(Editora Companhia das Letras, 2018)
Neste livro, o historiador David Christian se propõe a apresentar uma visão panorâmica da história do universo, o que ele chama de Grande História.
Passando por conceitos e pontos de vista da cosmologia, da biologia, da bioquímica, da física, da sociologia, da filosofia e da própria história, dentre outras, ele busca descrever como chegamos onde estamos hoje, citando oito limiares de acontecimentos que, aproveitando-se de condições ideais, teriam permitido que a vida fosse criada e desenvolvida nesse nosso pequeno planeta.
Nesse percurso, dá ênfase especial à importância de se conhecer e se valorizar a compreensão desse percurso, porque, segundo ele, estamos na fronteira de um possível nono limiar, que, se ultrapassado, permitirá a continuidade da história. Se não, a sobrevivência da espécie humana nesse cenário pode vir a ser comprometida.
Pessoalmente apreciei, sobretudo, o fato da leitura inspirar reflexões e imaginações de como isso tudo aconteceu, de como somos pequenos e efêmeros nessa história, de como enxergamos a vida (quase) sempre de forma muito limitada, pensando apenas em uma perspectiva local e imediata.
Muito interessante também a descrição, no último capítulo, do prognóstico futuro da Terra, do sistema solar e do universo. Nesse contexto, torna-se realmente um desafio pensar na questão do tempo, ampliado de forma tão extraordinária, quase impossível de conceber.
Como pano de fundo a esse trajeto de reflexão, ainda que o relato do livro não aborde o tema diretamente, fico pensando no desígnio divino do ser humano, do planeta Terra e do universo como um todo... Em como essa história nos é pouco clara, e aparentemente muito maior do que podemos imaginar.
Quem sabe um dia tenhamos a graça de compreender e enxergar.
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Linha do tempo, pág 25
Observação: nessa linha do tempo o autor cria uma espécie de escala, a fim de facilitar a assimilação e compreensão. Segundo o autor, nosso cérebro não consegue ter a real noção do que representam milhões e bilhões de anos, por isso ele criou essa comparação, em que os 13,8 bilhões de anos decorridos desde o Big Bang são vistos como 13 anos e 8 meses, e a partir daí todos os eventos seguem essa medida.
Observe que a tabela apresenta os oito limiares que possibilitaram que chegássemos onde estamos hoje, bem como o possível nono limiar, em um eventual futuro.
Interessante destacar também alguns eventos: considerando que o Big Bang se deu a 13 anos e 8 meses, a primeira evidência da nossa espécie (Homo Sapiens) teria ocorrido a 100 minutos atrás; as diferentes zonas do mundo teriam começado a se conectar, através das grandes navegações do século XVI, a 15 segundos atrás; e a grande revolução tecnológica, representada pela chegada do homem à Lua, teria ocorrido há 1,5 segundo. Ainda dentro dessa escala, em mais 4 anos e meio nosso sol estará morrendo, e, em consequência, nosso planeta Terra estará encerrando seu ciclo de vida.
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Transcrevo, a seguir, alguns trechos que destaquei da obra:
“Chegamos a este universo sem que
o tenhamos decidido, num tempo e num lugar que não foram de nossa escolha. Por
alguns momentos, como vaga-lumes cósmicos, viajaremos com outros seres humanos,
com nossos pais, com nossos irmãos e irmãs, com nossos filhos, com amigos e
inimigos. Também viajaremos com outras formas de vida, de bactérias a babuínos,
com rochas, oceanos e auroras, com luas e meteoros, planetas e estrelas, com
quarks e fótons, supernovas e buracos negros, com lesmas e telefones celulares,
e com muito, muito espaço vazio. O desfile é copioso, colorido, cacofônico e
misterioso, e embora nós, seres humanos, em algum momento devamos deixa-lo, ele
seguirá em frente. No futuro remoto, outros viajantes entrarão no desfile e o
deixarão. Mas, por fim, ele se diluirá. Em zilhões de anos, ele desaparecerá
como um fantasma ao amanhecer, dissolvendo-se no oceano de energia de onde
surgiu.” (pág 13)
“Stephen Hawking afirma que a
questão das origens é apenas mal colocada. Se a geometria do espaço-tempo é
esférica, como a superfície da Terra, mas em mais dimensões, perguntar o que
existia antes do universo é como procurar um ponto de partida na superfície de
uma bola de tênis. Não é assim que funciona. Não há borda nem começo do tempo,
assim como não há borda na superfície da Terra.” (pág 32)
“Não sabemos quais condições
Cachinhos Dourados permitiram que um universo surgisse, e ainda não podemos
explicá-lo melhor do que o romancista Terry Pratchett quando escreveu: ‘O
estado atual do conhecimento pode ser resumido assim: no começo não havia nada,
que explodiu.’” (pág 33)
“A história básica é assim: nosso
universo começou como um ponto menor que um átomo. (...) No momento do big
bang, todo o universo era menor que um átomo. Empacotadas nisso estavam toda a
energia e a matéria presentes no universo hoje. Toda. É uma ideia assustadora
e, a princípio, pode parecer totalmente louca. Mas todas as evidências que
temos hoje nos dizem que esse objeto estranho, minúsculo e fantasticamente
quente realmente existiu em torno de 13,82 bilhões de anos atrás.” (pag 33)
“A expansão continua hoje; é como
se uma vasta mola estivesse se desenrolando há mais de 13 bilhões de anos.”
