A concepção dessa pequena viagem surgiu da vontade de dar uma pedalada ao estilo "colocar uma mochilinha nas costas e sair pra dar uma volta". Escolhi a região de Urubici, na Serra Catarinense, porque é um local de belas montanhas e ainda tem aquele aspecto de certo isolamento. Além disso, ainda foi possível conectar esse passeio ao relatado no post anterior, sobre o trajeto Curitiba a Urubici com o Troller, por estradas de terra.
Montei o percurso pensando em fazer três pernadas, saindo e chegando ao mesmo ponto, a Pousada e Refúgio de Montanha Rio Canoas, do amigo Max.
Dia 1 - Serra do Corvo Branco
Choveu praticamente a noite inteira de domingo pra segunda feira, dia em que pretendia iniciar o giro. Amanheceu ainda chovendo, com o céu bem fechado.
Partindo...
Levantei e fui arrumando as coisas devagar, de olho no tempo lá fora e nas minhas avaliações a respeito se deveria partir ou não com aquelas condições. Por volta das nove e meia da manhã estava com tudo pronto e a chuva parecia haver diminuído. O Max veio bater um papo e saber o que pretendia fazer. Resolvi partir.
Os primeiros quilômetros logo após chegar à estrada de terra principal são de uma subida relativamente íngreme, levando ao topo da cênica Serra do Corvo Branco, aquele magnífico e imenso corte na rocha que é a marca registrada do local. Bom pra aquecer e espantar a natural insegurança da partida.
Topo da Serra do Corvo Branco
Descida da Serra
A descida da Serra é um trajeto evidentemente muito bacana, não apenas pelo fato de não requerer grandes esforços ao pedal, mas principalmente pelo belo visual e geografia arrojada. O tempo continuava fechado, o que dava ao ambiente em volta um aspecto de ainda mais isolamento e desolação.
Os primeiros vinte quilômetros depois do topo da Serra (dos quais cerca de 15 já se encontram asfaltados) passaram rápido, até a entrada do vilarejo de Aiurê. A partir de lá volta a estrada de terra, que devido a estar com vários trechos em obra, está com aquele aspecto meio bagunçado de máquinas, caminhões e tudo revirado por todo lado.
Município de Aiurê
Por volta da uma hora da tarde chegava à cidadezinha de Grão Pará, sob forte calor e sem chuva, com aquele típico ritmo de cidade do interior, com os meninos e meninas indo pra escola, pessoas passando sem pressa, poucos carros nas ruas... Fiz um rápido lanche numa padaria local e voltei à estrada.
A partir de lá a estrada (agora asfaltada) e as coisas em volta foram tomando aquele aspecto convencional de coisas comuns (ou seja, meio sem graça...). Aproveitei pra concentrar na rotação dos pedais e fazer os km passarem.
Passei pelas cidades de Braço do Norte, São Ludgero e no meio da tarde chegava a Orleans, que havia pensado como uma opção de pernoite naquele dia. Mas resolvi seguir até Lauro Muller, 20 km adiante, no sopé da Serra do dia seguinte, pra acabar de vez com aquele trecho mais chato naquelas estradas movimentadas.
Cheguei a Lauro Muller no final da tarde, achei um hotelzinho e tirei meu time de campo.
Total do dia: 86,5 km
Média: 19,3 km/h
Total do dia: 86,5 km
Média: 19,3 km/h
Dia 2 - Serra do Rio do Rastro
O marco desse segundo dia de pedal seria a subida da bela e desafiante Serra do Rio do Rastro. Acordei, tomei um rápido desjejum no hotel e parti pra estrada. Não estava chovendo, mas também não estava um tempo muito firme.
A subida começa ainda antes de sair da cidade. Bom pra aquecer... Mas a Serra mesmo só começa alguns quilômetros adiante. Fui pedalando e curtindo aquele frescor da manhã morro acima.
Cerca de 8 km antes do topo da Serra, já no trecho bem íngreme da brincadeira, o tempo começou a fechar fortemente, na forma de espessa neblina (muito comum nessa região). Pedalar naquela estradinha, com precipícios a perder de vista ali do lado, forte inclinação à frente e, de vez em quando, caminhões roncando estrada acima, é uma experiência bem bacana.
Subida da Serra do Rio do Rastro
Cheguei ao topo da Serra com menos de dez metros de visibilidade à frente. Fiz rápida parada no mirante (de onde não se via nada), um lanche na vendinha que lá havia e de volta à estrada, rumo a Bom Jardim da Serra, cerca de 15 km adiante, e aonde pensava em pernoitar.
Visibilidade no topo da Serra
Altimetria da subida da Serra
Por volta de uma da tarde estava na cidade. Logo em seguida começou a chover. Achei uma pousadinha e encerrei o expediente.
A pousada havia sido inaugurada recentemente (em dezembro de 2016), e era montada em containeres, um conceito muito interessante de construção que parece estar se popularizando por aí. Tudo muito ajeitadinho e de muito bom gosto. Bati um papo com a Dona Ilda, proprietária do local, que me contou a trajetória do empreendimento e algumas de suas motivações. Me contou que ela e o marido trabalham há quase trinta anos com a lavoura de maçã, mas que estavam cansados dos altos e baixos desse negócio e estavam tentando mudar de ramo. Planejava viver só por conta da pousada já a partir do final deste ano.
