No livro “Deus, uma história
humana” (Editora Zahar, 2017), o escritor e estudioso da religião Reza Aslan
baseia-se em profundos estudos arqueológicos e neurocientíficos pra investigar
as origens e caminhos que a crença em Deus percorreu na história da humanidade,
e, em particular, os motivos que levaram à construção dessa imagem humanizada
de Deus, tão comum e disseminada há tanto tempo e, em particular, nos dias
atuais.
O autor alerta, no começo da obra,
que seu objetivo não é questionar ou provar a existência de Deus, mas sim
buscar entender de onde vem essa tendência tão marcante em todas as religiões
(e mesmo fora delas) de enxergar Deus como uma espécie de ser humano
aperfeiçoado, alguém capaz de ouvir nossas preces e de atender a algumas delas,
seguindo critérios bem humanos.
O tema em si é interessantíssimo.
Pessoalmente, sempre tive grande atração pelo assunto. Confesso que me intriga
essa fé fervorosa que algumas pessoas exibem, com claras demonstrações de
“conversas” com Deus e de “ouvir” o que Ele lhes diz. Esse formato nunca se
encaixou na minha capacidade de ver a questão.
Aslan foi fundo nos estudos
arqueológicos mais antigos disponíveis pra buscar os primeiros sinais de culto
a uma divindade, ainda antes do Homo Sapiens dominar a cena. Associando esses
estudos com outros dados científicos e com reflexões próprias, sugere que o
impulso de humanizar a divindade vem de muito longe, e nasce da necessidade
humana mais elementar, tanto há milhões de anos atrás quanto ainda hoje, de ter
alguém que ouça nossas súplicas.
Na verdade, afirma ele, é quase
uma questão de praticidade: pra que serviria um Deus com quem não pudéssemos
nos comunicar?
No decorrer da obra o autor busca
também entender as diferenças entre as religiões politeístas e as monoteístas,
e por que essas últimas prevaleceram sobre as primeiras. Bem como investiga
detalhes dos escritos bíblicos e das discussões e acordos realizados na
antiguidade a fim de se “definir” que conceitos seriam adotados e
oficializados, em relação ao tema.
Faz também relações entre o estabelecimento
das religiões e questões históricas cruciais no desenvolvimento da humanidade,
como a passagem da situação de caçador-coletor para a de agricultor, dentre
outras.
E também busca fazer correlações
do assunto entre diversas formas do conhecimento, como a filosofia e a ciência,
assim como entre as diversas religiões.
Penso que há sempre uma grande
incongruência quando se aborda essa questão de Deus, que é a nossa limitação
óbvia de entendimento de um tema tão vasto e complexo. Tenho por premissa que
esse é um assunto definitivamente incognoscível, e justamente por isso fico
abismado com a facilidade e suposta convicção com que muitas pessoas tratam o
tema.
Poder-se-ia argumentar que essa
“visão” de Deus não é uma questão de conhecimento, mas de fé, e não vou aqui
entrar nessa polêmica, mas só como uma rápida pincelada, a mim parece que
querer levar a discussão para esse âmbito parece mais uma fuga do que
propriamente um esclarecimento ou argumento válido.
Na verdade, não apenas Deus, mas
a própria vida (humana), o universo e o tempo me parecem elementos
completamente fora da nossa capacidade de alcance. Penso que o mínimo que
deveríamos fazer ao tratar qualquer um desses temas é sermos humildes, e
estarmos abertos a várias hipóteses, mas no mundo real não é bem assim que
funciona.
Ao final, o autor propõe uma
visão panteísta de Deus, segundo a qual tudo o que temos, somos e o que nos
cerca é Deus. Deus não seria o criador do mundo e da vida, Ele seria o próprio
mundo e a vida. É uma mudança e tanto de abordagem em relação à visão tradicional,
que certamente vale ser considerada.
A obra é muito mais vasta e
argumentativa do que esse rápido comentário, que tem por objetivo apenas despertar
o interesse para o assunto e para o próprio livro. Com certeza vale a pena a
leitura e reflexão.
Transcrevo, a seguir, algumas
passagens que destaquei da obra, a título de ilustração desse breve comentário.
“O que Feuerbach parecia dizer é que o apelo quase universal de um Deus
que olha, pensa e sente, e age exatamente como nós, está enraizado em nossa
profunda necessidade de experimentar o divino como um reflexo de nós mesmos.”
(pág 8)
“O que a grande maioria de nós pensa quando pensa em Deus é uma versão
divina de nós mesmos: um ser humano, mas com poderes sobre humanos.” (pág 9)
“Não tenho interesse em provar a existência ou inexistência de Deus
pela simples razão de que não há prova para nenhum dos casos. A fé é uma
escolha. (...) Opta-se – ou não – por acreditar que existe algo além do domínio
material.” (pág 9)
“Este livro é um apelo para pararmos de colocar nossas compulsões
humanas sobre o divino e desenvolvermos uma visão mais panteísta de Deus. (...)
