A capa do livro
Terminei de ler, há algumas semanas, o instigante livro “Sapiens – uma breve história da humanidade”, do escritor e historiador Yuval Noah Harari (Editora L&PM, 2017).
Na abrangente obra o autor
procura traçar o caminho percorrido pela espécie Homo Sapiens ao longo da
história até os dias atuais, jogando luz em questões como: por que a nossa
espécie prosperou e chegou ao atual estágio de desenvolvimento e todas as
outras pereceram? Quais foram os pontos cruciais dessa trajetória e a
importância dessas inflexões para sermos o que somos hoje. Qual o efeito dessa
fantástica evolução da humanidade ao longo dos últimos milhares de anos na
felicidade humana? E por aí vai.
É muito interessante embarcar
nesse desafio de tentar enxergar a história da humanidade de uma perspectiva
macro. Acho que buscar entender por que as coisas são como são é um exercício
de reflexão valiosíssimo para construir uma sensação de sentido para a própria
existência individual, e não só para uma visão global da história.
Transcrevo abaixo alguns trechos
do livro (entre aspas), a título de ilustração do que a obra se propõe, e
associo breves comentários, de vez em quando.
O autor destaca que três grandes
revoluções marcaram o curso da humanidade: a chamada Revolução Cognitiva
(ocorrida há 70 mil anos), a Revolução Agrícola (por volta de 12 mil anos
atrás) e a Revolução Científica (iniciada há cerca de 500 anos e ainda em
curso).
Um dado curioso da história da
humanidade, apontado por Harari, é que “de aproximadamente 2 milhões de anos a
10 mil anos atrás, o mundo foi habitado por várias espécies humanas ao mesmo
tempo. (...) O mundo de 100 mil anos atrás foi habitado por pelo menos seis
espécies humanas diferentes.” No decorrer de milhares de anos desse período, o
fato é que, por algum motivo, a nossa espécie se sobressaiu enormemente em
relação às demais, e, em consequência, eliminou todas as outras (num autêntico
processo de seleção natural), provavelmente de forma bastante violenta, até que
só restassem os Sapiens pra contar a história. E aqui estamos nós hoje em dia.
(fonte da imagem: Google)
Suspeita-se que o motivo
determinante desse domínio hegemônico da nossa espécie sobre as demais, nesse
passado longínquo, tenha sido a capacidade única que, em algum momento, os
Sapiens desenvolveram de se comunicar entre si, e com isso começaram a trocar
informações, e, imagina-se, traçar estratégias e planos do que fazer.
Mas por que nossa espécie foi
capaz de aprender a se comunicar e as outras não? “A teoria mais aceita afirma
que mutações genéticas acidentais mudaram as conexões internas do cérebro dos
sapiens, possibilitando que pensassem de uma maneira sem precedentes e se
comunicassem usando um tipo de linguagem totalmente novo. (...) Por que
ocorreram no DNA dos sapiens e não nos neandertais? Até onde pudemos verificar,
foi uma questão de puro acaso”.
Mas o mais interessante sobre
essa questão da linguagem desenvolvida pela nossa espécie, apontada por Harari,
é a “capacidade de transmitir informações sobre coisas que não existem”. Essa
“descoberta” alavancou a habilidade dos sapiens de se organizar em torno de
ideias e de elaborar e desenvolver conceitos sobre o mundo. “Toda cooperação
humana em grande escala (...) se baseia em mitos partilhados que só existem na
imaginação coletiva das pessoas”.
Segundo o autor, “não há deuses
no universo, nem nações, nem dinheiro, nem direitos humanos, nem leis, nem
justiça fora da imaginação coletiva dos seres humanos”.
“Como exatamente Armand Peugeot,
o homem, criou a Peugeot, a empresa? Praticamente da mesma forma como os padres
e os feiticeiros criaram deuses e demônios ao longo da história. (...) Tudo se
resumia a contar histórias e convencer as pessoas a acreditarem nelas”.
“Desde a Revolução Cognitiva, os
sapiens vivem, portanto, em uma realidade dual. Por um lado, a realidade
objetiva dos rios, das árvores e dos leões. Por outro, a realidade imaginada de
deuses, nações e corporações”.