(pág 34)
“No primeiro momento para o qual
temos alguma evidência, uma fração de segundo após o big bang, o universo consistia
de energia pura, aleatória, indiferenciada e disforme.” (pág 35)
“Houve um breve período de
expansão extremamente rápida conhecida como inflação. A expansão foi tão rápida
que grande parte do universo pode ter sido projetada muito além de qualquer
coisa que possamos ver. Isto significa que o que vemos hoje é provavelmente
apenas uma parte minúscula de todo o nosso universo.” (pág 36)
“Até pouco mais de um século
atrás, cientistas e filósofos supunham que matéria e energia eram distintas.
Agora sabemos que a matéria é realmente uma forma altamente comprimida de
energia. (...) Então se descomprimirmos um pouquinho de matéria, teremos uma
enorme quantidade de energia. É o que acontece quando uma bomba H explode.”
(pág 38)
“Algumas estruturas ou padrões
durarão bilhões de anos, algumas, uma fração de segundo, mas nenhuma se
conserva. Elas são evanescentes, como ondas na superfície do oceano. A primeira
lei da termodinâmica nos diz que o oceano de energia está sempre presente; ele
se conserva. A segunda lei da termodinâmica nos diz que todas as formas que
emergem acabarão por se dissolver no oceano de energia. As formas, como os
movimentos de uma dança, não se conservam.” (pág 38)
“Se existe um vilão na história
moderna das origens, é certamente a entropia, a tendência aparentemente
universal das estruturas a se dissolverem na aleatoriedade. A entropia é o
servidor fiel da segunda lei da termodinâmica. Então, se pensarmos na entropia
como uma personagem da nossa história, devemos imaginá-la como dissoluta, à
espreita, indiferente à dor e ao sofrimento dos outros, sem interesse em olhar
nos nossos olhos. A entropia também é muito, muito perigosa e, no final, nos
apanhará a todos. A entropia está no final de todas as histórias das origens.
Ela dissolverá todas as estruturas, todas as formas, todas as estrelas, todas
as galáxias e todas as células vivas.” (pág 40)
“Joseph Campbell descreveu
poeticamente o papel da entropia em um livro sobre mitologia: ‘o mundo, tal
como o conhecemos, produz apenas um final: morte, desintegração, desmembramento
e crucificação do nosso coração com a passagem das formas que amamos.” (pág 40)
“Hoje, as evidências de que o
nosso universo começou num big bang são esmagadoras. Muitos detalhes ainda
precisam ser aprofundados, mas por enquanto, a ideia central está firmemente
estabelecida como o primeiro capítulo de uma história moderna das origens. Essa
é a inicialização. E, assim como a física quântica permite que as coisas
apareçam de um vácuo, parece que o universo inteiro realmente surgiu de uma
espécie de nada cheio de potencial.” (pág 53)
“A humanidade é feita da
substância das estrelas.” (Harlow Shapley, Vista de uma estrela distante) (pág
54)
“Na verdade, existem apenas
átomos e o vazio.” (Demócrito) (pág 74)
“Passei a tarde refletindo sobre
a vida. Pensando bem, que coisa esquisita é a vida! Tão diferente de qualquer
outra coisa, não é, se você me entende.” (P.G Wodehouse, Meu homem Jeeves) (pág
95).