Quer você acredite em um deus ou muitos deuses, ou em deus algum, somos nós que
formamos Deus à nossa imagem, e não o contrário. E nessa verdade está a chave
para uma forma de espiritualidade mais madura, mais pacífica e primeva.” (pág
11)
“Adão e Eva parecem saber intuitivamente que são almas encarnadas. É
uma crença tão primitiva e inata, tão profundamente enraizada e generalizada, que deve ser considerada nada
menos que a marca característica da experiência humana.” (pág 17)
“(...) a fonte do impulso religioso e os comportamentos que surgiram
dele se inserem na crença desconcertante e enigmática da humanidade na alma
separada do corpo – crença que, de uma forma ou de outra, surgiu em todas as
sociedades, em todas as culturas e ao longo de todos os tempos.” (pág 34)
“Max Muller (...) acreditava que o as primeiras experiências religiosas
da humanidade foram o resultado de encontros com a natureza.” (pág 35)
O etnólogo britânico Robert Marett denominou esse sentimento de
assombro supernaturalismo: “A atitude de espírito ditada pela admiração do misterioso.”
(pág 35)
(Fonte da imagem: Google)
“A teoria de Durkheim, de que a religião surgiu como uma espécie de
aglutinante social, um meio de promover a coesão e manter a solidariedade entre
as sociedades primitivas, continua a ser a explicação mais ampla para as
origens do impulso religioso.” (pág 39)
“A crença religiosa, escreveu Freud em ‘O futuro de uma ilusão’,
‘nasceu da necessidade humana de tornar tolerável seu desamparo’.” (pág 40)
“O filósofo escocês David Hume escreveu que ‘a religião primária da
humanidade surge principalmente de um medo ansioso.” (pág 41)
“Feuerbach definiu Deus como o ‘sentimento de vontade’ que brota de
nossos corações. ‘Aquilo de que o homem precisa... isso é Deus’.” (pág 41)
“Como escreveu o grande antropólogo norte-americano Clifford Geertz: ‘A
religião provavelmente perturbou os homens tanto quanto os confortou”. (pág 41)
“O cientista cognitivo Paul Bloom realizou anos de pesquisa sobre como
a religião e as crenças religiosas afetam os pontos de vista morais. Sua
conclusão é que há pouca evidência de que as religiões do mundo tem um efeito
importante em nossas vidas morais.” (pág 42)
“Apesar de tudo o que achamos que sabemos, a evidência indica que a
religião não faz as pessoas serem boas ou más.” (pág 43)
“Mas, se isso é verdade, se não há vantagem adaptativa no impulso
religioso e, portanto, nenhuma razão evolutiva direta para que ele exista,
então, por que surgiu a religião?” (pág 43)
“Em seus termos mais simples, o Hadd (Dispositivo Hipersensível de
Detecção de Agente, na sigla em inglês) os leva a detectar a ‘agência’ humana
e, portanto, uma causa humana por trás de um evento inexplicável.” (pág 46)
“A ciência cognitiva da religião começa com uma premissa simples: a
religião é antes de tudo, e principalmente, um fenômeno neurológico. O impulso
religioso, em outras palavras, é em última instância uma função de reações
eletroquímicas complexas no cérebro.” (pág 46)
“Todo impulso – todo impulso, sem exceção – é gerado por reações
eletroquímicas no cérebro.” (pág 46)
“A teoria da mente não nos obriga apenas a pensar os outros nos mesmos
termos que usamos para pensar nós mesmos. Ela nos encoraja a usar anos mesmos
como modelo primário para a forma como concebemos os demais.” 9pág 47)
“Pense nisso: se a única consciência de que tenho ciência é a minha
própria, então não tenho escolha senão usar-me como modelo para minha
compreensão do universo. Minha percepção dos estados internos de outros seres
humanos baseia-se no meu próprio estado interno.” (pág 47)
“Se parece comigo, a teoria da mente me leva a pensar que deve ser como
eu.” (pág 48)
(Fonte da imagem: Google)
“O Hadd e a teoria da mente explicam como surge uma crença religiosa
específica. Mas não explicam como essa crença é transmitida com sucesso de
crente para crente, de cultura em cultura, de século em século.” (pág 49)
“De acordo com o antropólogo cognitivo Pascal Boyer, nossos cérebros
permitem que apenas certos tipos de crença “permaneçam”. Sua pesquisa mostra
que estamos mais propensos a absorver, reter e compartilhar uma ideia se ela
for levemente anômala.” (pág 49)
“Na história da religião existe uma anomalia particular – um conceito
minimamente contraintuitivo – que ultrapassou todos os outros, resultando no
que é inquestionavelmente, sozinha, a crença religiosa mais bem sucedida, mais
memorável, significativa e útil já concebida pelos seres humanos. Trata-se do
conceito de ‘Deus-homem’ – um ser humano ligeiramente alterado de alguma forma,
que exibe habilidades físicas ou mentais ampliadas, que pode ser invisível, ou