(fonte da imagem: Google)
Achei muito instigante essa
abordagem porque, de alguma forma, sempre reconheci em mim uma pontinha de
desconfiança em relação às doutrinas e ideologias que a nossa querida sociedade
insiste em nos impor vida afora. Por outro lado pode ser meio desconcertante
ver as coisas dessa maneira. Será mesmo que todos os nossos mitos (e valores
decorrentes) não passam de “alucinações coletivas”?
“(...) uma ordem imaginada está
sempre sob ameaça de colapso, porque depende de mitos, e os mitos desaparecem
quando as pessoas deixam de acreditar neles. Para salvaguardar uma ordem
imaginada são necessários esforços árduos e contínuos. Alguns desses esforços
assumem a forma de violência e coerção. Exércitos, forças policiais, tribunais
e prisões estão o tempo todo em ação, forçando as pessoas a agirem de acordo
com a ordem imaginada”.
“A imensa diversidade de
realidades imaginadas que os sapiens inventaram e a diversidade resultante de
padrões de comportamento são os principais componentes do que chamamos
‘culturas’”.
“Desde a Revolução Cognitiva [que
pode ser definida como o surgimento de novas capacidades de pensar e se
comunicar, entre 70 mil e 30 mil anos atrás] não existe um único estilo de vida
natural para os sapiens. Há apenas escolhas culturais, dentro de um conjunto
assombroso de possibilidades”.
Outra questão muito interessante
a respeito dessa história, levantada por Harari, diz respeito ao impacto que a
Revolução Agrícola causou no modo de vida e de pensar dos sapiens. Em linhas
gerais, o autor defende que essa importante revolução mudou drástica e
irreversivelmente o rumo da história, e não exatamente pra melhor, como pode
parecer à primeira vista. Segundo ele, o estilo de vida do sapiens
caçador-coletor era claramente mais saudável e divertido do que o decorrente do
domínio das técnicas agrícolas.
A descoberta de que era possível
cultivar alimentos num mesmo lugar, e com isso não depender mais de sair pra
caçar ou coletar alimentos pra comer, deu ao sapiens certo domínio do processo,
mas, em contrapartida e paradoxalmente, o tornou escravo do próprio processo –
da terra, de trabalhar na lavoura, das condições climáticas, e, depois, de ter
que arcar com os custos de guardar a produção, e de protegê-la de eventuais
ladrões, e, depois, de vendê-la e por aí vai... Até a encrenca na qual estamos
metidos hoje.
(fonte da imagem: Google)
“A economia dos
caçadores-coletores proporcionava à maioria dos indivíduos vidas mais
interessantes do que a agricultura ou a indústria”.
“Enquanto as pessoas nas
sociedades afluentes de hoje trabalham, em média, de 40 a 45 horas por semana,
e as pessoas nos países em desenvolvimento trabalham 60 ou mesmo 80 horas por
semana, os caçadores-coletores que hoje vivem nos habitats mais inóspitos
trabalham, em média, apenas 35 a 45 horas por semana”.
Pode-se argumentar que uma
questão tão complexa não pode ser resumida a uma simples conta de horas de
trabalho por semana. O que, de certa forma, é verdade. Mas não é só isso, pelo
que entendi. Acho que o que Harari quis dizer é que os Sapiens iniciaram a
Revolução Agrícola (possivelmente meio sem querer, sem saber onde aquilo ia
dar) imaginando, no começo, que as novas técnicas poderiam aliviar a pressão de
ter que “correr atrás” da subsistência todos os dias, mas, no final das contas,
o trabalho e a pressão aumentaram, em vez de diminuir.
Aliás, muito parecido com as
promessas da atual e recentíssima Revolução Tecnológica pela qual estamos
passando. Eu próprio lembro-me que, quando os computadores pessoais se
popularizaram, na década de 90 do século passado, havia a expectativa de que
isso facilitaria enormemente nossa carga de trabalho, e nos permitiria maior
tempo livre pra fazer outras coisas. Trinta anos depois, todos sabemos aonde
essa vã ilusão veio dar.
“Em vez de prenunciar uma nova
era de vida tranquila, a Revolução Agrícola proporcionou aos agricultores uma
vida em geral mais difícil e menos gratificante que a dos caçadores-coletores.
