Tiger 900 Rally Pro

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sábado, 25 de fevereiro de 2017

Remada (caiaque) na Baía de Guaratuba, litoral do Paraná - 18 Fev 2017







Lançar-se ao mar a bordo de um caiaque tem sempre aquele gostinho bom de desafio, aquela sutil tensão que coloca os sentidos em alerta, uma sensação meio desconfortável, ao mesmo tempo que instigante.

Nesse sábado havia me proposto dar uma remada na região da Baía de Guaratuba, no litoral do Paraná, a cerca de 120 km de Curitiba. Para tanto, planejei uma rota saindo da Praia Mansa, localizada em Caiobá, balneário do município de Matinhos, e que foi, por diversas vezes em tempos passados, palco da etapa de natação do famoso Triathlon de Caiobá, do qual participei em algumas edições. 

A partir de lá previ entrar na Baía de Guaratuba, ali do lado, passar para o lado sul da baía e ir seguindo até a entrada de um rio que há mais lá para dentro.

Estava um lindo sábado de sol, e, ingenuamente, não imaginei que a praia estaria lotada. Cumprida a parte do deslocamento de Curitiba até o litoral, achei um cantinho pra desembarcar o barquinho, arrumei as coisas e coloquei a proa do Kayapó na água salgada do Atlântico. Logo na saída uma ondinha boba quase inundou o cockpit (pois ainda estava sem a saia de proteção)... 

Passado o pequeno sufoco de atravessar a leve arrebentação, tratei de instalar a saia e assumir o controle da situação. Aprumei para o sul e fui me dirigindo para a entrada da Baía. Pouco depois mais um sustinho, ao ser pego meio de lado por uma pequena ondulação quebrando lá no meio, distante da praia. Tive que negociar com a ligeira turbulência, trabalhando com os remos, e evitando ficar de lado para aquelas ondulações traiçoeiras.

O caiaque tem essa "limitação". Ondas quebrando sobre o casco são potencialmente problemáticas. Um descuido e o mundo vira de cabeça pra baixo, e, dependendo de onde se esteja, isso pode ser uma baita encrenca. Pra lidar com o problema, há que se ter certa habilidade, certa perspicácia, pensar rápido e saber usar as técnicas de apoio do remo na água e de inclinação do casco com o quadril... Até é um jogo divertido de jogar, mas não é exatamente fácil.

Depois que entrei na área abrigada da Baía, a situação se tranquilizou. O mar ficou flat e as "luzes amarelas" no meu painel mental se apagaram. Pra completar a festa, um maravilhoso vento leste me empurrava por trás, causando a gostosa sensação dos remos parecerem leves dentro d'água.

Fui seguindo a costa, curtindo a paisagem, pontuada por barcos de pescadores ancorados, algumas marinas, um iate clube, os quintais e jardins de casas muito bonitas, e de outras mais simples, e até alguns iates bem luxuosos, atracados em píeres inesperados. 

Algum tempo depois a área urbana acabou e me vi em meio a natureza por todos os lados. Um pouco mais e estava na foz do rio em que pretendia chegar. Aproveitando que estava tudo em ordem, e estava me sentindo bem, fui remando rio acima um pouco, pra apreciar o novo ambiente. Tudo estaria ótimo, não fosse o calor infernal que fazia naquele momento. Muito, muito quente!

Com o GPS marcando 13 km de distância percorrida desde o começo, achei que estava de bom tamanho. Fiz meia volta e iniciei o retorno. Antes, porém, desembarquei na margem pra esticar um pouco as pernas e comer uma maçã. 

Como era sábado e estava um tempo muito bom, havia vários barcos de todos os tamanhos passando a toda hora pra cima e pra baixo, com gente bem animada dentro. Interessante como é movimentado esse mundo náutico. 

Planejei fazer o mesmo caminho de ida e volta. Agora, com a proa voltada para o leste, o vento estava bem na cara, funcionando como um freio acionado, fazendo os remos pesarem uma tonelada dentro d'água. Em compensação, refrescou um pouco. 