“Em sua forma mais geral, a
informação consiste em regras que afetam os resultados por meio da limitação
das possibilidades. Uma das definições mais famosas de informação é ‘uma
diferença que faz diferença’. As regras determinam, a partir de todas as opções
concebíveis, quase mudanças são realmente possíveis em um determinado momento e
lugar, e isso faz uma diferença. A informação começa com as leis da física, o
sistema operacional básico do nosso universo. As leis da física dirigem a
mudança para caminhos específicos, como aqueles pelos quais a gravidade criou
as primeiras estrelas. Nesse sentido muito geral, a informação limita o que é
possível, por isso reduz a aleatoriedade.” (pág 99)
“O filósofo Daniel Dennett
escreve: ‘Os animais não são apenas herbívoros ou carnívoros. São...
informívoros’. Com efeito, todos os organismos vivos são informívoros. Todos
eles consomem informações, e os mecanismos que usam para ler e reagir a
informações locais -sejam olhos e
tentáculos, músculos e cérebros – são responsáveis por grande parte da
complexidade dos organismos vivos.” (pág 100)
“O que distingue a vida da não
vida? A vida é tão difícil de definir quanto a complexidade ou a informação, e
parece haver uma zona de fronteira turva entre a vida e a não vida.” (pág 101)
“Todas as coisas vivas na Terra
consistem em células.” (pág 102)
“Todos os organismos vivos
dependem de fluxos de energia livre cuidadosamente administrados.” (pág 102)
“Tais como estrelas e planetas
formados durante períodos de mudança caótica, as células acabaram se fixando
numa espécie de estabilidade quando começaram a administrar pequenas flutuações
em seus ambientes e a reagir contra eles. As células alcançariam um equilíbrio
temporário; o mesmo aconteceria com espécies e linhagens inteiras e grupos de
espécies. Mas nunca houve um equilíbrio estático. Sempre foi dinâmico, sempre
mantido por uma constante negociação entre organismos vivos e ambientes em
mutação, e sempre correndo o perigo de um colapso repentino.” (pág 121)
“Em 1885, Eduard Suess sugeriu
que, por volta de 200 milhões de anos antes, todos os continentes estavam reunidos
em um supercontinente. Sabemos agora que ele estava absolutamente certo.” (pág
124)
“Outrora reunidos no
supercontinente da Pangeia, ou Pangaia (palavra grega que significa “toda a
terra”), eles gradualmente se afastaram e se moveram para suas posições
atuais.” (pág 125)
“Cadeias de montanhas,
continentes e o fundo do mar foram criados e empurrados por enormes quantidades
do magma quente que subiu do manto terrestre e jorrou através de rachaduras na
crosta do fundo do mar.” (pág 128)
“Hoje, temos provas abundantes de
que a crosta terrestre, tanto oceânica quanto continental, está dividida em
placas distintas que disputam espaço enquanto são arrastadas para trás e para
frente pelo magma semiderretido sobre o qual flutuam.” (pág 128)
“Na década de 1970, James
Lovelock e Lynn Margulis argumentaram que parecia haver poderosos mecanismos de
autorregulação que mantinham a superfície da Terra dentro da faixa Cachinhos
Dourados. Como vimos, eles chamaram esse algo de Gaia. Gaia consistia na soma
total da relações entre a geologia da Terra e seus organismos vivos que a
mantinham propícia à vida. Muitos cientistas permanecem céticos quanto à
hipótese de Gaia. Mas o que está claro é que realmente existem mecanismos de
feedback dentro da biosfera, e muitos agem como termostatos para regular
parcialmente a temperatura na superfície da Terra. Alguns mecanismos são
geológicos, mas outros funcionam através de organismos vivos.” (pág 131)
“O termostato geológico tem se
ajustado ao crescente calor do Sol ao longo de 4 bilhões de anos. Tanto quanto
se saiba, nada parecido com isso acontece em outros planetas de nosso sistema
solar.” (pág 133)
“A vida é notavelmente unificada.