(...) A Revolução Agrícola foi a maior fraude da história”.
“As plantas domesticaram o Homo
sapiens, e não o contrário”.
“Essa é a essência da Revolução Agrícola:
a capacidade de manter mais pessoas vivas em condições piores”.
“Por que as pessoas cometeram um
erro de cálculo tão fatídico? Pela mesma razão pela qual as pessoas cometeram
erros de cálculo ao longo de toda a história: as pessoas foram incapazes de
compreender todas as consequências de suas decisões”.
“A Revolução Agrícola é um dos
acontecimentos mais controversos da história. (...) Esse foi o ponto decisivo,
afirmam, em que os sapiens abandonaram sua íntima simbiose com a natureza e
correram rumo à ganância e à alienação”.
O trecho a seguir é bastante
interessante. Observe: “A busca de uma vida fácil resultou em muitas
dificuldades, e não pela última vez. Acontece conosco hoje. Quantos jovens
universitários recém-formados aceitam empregos exigentes em empresas
importantes, prometendo que darão duro para ganhar dinheiro que lhes permitirá
se aposentarem e irem atrás de seus verdadeiros interesses quando chegarem aos
35? Mas, quando chegam a essa idade, eles têm grandes hipotecas para quitar,
filhos para educar, casas em zonas residenciais que necessitam pelo menos de
dois carros por família e uma sensação de que a vida não vale a pena sem um bom
vinho e férias caras no exterior. O que
se espera que façam, voltem a arrancar raízes? Não, eles redobram seus esforços
e continuam se escravizando”.
“Uma das poucas leis férreas da
história é que os luxos tendem a se tornar necessidades e a gerar novas
obrigações”.
No prosseguimento da obra, Harari
passa pelo relato propriamente histórico de como os sapiens desenvolveram o comércio
e sua ferramenta central, o dinheiro, e como criaram impérios predadores e
ambiciosos com fome de “conquistar o mundo”, e como isso tudo, no final das
contas, contribuiu para a multiplicação de indivíduos da espécie, bem como para
o desenvolvimento de técnicas e objetos inovadores para que o mundo viesse a
ser o que é hoje. Ou seja, em outras palavras, o atual “desenvolvimento” é
filho direto da ambição da nossa espécie.
“O verdadeiro avanço na história
monetária aconteceu quando as pessoas passaram a confiar em um dinheiro
desprovido de valor inerente, mas que era mais fácil de armazenar e
transportar”.
Harari analisa com especial
atenção e ênfase a história do desenvolvimento do comércio mundial, e, mais recentemente,
a história das grandes navegações no século XV e a consequente “explosão” de
“desenvolvimento” levada a efeito com a “descoberta” e colonização do
continente americano pelos europeus. A esse respeito, investiga por que esse
processo foi realizado e liderado principalmente pelos espanhóis, portugueses,
holandeses e ingleses, com praticamente nenhuma participação de chineses,
árabes e outras nações com grau de desenvolvimento muito semelhante ao europeu
naquela época. Segundo ele, o diferencial foi a “visão imperialista” dos
europeus, e, além disso, o fato destes terem sabido associar a ciência ao
enfoque militar em suas expedições de exploração e conquista.
Bastante atenção é dada também ao
processo de dizimação e destruição imposto pelos conquistadores europeus às
culturas nativas das Américas – particularmente incas, maias e astecas -, nas
primeiras décadas do século XVI, e quão rápido e sem resistência esse massacre
ocorreu.
Num outro trecho da obra, o autor
explica em detalhes o desenvolvimento vertiginoso do capitalismo, bem como seus
motivos e consequências.
“A afirmação de Smith de que o
desejo humano egoísta de aumentar o lucro privado é a base para a riqueza
coletiva é uma das ideias mais revolucionárias na história humana”.
“Pouco a pouco o capitalismo se
tornou muito mais do que uma doutrina econômica. Hoje engloba uma ética – um
conjunto de ensinamentos sobre como as pessoas devem se comportar, educar seus
filhos e até mesmo pensar. Sua doutrina fundamental é que o crescimento
econômico é o bem supremo, ou pelo menos uma via para o bem supremo (...)”.