O rendimento da remada caiu muito. Apesar disso, deu tudo certo no retorno. Ao final, com mais de três horas de esforço, já estava sentindo o cansaço. Desembarquei na Praia Mansa no meio da tarde com a sensação de ter feito um passeio muito mais intenso do que podia parecer à primeira vista. 

O caiaque tem essa capacidade de mexer com a noção da passagem do tempo, e dar uma dimensão diferenciada do mundo em volta. Por várias vezes já me vi em situações de certo aperto remando, em que prometi a mim mesmo que não voltaria a me meter naquele tipo de enrascada... Mas uma vez tendo passado o sufoco, volta aquela empolgação incontrolável pra voltar a sentir o balanço (e a imprevisibilidade) das águas. 

E sempre que a gente reúne o ânimo necessário pra fazer esse tipo de brincadeira, fica aquela sensação de que "tinha que fazer mais disso". Pois então façamos!! 




























A balsa que faz a travessia da Baía entre Caiobá e Guaratuba.







O prédios de Caiobá no horizonte, no retorno.










Trajeto realizado e os dados de velocidade, distância, etc.









A Baía de Guaratuba, em perspectiva um pouco mais ampliada.






















Gratidão





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Sobre "Filosofia para corajosos"
(breve comentário sobre o livro de Luiz Felipe Pondé)








A primeira coisa curiosa sobre o livro do Filósofo Luiz Felipe Pondé (Editora Planeta, 2016) é o título - impactante, desafiante, provocador. Inconscientemente instiga a curiosidade de se verificar "por que Filosofia para corajosos?".

Creio que a resposta a essa questão inicial passa pelo tom e atitude nada "politicamente correta" do autor. Muito pelo contrário. A linha em torno da qual se constrói a narrativa é o tempo todo de provocação, beirando o deboche, sempre, entretanto, no bom sentido, de incentivar o pensamento livre de preconceitos e eufemismos. 

O livro, apesar de curto e sem descer a grandes profundidades sobre os temas tratados, é bastante abrangente e cumpre com maestria sua missão de fomentar a reflexão.

Como, por exemplo, na citação de Schelling, em "A essência da liberdade humana":


"Tal é a tristeza inseparável de toda a vida
finita, uma tristeza, porém, que nunca se torna
realidade e serve tão só para dar alegria eterna
de a superar. Dela vem o véu de pesar que se
estende sobre toda a natureza, a melancolia
profunda e indestrutível de toda a vida."

De onde o autor conclui que "todo conhecimento verdadeiro começa com um profundo entristecimento consigo mesmo", o que creio ser pertinente. E aqui acho ainda que "entristecimento" não se limita à tristeza propriamente dita, mas a um sentimento difuso de inquietação, insatisfação com as coisas, inconformismo.

Dos vários temas tratados na obra, vou pinçar três (mais ou menos aleatoriamente) pra abordar rapidamente e, com isso, dar uma ideia da proposta do livro.

1) "Existe evolução moral na humanidade?"

A pergunta envolve uma questão bastante interessante. Afinal de contas, em termos de humanidade, estamos em melhor situação moral do que estávamos a dois ou três mil anos atrás, por exemplo? 

Ele responde que "acha que não", mas reconhece que "a pergunta é controversa", e que ele pode estar errado. O problema seria a falta de um critério (parâmetro) através do qual seria possível fazer essa avaliação. 

Aos que consideram que sim, baseados na "sociedade da liberdade de escolha que o Ocidente produziu", Pondé ironiza e ataca dizendo que essa mesma liberdade pode vir a ser, na verdade, nosso "destino final", nosso grande tropeço no caminho da sonhada evolução, uma vez que nos torna "afogados em luxos", mimados e frouxos. 

> Se fosse pra arriscar uma resposta, eu diria que não. Não creio que tenhamos progredido moralmente ao longo da história recente. Nem como humanidade, nem como indivíduos. O que talvez nos confunda em acharmos o contrário, é que nos tornamos mais refinados, mais vigiados, mais forçados a agir corretamente. Mas basta retirar as forças de contenção que acho que nos revelamos tão animais quanto sempre fomos (e com as exceções de sempre). 