Todos os organismos vivos hoje estão relacionados geneticamente.” (pág 134)
“Em algum momento no início do
éon arqueano (que começou há 4 bilhões de anos), os mecanismos reprodutivos se
tornaram mais precisos, os genes se tornaram mais estáveis e as fronteiras
entre os vivos e os quase vivos ficaram mais claras. Esse é o ponto em que a
seleção natural, no sentido de Darwin, realmente decolou. Depois que a vida
começou, não havia garantias de que sobreviveria. Marte e Vênus podem ter
abrigado formas de vida simples. Mas, se o fizeram, a vida logo se extinguiu em
ambos os planetas. Até mesmo na Terra, a sobrevivência de uma escassa vida por
quase 4 bilhões de anos dependeu de muitas coisas darem certo.” (pág 136)
“Quando os níveis de oxigênio
aumentaram e os níveis de gases do efeito estufa caíram, no início do éon
proterozoico, a Terra congelou no primeiro de vários episódios de bola de neve
terrestre. As geleiras se espalharam dos polos para o equador, vestindo o
planeta de branco, e a Terra branca refletiu mais luz do Sol, resfriando-a
ainda mais num ciclo aterrorizante de feedback positivo. Por fim, a maior parte
dos oceanos e continentes da Terra ficou coberta de gelo. A glaciação de
Makganyene durou 100 milhões de anos, de cerca de 2,35 bilhões a 2,22 bilhões
de anos atrás.” (pág 144)
“Enquanto a fotossíntese usa a
energia da luz solar para transformar dióxido de carbono e água em carboidratos
que armazenam energia, deixando o oxigênio como resíduo, a respiração usa a
energia química do oxigênio para roubar a energia armazenada nos carboidratos,
deixando dióxido de carbono e água como resíduos.” (pág 146)
“A respiração nos dá a energia do
fogo sem sua destrutividade.” (pág 146)
“A descoberta da endossimbiose de
Margulis nos diz alguma coisa a mais sobre a história da vida. A evolução não é
apenas questão de competição. Nem é apenas uma questão de divergência constante
à medida que novas espécies aparecem. Vemos também colaboração, simbiose e
convergência.” (pág 149)
“A vida pequena dominou a
biosfera por 3,5 bilhões de anos e ainda domina grande parte dela. Demorou 3
bilhões de anos para ir de Luca aos primeiros espécimes de vida grande – os
primeiros animais multicelulares, os metazoários. Isso nos diz que desenvolver
organismos multicelulares foi muito mais complicado do que fazer evoluir os
procariontes. E sugere que, se há muita vida no universo, os metazoários devem
ser raros.” (pág 151)
“Uma linguagem comum conecta os
membros de uma comunidade a uma rede de compartilhamento de informações com
poderes coletivos fantásticos.” (Steven Pinker, O instinto da linguagem) (pág
187)
“O surgimento dos seres humanos
em nossa história das origens é assunto sério. Chegamos há apenas algumas
centenas de milhares de anos, mas hoje estamos começando a transformar a
biosfera. No passado, grupos inteiros de organismos, como as cianobactérias,
mudaram a biosfera, mas nunca uma única espécie exerceu tanto poder. E estamos
fazendo algo totalmente novo. Como nós humanos podemos compartilhar mapas
individuais do nosso entorno, acumulamos uma rica compreensão coletiva do
espaço e do tempo que está por trás de todas as nossas histórias das origens.”