"Villa dos Ventos Hospedagem Container", em Bom Jardim da Serra
No começo da noite, como continuasse chovendo, Dona Ilda ofereceu-se para levar a mim e a outros três hóspedes que haviam chegado recentemente a um restaurante na cidade, a cerca de 1,5 km. Os outros três eram motociclistas e estavam vindo de longe. Dois eram do Pará e o outro era do Mato Grosso. Os três com motos trail (GS 800, Tiger 800 e XTZ 660). Acabamos jantando juntos e batemos um bom papo furado sobre a experiência de viagem de cada um (ficaram surpresos quando lhes disse que tinha 48 anos de idade (... às vezes eu também fico)).
Estavam meio frustrados de terem vindo de tão longe e de não terem conseguido ver nada da famosa Serra do Rio do Rastro (devido à neblina que durou o dia inteiro no topo da Serra), e discutiam, meio de brincadeira, meio sério, como fariam pra contar para os amigos tal infortúnio... "Não dá nada... acha aí uma foto do Google e joga lá no grupo e diz que foi o que a gente viu..." - sugeriu um, divertindo-se com a situação.
Estavam meio frustrados de terem vindo de tão longe e de não terem conseguido ver nada da famosa Serra do Rio do Rastro (devido à neblina que durou o dia inteiro no topo da Serra), e discutiam, meio de brincadeira, meio sério, como fariam pra contar para os amigos tal infortúnio... "Não dá nada... acha aí uma foto do Google e joga lá no grupo e diz que foi o que a gente viu..." - sugeriu um, divertindo-se com a situação.
Total do dia: 40 km
Média: 12,2 km/h
Dia 3 - Campos de altitude da Serra Catarinense
O terceiro dia era pra fechar a volta e retornar à base. Ali tinha uma decisão a tomar. Podia arriscar seguir por uma estrada de terra que cruza o Parque Nacional São Joaquim e vai sair já próximo de Urubici - cerca de 50 km de morros, pedras e completo isolamento - ou continuar no asfalto e fazer uma volta pouca coisa maior. Devido às intensas chuvas que estavam caindo na região nos últimos dias, resolvi ir mesmo pelo asfalto, e com isso diminuir um pouco as chances de perrengue na empreitada.
Os primeiros 30 km saindo de Bom Jardim da Serra são de muito sobe e desce (mais sobe do que desce, me pareceu). Bela paisagem em volta, mas o esforço das subidas, somado ao desgaste dos dias anteriores, começou a cobrar o preço.
Depois do trevo em que a estrada inflete para Urubici (e seguindo em frente vai para São Joaquim) a altimetria fica um pouco mais amigável, o movimento na estrada diminui sensivelmente e a paisagem em volta continua belíssima, ou seja, é um cenário quase perfeito para uma bela pedalada.
Nos últimos 15 ou 20 km antes de chegar de volta a Urubici as subidinhas voltam a aparecer com força, na proporção inversa da força nas pernas. Pra completar o quadro, começou a cair uma chuva fininha e esfriou bastante.
Aportei em Urubici por volta de uma hora da tarde. Mas ainda faltavam mais uns 25 km até a Pousada do amigo Max. Fiz então um lanche sem pressa numa padaria local e em seguida mais estrada.
No meio da tarde chegava de volta ao ponto de origem, ao lado do Rio Canoas, na entrada da Pousada, com o odômetro marcando 105 km de pedal naquele dia. Antes de perder o aquecimento do momento, dei um bom mergulho nas águas geladas do belo rio e em seguida, aproveitando umas brechas de sol que escapavam por entre as muitas nuvens, me permiti alguns minutos de relaxamento e sintonia com o correr das águas ali próximo.
Total do dia: 105 km
Média: 19,6 km/h
Total do dia: 105 km
Média: 19,6 km/h
Rio Canoas, próximo da Pousada do Max
E é isso! Muito bom dar essas saídas da rotina e ver o mundo girando sob uma perspectiva diferenciada por alguns dias. Valeu!
Força Sempre
"A ilusão, Bertrand amigo, é tão útil quanto a certeza.
E na formação de um espírito complexo devem entrar
tanto os contos de fadas quanto os problemas de Euclides."
(Eça de Queiroz)
Gratidão
E na formação de um espírito complexo devem entrar
tanto os contos de fadas quanto os problemas de Euclides."
(Eça de Queiroz)
Gratidão
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Dica de livro e filme sobre viagem de bicicleta
Há um filme bem bacana sobre viagem de bicicleta chamado "Transpatagônia - Pumas não comem ciclistas" (atualmente disponível na Netflix), que conta a história da viagem do brasileiro Guilherme Cavallari, que, próximo de completar 50 anos de idade, empreendeu uma expedição solo de bike de 6 meses e 6 mil km pela Patagônia e Terra do Fogo, no sul da Argentina e Chile.
Ele também escreveu um livro sobre a experiência.
Vale a leitura e/ou ver o filme.
Bacana, show o pedal!!!
ResponderExcluirMuito bom!
ResponderExcluirMuito bom!
ResponderExcluirMais uma estimulante história das aventuras de nosso amigo Assis... Ótimas como sempre! Grande abraço
ResponderExcluirBela pedalada parabéns. Também já percorri de bike estes lugares e sei que faltam palavras para descrever a beleza do local. Álvaro Campos
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