2) "Deus existe?"

Questão clássica da existência humana.

Ele começa dizendo que julga essa uma das perguntas mais inúteis da Filosofia [do que eu discordo], e explica o pensamento lógico de Blaise Pascal (século XVII), segundo o qual seria "mais vantajoso" apostar na existência de Deus, do que na sua inexistência, porque teríamos mais a ganhar com a primeira hipótese. 

Depois ele continua citando Pascal para dizer que "a fé é fruto da graça divina, é sobrenatural, e não fruto de cálculo racional". Ou seja, " de nada adianta o uso da razão em assuntos da fé".

Muito interessante ele dizer que "não acredito que crer em Deus seja uma coisa que você escolhe, assim como você escolhe uma marca de sabonete ou uma marca de carro com base na lógica custo-benefício". "Argumentos que tentam provar a existência de Deus são inúteis". E por aí vai...

> Acho que essa questão causa muito ruído de comunicação a começar pela questão de quem o que é "Deus". É possível que os que acreditam na sua existência e os que não acreditam estejam, na verdade, discordando de "coisas iguais". Se considerarmos, por exemplo, que Deus é uma "energia criadora", ou "aquele que criou o mundo" ("aquele" aqui não entendido como pessoa) podemos concluir que sim, Deus existe, porque se o mundo existe, "alguém" ou "algo" o criou, e esse alguém ou algo é Deus. Ponto. Mas, se formos mais rigorosos, podemos rejeitar esse argumento simplista também: "Ah, não! Assim não vale!". O que nos levaria de volta à imparcialidade da ignorância. Enfim, acho que Deus existe. Mas posso estar errado [risos].

3) "Por que acho o mundo contemporâneo ridículo?"

Aqui Pondé expõe um ponto de vista bastante sombrio e cruel dos tempos em que vivemos. Segundo ele, nossa sociedade se tornou um grande mercado, em que tudo é avaliado em termos de "preço" (mercadoria), e em que as pessoas estão perdendo paulatinamente a capacidade de manter vínculos duradouros, e cada vez mais vivemos distorções de enfoque da realidade, como na ideia de que seria possível uma tal de igualdade social , ou no grande perigo representado pela ideia cada vez mais disseminada da chamada "sociedade do direito", em que os direitos ganharam escala desmedida em relação aos deveres de cada tripulante dessa "aeronave" chamada Terra.

Nas palavras do autor: "Veja bem, o mundo é uma merda e sempre foi. Mas o capitalismo o deixou um pouco menos pior em termos materiais (e com isso me refiro, inclusive, a medicina, celulares e democracias), apesar de que continua em grande parte uma merda."

> É temerário querer fazer uma avaliação de algo que está tão próximo da gente como o nosso próprio mundo. Além disso há o problema inescapável de tendermos a olhar tudo do nosso próprio ponto de vista ("o homem como a medida de todas as coisas"). Apesar disso, acho que realmente vivemos uma época sombria, e que o mundo, de forma geral, é um lugar perigoso e agressivo em termos de "salve-se quem puder". Os que estão bem (condições razoáveis de vida e de expectativa de vida) são uma minoria, frente a uma legião (silenciosa) de desamparados e desgraçados que vivem se arrastando por aí... Não vejo saída dessa armadilha na qual nos metemos por meios pacíficos e indolores, com base apenas em iniciativas isoladas e boas intenções, que é o pouco que se salva no que há por aí. 

Enfim, o livro vale a leitura e a reflexão, não só pelas ideias nele expostas, mas também, e principalmente, por incentivar o pensar sem amarras conceituais (mimimis...).

Querendo usar o espaço de comentários do blog pra expor seu ponto de vista sobre essas questões, fique à vontade. 