(pág 187)
“Por que nossos parentes mais
próximos [os chimpanzés] estão agora reduzidos a populações remanescentes de
algumas centenas de milhares, enquanto existem agora mais de 7 bilhões de seres
humanos que dominam a biosfera?” (pág 192)
“Do ponto de vista
paleontológico, mudanças tão rápidas são o equivalente de uma explosão. Sem
termos planejado isso, nos tornamos uma espécie que muda o planeta.” (pág 203)
“Quando se veem mudanças
repentinas e rápidas como essa, é bom começar a procurar por pequenas
alterações que tenham enormes consequências. A teoria da complexidade e o campo
relacionado da teoria do caos estão repletos de mudanças como essa. Muitas
vezes, elas são descritas como efeito borboleta. A metáfora vem do
meteorologista Edward Lorenz, que destacou que, nos sistemas meteorológicos,
eventos minúsculos (o bater das asas de uma borboleta, quem sabe?) podem ser
amplificados por ciclos positivos de feedback, gerando uma cascata de mudanças
que podem desencadear tornados a milhares de quilômetros de distância.” (pág
203)
“Muitas características
diferentes compõem o pacote humano, de mãos hábeis a cérebros grandes e
sociabilidade. Mas o que nos torna radicalmente diferentes é o nosso controle
coletivo de informações sobre o nosso entorno. (...) Nós geramos e
compartilhamos cada vez mais informações e as usamos para captar fluxos cada
vez maiores de energia e recursos.” (pág 204)
“Esse processo, que Tomasello
chama de ‘evolução cultural cumulativa’, é peculiar à nossa espécie. A mudança
minúscula que permitiu que os humanos compartilhassem e acumulassem tanta
informação foi linguística.” (pág 205)
“E eis onde a borboleta bateu
suas asas. A linguagem humana cruzou um limiar linguístico sutil que
possibilitou tios de comunicação totalmente novos.” (pág 205)
“Talvez houvesse espaço para
apenas uma espécie cruzar o limiar da aprendizagem coletiva. Existe um
mecanismo evolutivo conhecido como exclusão competitiva que explica por que
duas espécies nunca podem compartilhar exatamente o mesmo nicho.” (pág 209)
“Atualmente os vestígios mais
antigos da presença humana na América do Norte datam de cerca de 15 mil anos.”
(pág 215)
“As sociedades paleolíticas
estavam incorporadas ao seu entorno, ecológica e culturalmente, de uma maneira
que os habitantes urbanos modernos lutam para entender.” (pág 216)
“O número de humanos despencou
para apenas algumas dezenas de milhares há 70 mil anos. O demógrafo italiano
Massimo Livi-Bacci estima que há 30 mil anos talvez houvesse 500 mil seres
humanos, e no começo do Holosceno, há apenas 10 mil anos, pode ter havido 5
milhões ou 6 milhões.” (pág 220)
“Nossos ancestrais viveram como
caçadores e coletores nos primeiros 200 mil ou mais anos de nossa história.”
(pág 223)
“(...) até que, há 10 mil anos,
no final da última era glacial, os seres humanos estavam vivendo na maior parte
do mundo. Nos últimos 10 mil anos, o modo de vida humano transformou-se graças
a uma cascata de inovações que chamamos de agricultura.” (pág 223)
“A agricultura foi uma imensa
inovação, um pouco como a fotossíntese ou a multicelularidade. (...) Por todos
esses motivos, a agricultura é o nosso sétimo limiar de complexidade
crescente.” (pág 224)
“Demorou 100 mil ou 200 mil anos
para que os humanos adaptassem suas tecnologias de coleta e caça aos diversos
ambientes do planeta Terra. A agricultura se espalhou pelo mundo em menos de 10
mil anos.” (pág 229)
“Há 14 mil anos, os
caçadores-coletores já se haviam espalhado para todas as diferentes zonas do
mundo, e em algumas, em particular na zona mundial afro-eurasiana, começaram a
se assentar e reorganizar seus arredores.” (pág 231)
“A agricultura (...) evoluiu de
forma bastante independente em diferentes partes do mundo. Não foi uma invenção
única e isolada.” (pág 231)
“Gráficos das temperaturas médias
mundiais nos últimos 60mil anos mostram claramente a notável estabilidade
climática dos últimos 10 mil anos (...).” (pág 233)
“Embora os agricultores fossem
capazes de produzir mais alimentos, eles também tinham maior probabilidade de
passar fome, porque, ao contrário dos caçadores, dependiam de um pequeno número
de culturas básicas e, se as colheitas fracassassem, estavam em sérios apuros.”