“De modo muito similar à
Revolução Agrícola, o crescimento da economia moderna talvez também se revele
uma fraude colossal. A espécie humana e a economia global podem muito bem
continuar crescendo, mas muito mais indivíduos passam fome e privação”.
Harari comenta também sobre a
questão industrial e energética, e afirma, sobre isso, que as fontes de energia
estão aumentando, e não diminuindo, como temiam certas linhas de pensamento até
bem recentemente.
“A Revolução Industrial produziu
uma combinação sem precedentes de energia abundante e barata com matérias
primas abundantes e baratas. (...) Mas a Revolução Industrial foi, acima de
tudo, a Segunda Revolução Agrícola”.
Outra questão alvo da atenção da
obra é sobre o tratamento que a humanidade deu aos animais ao longo da
história, e, em particular, nos dias atuais. O autor expõe a forma cruel com
que, de forma geral, os sapiens sempre trataram os animais, culminando no
modelo industrial que esse problema assumiu nos dias atuais.
“Tratar criaturas vivas que têm
mundos emocionais complexos como se elas fossem máquinas tende a lhes causar
não só desconforto físico como também grande estresse social e frustração
psicológica”.
“A conclusão inevitável é que a
primeira onda de colonização dos sapiens foi um dos maiores e mais rápidos
desastres ecológicos a acometer o reino animal.” Essa é outra conclusão da
visão crítica do autor: efetivamente os sapiens são extremamente predadores e
destruidores do que encontram pela frente, a fim de atingirem seus supostos
objetivos de desenvolvimento. Com relação à fauna, houve e continua havendo um
verdadeiro massacre e domínio cruel e indiscriminado.
Harari argumenta ainda sobre
outro efeito colateral da frenética industrialização e “desenvolvimento” das
sociedades modernas: o colapso da família e da comunidade.
“Antes da Revolução Industrial, a
vida cotidiana da maioria dos humanos seguia seu curso no interior destas três
estruturas antigas: a família nuclear, a família estendida e a comunidade
local. A maioria das pessoas trabalhava em negócios familiares (...). A família
também era o sistema de bem-estar social, o sistema de saúde, o sistema
educacional, a indústria de construção, o sindicato, o fundo de pensão, a
empresa de seguros, o rádio, a televisão, o jornal, o banco e até mesmo a
polícia”.
Tudo isso foi desconstruído e
substituído pelo poder hegemônico e invasivo das duas grandes entidades que
dominam o mundo moderno: o estado e o mercado. Hoje em dia, a família foi
“substituída” por essas duas forças controladoras.
“O Estado e o mercado são a mãe e
o pai do indivíduo, e o indivíduo só pode sobreviver graças a eles”.
“Em muitos casos, os indivíduos
são explorados pelos mercados e os Estados empregam seus Exércitos, forças
policiais e burocracias para perseguir indivíduos em vez de defendê-los”.
Essa é uma constatação
praticamente irrefutável e aterradora. Pessoalmente tenho a sensação clara do
exagero e do descabimento da intromissão do Estado na nossa vida particular, e
da força do mercado nas nossas decisões e possibilidades na vida. Pra qualquer
lado que nos movimentemos, lá estão essas duas agarras a limitar nossas ações e
determinar o que podemos fazer. Hoje em dia o Estado não deixa, se quer, educarmos
nossos próprios filhos da maneira que acharmos melhor. Coloca-los numa escola é
imposição de lei.
O autor se detém demoradamente
também, em outros capítulos da obra, na intrigante questão da felicidade
humana, e suas definições, causas e argumentações.
“Os últimos 500 anos
testemunharam uma série de revoluções de tirar o fôlego. (...) A ordem social
foi totalmente transformada, bem como a política, a vida cotidiana e a
psicologia humana. Mas somos mais felizes?”
“Voltando ainda mais no tempo, os
cerca de 70 milênios desde a Revolução Cognitiva tornaram o mundo um lugar
melhor pra se viver? (...) Se não, qual o sentido de desenvolver agricultura,
cidades, escrita, moeda, impérios, ciência e indústria? (...) Os historiadores
raramente fazem essas perguntas. (...) Mas essas são as perguntas mais
importantes que podemos fazer à história.”