Força sempre













quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Caminhada ao Salto da Fortuna, Morretes/PR - 05 e 19 Fev 2017







Atendendo a proposta da direção da Escola de Filosofia Nova Acrópole, realizamos, neste mês, uma caminhada ao Salto da Fortuna - bela cachoeira inserida no Parque Estadual do Pau Oco e pertencente à Área de Proteção Ambiental da Serra do Mar, próximo à cidade de Morretes, a cerca de 60 km de Curitiba.

Para desenvolver a atividade realizamos (dois colegas da Escola e eu) um reconhecimento da trilha no dia 5 Fev. No dia 19 participaram do passeio 37 pessoas, entre membros e convidados.

A trilha é bem tranquila e curta. Caminhando sem parar, num ritmo bom, dá pra cobrir a distância entre o início do caminho (aonde se chega de carro [ou de bicicleta...], ao final de uma estradinha de terra) e a cachoeira em cerca de 40 minutos. Com mais gente sempre fica um pouco mais demorado, em função da necessidade de coordenação e dos cuidados a serem tomados em alguns pontos mais críticos, como as duas travessias de rios.

No dia da atividade estava um dia muito bonito, apesar do calor excessivo e abafado, condição que contribuiu, entretanto, para tornar muito prazerosas as diversas oportunidades de tomar banho de rio e na própria cachoeira. 

Um passeio muito bacana e gratificante. Mais um lugar pra voltar qualquer hora, pra sair um pouco do ambiente urbano e curtir essa bênção que é estar junto à natureza intocada. 

























































































































Gratidão







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Sobre "Rush - no limite da emoção"
(breve comentário sobre o filme)








O filme (2013, direção de Ron Howard) aborda a história da rivalidade entre os pilotos de fórmula 1 Niki Lauda e James Hunt na fantástica temporada de 1976. Foi nesse ano que Lauda sofreu aquele terrível acidente que quase tirou sua vida, e que o marcou para sempre, literalmente, em função das graves queimaduras sofridas no rosto.

O filme todo é muito bacana. Quem não viu, vale a pena ver. Mas o que me chamou mais a atenção foi o viés das emoções e motivações humanas por trás da busca desenfreada por sucesso e vitória. 

Deixando de lado a preocupação em não revelar o enredo da história, achei particularmente precioso o tributo que o personagem Niki Lauda presta ao seu arqui rival ao final da trama. A declaração é feita em primeira pessoa, e não sei até que ponto ela é totalmente verdadeira e a partir de onde é puramente poética, mas me pareceu ser bem real, em função do que se conhece de fato dessa história (e das imagens atuais do austríaco ao final do filme, como que assinando a homenagem). 

Lauda, um piloto extremamente técnico e calculista, reconhece que o oponente foi "um dos poucos adversários que ele respeitou, e um dos muito poucos que ele chegou a admirar". E, considerado o contexto da história, conclui-se que essa admiração não era exatamente pela competência técnica ou pelo talento de Hunt, mas sim por sua capacidade de não se tornar obsessivo pelo feitiço da Fórmula 1, nem pela vitória, nem pela fama, nem pelo rigor da carreira.

Após a conquista do título daquele ano, James Hunt, pelo que é contado no filme, se tornou uma espécie de bon-vivant... Dedicando-se a simplesmente viver a vida numa boa... [No fundo, no fundo, sabemos que isso simplesmente não é possível, logicamente, pois os fantasmas do homem acompanham-no onde quer que ele vá, infalivelmente] E a mim pareceu que foi esse o ponto de maior admiração de Lauda pelo seu então adversário.

Pensando bem, ser capaz de não se deixar cair na armadilha dos diversos sistemas que circulam por aí, é mesmo um belo atributo. 









segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Passeios com a GS na região de Curitiba - janeiro de 2017











É verdade que o conceito de uma moto como a BMW R1200GS remete a grandes viagens, terras longínquas, distâncias superlativas. Entretanto, há que se considerar que nem sempre o ideal é possível. E, mais do que isso, é saudável saber extrair prazer e ver a beleza do próprio quintal, das redondezas, dos caminhos perto de casa.