(pág 236)
“Todos esses indícios do declínio
da saúde sugerem que os primeiros agricultores foram empurrados para o complexo
e cada vez mais interconectado modo de vida agrário, em vez de atraídos por
suas vantagens.” (pág 236)
“O motivo do crescimento tão
rápido da agricultura não é imediatamente óbvio, porque a vida agrícola podia
ser difícil, e é por isso que os caçadores-coletores sobreviveram, muitas vezes
ao lado dos agricultores, por muitos milênios.” (pág 240)
“Enquanto os caçadores-coletores
costumavam considerar-se inseridos na biosfera, os agricultores viam o ambiente
como algo a ser administrado, cultivado, explorado, melhorado e até
conquistado.” (pág 241)
“O surgimento das civilizações
agrárias representa outro limiar da complexidade crescente.” (pág 250)
“Os especialistas forneciam os
suportes e pilares para as civilizações agrárias. É por isso que acabaram por
organizar e dominar o resto da humanidade. À medida que a especialização
aumentava, crescia também a desigualdade. (...) Com o decorrer do tempo,
começamos a encontrar cada vez mais minorias ricas.” (pág 254)
“Os primeiros Estados foram um
fenômeno novo na história da humanidade. Todos eles assumiram o direito de
concentrar a riqueza de comunidades agrícolas, vilas e cidades em troca de
algum grau de proteção.” (pág 258)
“Quando pensarmos sobre esses
processos em termos ecológicos, vemos que a riqueza nunca consiste em coisas;
consiste no controle de fluxos de energia que fazem, movem, exploram e
transformam as coisas.” (pág 262)
“Assim como os organismos vivos
mantém gradientes eletroquímicos que direcionam os fluxos de energia, os
Estados mantêm gradientes de persuasão e coerção. Eles usam a lei, a educação e
a religião para persuadir seus súditos de que seu poder é justo. Mas eles
também mantêm exércitos e grupos disciplinados de coatores para que possam
obrigar à obediência quando a persuasão falha.” (pág 266)
“(...) todos os indícios que
temos sugerem que, embora o povo certamente gozasse de luxos ocasionais, a
maior parte dele viveu perto do nível de subsistência durante toda a era
agrária.” (pág 276)
“A bonança energética da
agricultura melhorou a vida de não mais do que um décimo de todos os seres
humanos.” (pág 276)
“No passado, o aprendizado
coletivo havia funcionado em escala local ou regional e, por isso, demorou 10
mil anos para que os agricultores se espalhassem pelo planeta. Em um mundo de
redes globais, levou apenas alguns séculos para que grande parte da Terra fosse
transformada. Foi a mudança mais momentosa de toda a história de 4 bilhões de
anos da biosfera. De repente, os humanos se encontraram conectados dentro de
uma única esfera de pensamentos: a noosfera.” (pág 284)
“Como diz o historiador moderno
da revolução científica David Wootton, ‘a ideia da descoberta é uma precondição
para a invenção da ciência’. Estude o mundo em si e não o que foi dito sobre o
mundo.” (pág 289)
“No século XVIII, os pensadores
europeus da era iluminista começaram a ver propósito, significado e “progresso”
nos novos conhecimentos. A ideia de que os seres humanos deveriam transformar e
“aperfeiçoar” o mundo começou a moldar a ciência, a ética, a economia, a
filosofia, o comércio e a política.” (pág 289)
“Embora o capitalismo gerasse
novas formas de desigualdade, os economistas o admiravam porque ele era bom em
gerar riqueza e inovação.” (pág 292)
“A pressão para encontrar novas
fontes de energia acabaria por fazer surgir as megainvenções que chamamos hoje
de revolução dos combustíveis fósseis.” (pág 295)
“Tal como uma descoberta de ouro,
essa bonança energética gerou novas formas de mudança frenéticas e muitas vezes
caóticas, e criou e destruiu as fortunas de indivíduos, países e regiões
inteiras.” (pág 296)
“No século XX, nós, humanos,
começamos a transformar nosso ambiente, nossas sociedades e até nós mesmos.
