada acontece por acaso". A própria Filosofia nos ensina, alinhada com os ensinamentos de outras áreas de estudo (como o espiritismo de Allan Kardec) que tudo que acontece é apenas parte de uma grande cadeia de causas e efeitos, a lei da ação e reação, ou Lei do Carma.

Há uma teoria chamada "efeito borboleta", parte de um estudo chamado "teoria do caos", que ilustra bem essa cadeia ao afirmar que o simples bater de asas de uma borboleta poderia, ao final de uma cadeia de eventos, causar um tufão do outro lado do mundo.

Tem um trecho de um filme, chamado "O curioso caso de Benjamin Button", que também ilustra bem essa questão da liberdade versus determinismo em acontecimentos cruciais. Veja no link abaixo:




Pessoalmente penso que certos aspectos dessa questão são inquestionáveis, como o fato de não termos o controle dos acontecimentos e o fato de existir uma clara cadeia de causas e efeitos em tudo o que fazemos e em tudo o que nos acontece.

Já em relação à "crença" de que "nada acontece por acaso", que todo acontecimento tem uma "razão" que o regula e o legitima, digamos assim, tenho minhas reservas... Penso que até pode ser assim, mas talvez numa escala muito maior do que a que podemos tentar abarcar. 

Acho que tentar entender certos acontecimentos que nos ocorrem pode ser tremendamente ingrato e frustrante, simplesmente por não dispormos das condições existenciais para tal tarefa. 

No final das contas, vale mesmo a afirmação de Jerome Frank (citado no começo deste post): "os homens são livres na medida em que aceitam seu destino". O resto é especulação. 




Força Sempre