Nesse sentido, apresento aqui dois passeios curtos feitos com a GS aqui pela região de Curitiba (na verdade, são circuitos feitos já algumas vezes, sempre que os controles internos requerem uma equalização das emoções...). 

No primeiro - link abaixo - percorri, no dia 4 de janeiro, cerca de 140 km descendo a Serra do Mar pela BR 277 e subindo de volta pela famosa Serra da Graciosa, passando, no caminho, pela cidadezinha de Morretes. Voltinha bem divertida e emoldurada por lindas paisagens, em particular na exuberante Graciosa, com o seu típico calçamento de paralelepípedo e suas inúmeras curvas bem fechadas, e as pitorescas barraquinhas de venda de caldo de cana, milho verde e afins, situadas em pontos estratégicos...:













No segundo - link abaixo - inventei de fazer uma investida numas estradinhas de terra na região rural de Piraquara, município vizinho de Curitiba, no dia 31 de janeiro. Cerca de 100 km de passeio, com uns 40 de terra. 

É lógico que a GS é, como se diz no meio motociclístico, muito mais "big" do que "trail", e realmente tem que se tomar certo cuidado com essas brincadeiras, sobretudo quando se está calçado com pneus 100% on road. Mas, consideradas essas limitações, ainda sobra uma boa margem de manobra pra se divertir.

Andar na terra, por mais simples que seja o caminho, é completamente diferente de andar no asfalto. Quase dá pra sentir o cérebro trabalhando de uma forma diferente (as conexões sinápticas acordando entre os neurônios...[risos]). E vou dizer: é muito divertido esse negócio! É também um excelente "exercício" de pilotagem. Bom pra sentir a moto mais intimamente, pra ganhar um pouquinho de confiança, pra flexibilizar um pouco o quadril e pra ver que, apesar das limitações, a motinha também anda bem no off road















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Sobre "Não há tempo a perder"
(breve comentário sobre o recente livro do Sr Amyr Klink)








Li recentemente o livro "Não há tempo a perder" (capa acima), do navegador brasileiro Amyr Klink, em depoimento a Isa Pessoa, lançado em 2016 pela Editora Foz e Tordesilhas.

O livro, escrito em primeira pessoa, tem uma narrativa bem envolvente e dinâmica, em que o autor conta alguns famosos casos de suas várias viagens ao redor do mundo e envereda também por alguns temas mais conceituais, digamos assim. 

O Amyr Klink é uma dessas figuras que se costuma chamar de "ponto fora da curva". Não sei se os amigos, eventuais leitores deste blog, conhecem um pouco de sua biografia. Uma de suas viagens mais famosas (e que o tornou uma "celebridade" no cenário brasileiro e internacional) foi a travessia do Oceano Atlântico a remo, sozinho, em 1984, durante cem dias (contada no livro "Cem dias entre céu e mar"). 

Mais tarde (1989-1991) construiu um veleiro (o Paratii) e passou um ano sozinho com o barco congelado no mar da Antártica, após o que navegou até o extremo norte (mar Ártico) e retornou ao Brasil dois anos após a partida (viagem relatada no livro "Paratii entre dois pólos").

Outra viagem emblemática foi a circunavegação da Terra (novamente solo) pela latitude mais alta possível (1998-1999), dando a volta na Antártica, novamente com o Paratii (reformado, com um novo e diferente tipo de mastro) num dos piores trechos de mar pra se navegar, segundo dizem (história contada no livro "Mar sem fim").

Nos anos seguintes dedicou-se à construção de um novo barco (o Paratii II), utilizando (e testando) conceitos próprios de engenharia naval e soluções inovadoras para velhos problemas (interessantíssima história contada no livro "Linha d'água - entre estaleiros e homens do mar"). Com esse veleiro já fez mais de quarenta viagens à Antártica, nos últimos tempos acompanhado da esposa, de suas três filhas e, eventualmente, de amigos. 