Sem, de fato, pretendermos, introduzimos mudanças tão rápidas tão intensas que
nossas espécie se tornou o equivalente de uma nova força geológica. É por isso
que muitos estudiosos começaram a afirmar que o planeta Terra entrou numa nova
era geológica, a época do Antropoceno, ou ‘a era dos humanos’.” (pág 303)
“Em apenas um ou dois séculos,
com base nos enormes fluxos de energia e nas notáveis inovações da revolução
dos combustíveis fósseis, nos vimos no papel de pilotos planetários sem
realmente saber quais instrumentos deveríamos prestar atenção, que botões
deferíamos pressionar, ou onde estamos tentando pousar. Trata-se de um novo
território para os seres humanos e para toda a biosfera.” (pág 304)
“Nos duzentos anos decorridos
desde 1800, o número de seres humanos aumentou em mais de 6 bilhões. Cada ser
humano adicional precisava ser alimentado, vestido, alojado e empregado, e a
maioria tinha que ser instruída. O
desafio de produzir recursos suficientes ema penas duzentos anos para sustentar
6 bilhões de seres humanos adicionais foi colossal.” (pág 311)
“O consumo total de energia
dobrou no século XIX e subiu dez vezes no século XX. O consumo humano de
energia aumentou com muito mais rapidez do que as populações humanas.” (pág
313)
“Hoje, a maioria dos seres
humanos nem faz coleta nem trabalha na terra para produzir sua comida e suprir
outras necessidades. Eles se tornaram assalariados. Como os ceramistas da
antiga Suméria, vivem de salários ganhos pelos trabalhos especializados. E isso
transformou a natureza da governança, porque agora os governos têm de se
envolver no dia a dia de todos os cidadãos. Isso porque os assalariados, ao
contrário dos camponeses, não podem sobreviver sem governos.” (pág 314)
“Os agricultores modernos não
cultivam para comer, mas para vender.” (pág 317)
“Sem realmente entendermos o que
estamos fazendo, estamos mexendo com os termostatos biosféricos que mantiveram
a superfície da Terra dentro de temperaturas habitáveis por 4 bilhões de anos.”
(pág 320)
“Dentro de algumas décadas, os
climas globais parecerão muito diferentes dos padrões relativamente estáveis do
Holoceno. Como diz um climatólogo americano: ‘o clima é uma fera brava e o
estamos cutucando com vara curta’.” (pág 322)
“A questão é geral. A quantidade
da maioria das espécies de animais e plantas que não são de valor imediato para
os seres humanos está diminuindo.” (pág 323)
“Paradoxalmente, aumentar a
riqueza também significa aumentar a desigualdade e, mesmo quando a quantidade
de pessoas que vivem acima da subsistência está aumentando, o número dos que
vivem em extrema pobreza é maior do que nunca na história da humanidade.” (pág
327)
“Em termos absolutos, há muito
mais pessoas vivendo em extrema pobreza hoje do que havia no passado.” (pág
327)
“A expectativa de vida quase não
mudou por 100 mil anos. Então, apenas nos últimos cem anos, a média de vida
quase dobrou em todo o mundo.” (pág 328)
“Há muito tempo o homem esqueceu
que a Terra lhe foi dada apenas em usufruto, não para consumo, menos ainda para
desperdício irracional.” (Charles Perkins Marsh, Man and Nature) (pág 333)
“Na introdução, encontramos o
fantástico desfile heterogêneo de todas as coisas, com suas estrelas e
serpentes, seus quarks e telefones celulares, todos marchando para o distante
trovão de supernovas sob o olhar fixo, mas cansado, da entropia. Para onde vai
essa procissão?” (pág 333)
“Como a física quântica mostrou,
nas menores escalas, o universo não é determinista. Coisas inesperadas
acontecem e, como o bater das asas de uma borboleta, elas podem se sobrepor em
cadeias causais com poder suficiente para desviar o futuro em muitas direções
possíveis. Portanto, há muita contingência à moda antiga. Hoje, nem nosso
cérebro e tampouco os melhores modelos de computador podem levar em conta uma
pandemia baseada em uma pequena mutação genética num vírus ou o impacto de uma
explosão de supernova próxima (...).” (pág 335)
“A ideia de crescimento sem fim
talvez esteja completamente errada. O dinamismo disruptivo dos séculos recentes
talvez seja um fenômeno temporário.” (pág 341)
“John Stuart Mill acolheu esse
futuro como um revigorante contraste com o frenético mundo da corrida do ouro
da Revolução Industrial. Em 1848, ele escreveu: ‘Confesso que não estou
encantado com o ideal de vida sustentado por aqueles que pensam que o estado
normal dos seres humanos é o de lutar para seguir em frente; que o atropelamento,
o esmagamento, o acotovelamento e o pisotear dos pés uns dos outros, que compõe
o tipo existente de vida social, sejam o destino mais desejável da espécie
humana, ou algo além dos sintomas desagradáveis de uma das fases do progresso
industrial.” (pág 342)
“Em vez disso, propôs ele, ‘o
melhor estado para a natureza humana é aquele em que ninguém é pobre, ninguém
deseja ser mais rico, nem tem motivo algum para temer ser empurrado para trás
pelos esforços de outros que querem avançar.” (pág 343)
“Quão resiliente é a biosfera,
afinal? De verdade, não sabemos.” (pág 343)
“Muitos economistas alertam sobre
os perigos de desacelerar o crescimento populacional, mas uma perspectiva
biosférica mostra por que o crescimento populacional contínuo é insustentável.”