“Novas aptidões, comportamentos e
habilidades não necessariamente contribuem para uma vida melhor. Quando os
humanos aprenderam a lavrar a terra na Revolução Agrícola, sua capacidade
coletiva de moldar seu ambiente aumentou, mas o destino de muitos indivíduos
humanos se tornou mais cruel.”
“Nada na vida confortável da
classe média urbana pode se aproximar do entusiasmo e da alegria experimentados
por um bando de caçadores-coletores após a caçada bem-sucedida de um mamute.”
“(...) Nosso mundo sensorial é
muito mais pobre se comparado com o de nossos ancestrais. Os antigos
caçadores-coletores viviam o momento presente, e tinham plena consciência de
cada som, sabor e odor. Sua sobrevivência dependia disso. Nós, ao contrário,
estamos terrivelmente sem foco. Podemos ir ao supermercado e escolher comer mil
pratos diferentes. Mas, qualquer que seja o prato escolhido, provavelmente o
comeremos às pressas diante da TV, sem prestar atenção ao sabor (...)”.
Analisando parâmetros de
felicidade, o autor afirma que “uma conclusão interessante é que, de fato, o
dinheiro traz felicidade. Mas só até certo ponto, e além desse ponto tem pouca
significância”.
“Família e comunidade parecem ter
mais impacto na nossa felicidade do que dinheiro e saúde. Pessoas com famílias
coesas que vivem em comunidades unidas que lhes dão apoio são
significativamente mais felizes do que pessoas cujas famílias são disfuncionais
e que nunca encontraram (ou nunca buscaram) uma comunidade da qual fazer
parte.”
(fonte da imagem: Google)
“(...) Os amigos na idade da
Pedra dependiam uns dos outros para sua própria sobrevivência. Os humanos
viviam em comunidades solidárias e os amigos eram pessoas com quem se caçava
mamutes. Juntos, sobreviviam a longas jornadas e a invernos rigorosos. Cuidavam
um do outro quando em deles ficava doente e compartilhavam a última porção de
comida em épocas de necessidade.”
O tema da felicidade é amplamente
abordado por Harari, que apresenta os mais recentes estudos e conclusões
científicas a respeito do assunto.
“(...) As descobertas demonstram
que a felicidade não é o saldo positivo entre momentos agradáveis e momentos
desagradáveis; antes, consiste em enxergar a própria vida em sua totalidade como
algo significativo e valioso.”
“Até onde sabemos, de um ponto de
vista puramente cientifico, a vida humana não tem sentido algum. Os humanos são
o resultado de processos evolutivos cegos que atuam sem propósito ou objetivo.
Nossas ações não são parte de um plano cósmico divino, e, se o planeta Terra
explodisse amanhã, o universo provavelmente seguiria em frente como de
costume.”
“Os sentidos sobrenaturais que os
medievais encontravam em sua vida eram não mais ilusórios do que os sentidos
humanistas, nacionalistas e capitalistas que as pessoas de hoje encontram.”
“O budismo concebe a felicidade
da mesma forma que a biologia, isto é, entende que a felicidade resulta de
processos que ocorrem em nosso corpo, e não de acontecimentos no mundo externo.
No entanto, partindo da mesma noção elementar, o budismo chega a conclusões
muito diferentes.”
“De acordo com o budismo, a raiz
do sofrimento não é a sensação de dor nem de tristeza e nem mesmo de falta de
sentido. Em vez disso, a raiz do sofrimento é essa incessante e inútil busca de
sensações efêmeras, que nos leva a estar em um constante estado de tensão,
inquietude e insatisfação. (...) As pessoas só se libertam do sofrimento não
quando experimentam essa ou aquela sensação de prazer, e sim quando entendem a
natureza transitória de todos os seus sentimentos e param de persegui-los.”
“Para muitas filosofias e
religiões tradicionais, como o budismo, o segredo da felicidade é conhecer a
verdade sobre você mesmo- entender quem, ou o que, você realmente é.”
A obra de Harari encerra a
narrativa lançando um olhar para o futuro: o que será do Homo Sapiens no tempo
que se aproxima? A esse respeito, aponta na direção de uma possível (na
verdade, muito provável) Revolução Genética que pode mudar muito mais
drasticamente nossa espécie do que todas as Revoluções anteriores juntas.