Chamou a minha atenção no livro a narração de algumas passagens de sua vida pessoal, refletindo que ele era, de certa forma, uma pessoa altamente "desajustada" com o mundo em volta. Entre outras possíveis conclusões, pode-se dizer que certo "desajuste" faz bem às vezes... Num rápido passar de olhos na biografia de grandes escritores, filósofos, artistas, músicos e outros realizadores constata-se que não é nada incomum encontrar histórias de dificuldades de se adaptar ao (maldito) status quo predominante. 

Curioso também verificar que ele não tem histórico familiar ou qualquer antecedente no meio naval, nem nunca se envolveu em competições de vela ou eventos badalados nesse meio. Antes da travessia do Atlântico a remo era um ilustre desconhecido, jovem de vinte e poucos anos, formado em economia (a duras penas) pela USP. Mesmo depois, na fase dos veleiros, fica claro que tudo começou meio do zero, com muita tentativa e erro. Isso é interessante porque temos a tendência de ver histórias como essas e pensar "Ah, mas ele deve ser de família rica, deve ter tido muita sorte, deve ter "super poderes", etc...". E não é nada disso.

Também é abordada no livro a questão da não aceitação de certos tipos de patrocínio para suas viagens (é amplamente conhecida a sua notável intransigência em negociações de todo tipo), dentre eles, acordos de cooperação com a Petrobrás, que não chegaram virar patrocínio por convicção e teimosia de sua parte. 

Outro ponto bem interessante é sua declaração convicta e sem meias palavras de que não acredita em Deus. Ele conta algumas passagens de suas viagens em que correu grande risco de morrer, e relata que em nenhum momento chegou a rezar para pedir ajuda a Deus, nem pra agradecer depois de ter se safado da enrascada.

Muito bacana a coragem de assumir publicamente uma posição tão "politicamente incorreta" como essa, assim como a ousadia de abdicar com tanta naturalidade de um "apoio" desse tipo, particularmente levando o estilo de vida que leva. 

Sobre a questão em si, não vou me meter... 

... Ok, vou me meter só um pouquinho [risos]. O que mais me surpreende e me deixa intrigado nessa questão é ver como certas pessoas (a maioria esmagadora das pessoas) dizem ter convicção de seus pontos de vista de crença em Deus. De onde vem tanta certeza?

Há uma linha de argumentação que se apoia na "lógica" de que não seria possível nem coerente que o mundo e a humanidade existissem sem um criador, um Deus, e um grande sentido por trás de tudo... 

Por que não? - é a pergunta...

Até concordo que o "mais coerente" é que exista mesmo uma "razão" para o mundo e a vida, mas isso não quer dizer que seja assim. Parece ser apenas uma suposição, uma possibilidade.

Mais do que concordar, eu diria mesmo que entendo a questão dessa forma "mais coerente" - o que pode ser semelhante (mas não igual) a dizer que "acredito" nisso (talvez esteja mais para "quero acreditar nisso").

Essa é uma questão muito complexa, logicamente. Acho que não podemos deixar de considerar ainda que tudo isso vai além da compreensão própria sobre o assunto. Assim como existem pessoas capazes de correr mais rápido e melhor do que outras, ou capazes de escrever e ter ideias melhor do que outras, acredito que haja pessoas capazes de compreender essa questão de forma diferenciada da grande maioria, e daí surgem os grandes mestres, os iluminados, os santos, etc., os quais não podemos simplesmente desprezar como dignos orientadores nesse caminho obscuro.

Já que me meti um pouco no assunto, tenho que arrumar um jeito de sair dele [risos]... 

Eu só acho que tínhamos que ser um pouco mais humildes, e admitir que certas razões, conhecimentos e "porquês" estão muito além do nosso horizonte possível... 

Enquanto isso, deveríamos apenas "cuidar de nossos jardins", como dizia Cândido, de Voltaire.







"Que o universo tenha sido criado por uma combinação
fortuita de átomos parece-me tão inacreditável quanto a
possibilidade de sair um engenhoso tratado de filosofia
da mistura acidental das letras do alfabeto."

(Jonathan Swift)






Gratidão