(pág 345)
“Em algum momento, quando o
crescimento econômico deixar de ser o objetivo principal dos governos, os
indivíduos começarão a valorizar mais a qualidade de vida e o lazer do que o
aumento da renda.” (pág 345)
“As economias do mundo vão
desmamar dos combustíveis fósseis em algum momento deste século.” (pág 345)
“Muitos continuam convencidos de
que as luzes de advertência que estão piscando são causadas por interruptores
defeituosos e ciência ruim.” (pág 347)
“Os governos são nacionais e
competitivos, o que significa que a riqueza e o poder de cada nação separada
tendem a ser maiores nos cálculos políticos do que as necessidades do mundo
como um todo.” (pág 347)
“Será que veremos o surgimento de
estruturas governamentais globais que superem parcialmente os Estados-nação e
finalmente eliminem a ameaça nuclear?” (pág 349)
“Nossos descendentes migrarão
para além da Terra?” (pág 350)
“Construiremos máquinas muito
mais inteligentes do que nós? Se assim for, poderemos ter certeza de que
manteremos o controle delas?” (pág 350)
“Construiremos novos seres
humanos? Micro e macromelhorias nos tornarão biônicos, nos darão vida mais
longa e saudável e por fim nos transformarão em algo diferente, algo
transumano?” (pág 350)
“O destino final do planeta Terra
será decidido pela evolução do Sol. Ele viverá por cerca de 9 bilhões de anos.”
(pág 351)
“Por fim, até elas desaparecerão
à medida que a Terra for esterilizada e depois engolida e evaporada dentro das
camadas externas de uma estrela gigante vermelha cada vez mais instável e
imprevisível. Esse é o fim do planeta Terra e de quaisquer descendentes nossos
que ainda estiverem vivos, a menos que tenham viajado para os confins do
sistema solar ou para outros sistemas estelares. Quanto ao Sol, depois de um
longo período como gigante vermelha, acabará por soprar para longe suas camadas
externas, se transformará numa anã branca, migrará para o fundo do diagrama de
Hertzsprung-Russel e então ficará por ali, esfriando, por centenas de bilhões
de anos.” (pág 351)
“O que dizer do universo como um
todo? (...) o universo continuará se expandindo para sempre e o fará com
rapidez cada vez maior.” (pág 352)
“Mas num futuro muito distante,
zilhões de anos depois de termos desaparecido, a história se torna mais sombria,
literal e metaforicamente. O universo se expandirá cada vez mais rápido,
galáxias distantes desaparecerão como navios no horizonte do espaço-tempo e,
por fim, qualquer pessoa ou qualquer coisa que restarem em nossa galáxia se
sentirão seriamente sozinhas. (...) Nossa galáxia se transformará num cemitério
cheio de cinzas resfriadas de estrelas e planetas.” (pág 353)
“Mas ainda haverá coisas se
movendo no cemitério. Buracos negros vão sugar os restos das estrelas e
planetas. Quando terminarem de fazer isso, eles se voltarão uns contra os
outros em guerras civis canibais até que restem apenas alguns enormes buracos
negros inchados. Eles ficarão lá por períodos inimagináveis, talvez por ‘10
elevado a 100’ anos, e suarão energia até que finalmente eles também diminuam,
desapareçam e evaporem.” (pág 353)
“Chegaremos à conclusão de que
tudo o que parecia permanente em nosso universo era, na verdade, efêmero.
Talvez até o espaço e o tempo se revelem meras formas, meras ondulações num
multiverso maior. A entropia terá finalmente destruído toda a estrutura e
ordem. Pelo menos em um universo. Mas talvez existam outros para continuarmos
trabalhando.” (pág 353)