“A verdadeira pergunta a ser
enfrentada não é ‘o que queremos nos tornar?’, e sim ‘o que queremos querer?’.
Aqueles que não se sentem assombrados por essa pergunta provavelmente não
refletiram o suficiente a respeito.”
Epílogo – O animal que se tornou
um deus:
“Há 70 mil anos, o Homo Sapiens ainda era um animal insignificante
cuidando da sua própria vida em algum canto da África. Nos milênios seguintes,
ele se transformou no senhor de todo o planeta e no terror do ecossistema.
Hoje, está prestes a se tornar um deus, pronto para adquirir não só a juventude
eterna como também as capacidades divinas de criação e destruição.
Infelizmente, até agora o regime
dos sapiens sobre a Terra produziu poucas coisas das quais podemos nos
orgulhar. Nós dominamos o meio à nossa volta, aumentamos a produção de
alimentos, construímos cidades, fundamos impérios e criamos grandes redes de
comércio. Mas diminuímos a quantidade de sofrimento no mundo? Repetidas vezes,
os aumentos gigantescos na capacidade humana não necessariamente melhoraram o
bem estar dos sapiens como indivíduos e geralmente causaram enorme sofrimento a
outros animais.
Nas últimas décadas, pelo menos
fizemos algum progresso real no que concerne à condição humana, com a redução
da fome, das pragas e das guerras. Mas a situação de outros animais está se
deteriorando mais rapidamente do que nunca, e a melhoria no destino da
humanidade ainda é muito frágil e recente para que possamos ter certeza dela.
Além disso, apesar das coisas
impressionantes de que os humanos são capazes de fazer, nós continuamos sem
saber ao certo quais são nossos objetivos e, ao que parece, estamos
insatisfeitos como sempre. Avançamos de canoas e galés a navios a vapor e naves
espaciais – mas ninguém sabe para onde estamos indo. Somos mais poderosos do
que nunca, mas temos pouca ideia do que fazer com todo esse poder. O que é
ainda pior, os humanos parecem mais irresponsáveis do que nunca. Deuses por
mérito próprio, contando apenas com as leis da física par anos fazer companhia,
não prestamos conta a ninguém. Em consequência, estamos destruindo os outros
animais e o ecossistema à nossa volta, visando a não muito mais do que nosso
próprio conforto e divertimento, mas jamais encontrando satisfação.
Existe algo mais perigoso do que
deuses insatisfeitos e irresponsáveis que não sabem o que querem”?
Esse breve apanhado de ideias e
trechos do livro não tem a intenção de ser uma resenha nem tampouco um resumo
da obra. A ideia é apenas instigar a reflexão a respeito dos temas apresentados
e, eventualmente, a leitura completa da obra, que considero valer muito a pena.
Evidentemente o autor tem um
enfoque estritamente científico e materialista da história da nossa espécie
sobre o planeta Terra. Mas é bom lembrar que muito provavelmente a questão não
se restringe ao que podemos observar com nossos olhos e analisar com nossas
lentes científicas. Como dizia William Shakespeare: “Há mais coisas entre o céu
e a terra do que a vã filosofia dos homens possa imaginar”. Eu acrescentaria:
do que a vã filosofia e a vã ciência possam imaginar...
Acho que, de certa forma, temos
motivos suficientes para crer (e uma certa intuição que nos diz) que não estamos
sozinhos nessa jornada. Pessoalmente, gosto de pensar que há uma força maior
que nos guia e vela por nosso destino, tanto como indivíduos quanto como espécie.
A vida e o universo parecem incrivelmente maiores e mais complexos do que
podemos imaginar a partir do nosso sempre limitado ponto de vista.
O que me assombra é a certeza de que a imaginação foi e será combustível para as ideologias de toda ordem, com a intenção velada de submeter o outro. A criação de necessidades nos afastam das nossas essências nos colocando numa espécie de limbo, numa eterna insatisfação. Satisfeitas as necessidades básicas, a nossa espécie se perde em abstrações de toda ordem, normalmente é, até aqui, com resultados danosos a nós mesmos e ao restante do planeta.
ResponderExcluirViver bem requer muito cuidado e atenção, pra não se deixar levar pelas "armadilhas" do nosso querido mundinho. Abraço, meu amigo.
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