estar em todos os lugares em todos os momentos, que conhece o passado e o
futuro, que sabe tudo. Um ser humano que é, em outras palavras, um deus.” (pág
51)
“(...) de onde veio a ideia da alma? A resposta verdadeira é que não
sabemos. Parece claro, no entanto, que a crença na alma talvez seja a primeira
crença da humanidade. Na verdade, se a teoria cognitiva da religião está
correta, foi a crença na alma que levou à crença em Deus. A origem do impulso
religioso, em outras palavras, não está enraizada em nossa busca de significado
ou em nosso medo do desconhecido. Não nasce de nossas reações involuntárias
diante do mundo natural. Não é uma consequência acidental do funcionamento
complexo de nossos cérebros. Ela é resultado de algo muito mais primitivo e
difícil de explicar: nossa crença arraigada, intuitiva e inteiramente sensitiva
de que somos, o que quer que sejamos além disso, almas encarnadas.” (pág 53)
“Nós somos a lente através da qual entendemos o universo e tudo o que
há nele. Aplicamos nossa experiência pessoal a tudo que encontramos, seja
humano ou não. Ao fazê-lo, não só humanizamos o mundo, humanizamos os deuses
que achamos que o criaram.” (pág 62)
“(...) o que estimulou a transição da caça para a agricultura ? A
descoberta de Gobekli Tepe e outros locais de devoção similares no antigo
Oriente Próximo sugere que foi o nascimento da religião organizada.” (pág 68)
“Assim, o que começou como um impulso cognitivo inconsciente para
moldar o divino à nossa imagem – para lhe dar a nossa alma – gradualmente se
tornou, durante os 10 mil anos seguintes de desenvolvimento espiritual, um
esforço consciente para tornar os deuses cada vez mais humanos – até que,
finalmente, Deus tornou-se literalmente humano.” (pág 70)
“O ato de escrever sobre os deuses, de ser forçado a descrever em
palavras como eles eram, transformou a maneira pela qual os imaginávamos e
também tornou consciente e explícito nosso desejo inconsciente e implícito de
fazer os deuses à nossa própria imagem.” (pág 76)
“O panteão dos deuses indo-europeus foi construído do mesmo modo que na
Mesopotâmia e no Egito, deificando-se as forças da natureza.” (pág 83)
“Ao empenhar-se no ‘deus-uno’, esses pensadores gregos tentavam
redefinir Deus como substância pura, como a realidade subjacente que permeia
toda a criação. Eles tentavam suprimir ativamente o desejo de humanizar o
divino a favor de uma concepção mais primitiva e animista de deus: um deus
desumanizado, sem forma, corpo, personalidade ou vontade; um deus que, como
veremos, poucas pessoas na Grécia ou em qualquer outro lugar do mundo haviam
tido interesse em adorar.” (pág 88)
“É surpreendente que (...) o que hoje reconhecemos como monoteísmo,
isto é, a crença em um único deus singular, exista há apenas cerca de 3 mil
anos.” (pág 97)
(Fonte da imagem: Google)
“O monoteísmo, entenda-se, não é definido como o único culto de um deus:
isso se chama monolatria e é um fenômeno bastante comum na história da
religiões. O monoteísmo significa o culto único de um deus e a negação de todos
os outros deuses.” (pág 97)
“O que a mente antiga parecia disposta a aceitar era a existência de um
“Deus Superior” todo-poderoso, abrangente, que atuava como a principal
divindade sobre um panteão de deuses inferiores igualmente dignos de adoração.
Essa crença se chama henoteísmo, e logo se tornou a forma dominante de
expressão espiritual não só no antigo Oriente Próximo, mas em quase todas as
civilizações do mundo.” (pág 99)
“O problema que Akhenaton e Zaratustra enfrentaram é que as pessoas
geralmente têm dificuldade em se relacionar com um deus que, sem
características ou atributos humanos, também não possui necessidades humanas.
Se um deus não tem nenhuma forma, atributo ou qualidade humana , então, como os
seres humanos devem se conectar e se comunicar com ele? A própria noção de um
deus desumanizado contradiz o processo cognitivo pelo qual a concepção de deus
teve origem. Seria com tentar imaginar o inimaginável, como conjura uma imagem
de um ser que não tem imagem. É muito escorregadio e irreal para se lidar com
ele.” (pág 104)
“E então, todos os argumentos históricos contra a crença em um único deus
foram repentinamente varridos pelo desejo irresistível de sobreviver dessa
pequena e insignificante tribo semítica. ‘Eu sou Javé e não há outro. Eu formo
luz e crio escuridão, asseguro a paz e crio o mal. Eu, javé, sou o criador de
todas as coisas’ (Isaías 45:6-7). Esse é o nascimento do judaísmo tal como o
conhecemos.” (pág 121)
“O Deus que, em última análise, surge do exílio babilônico não é a
divindade abstrata que Akhenaton adorou. Não é o puro espírito animador que
Zaratustra imaginou. Não é a substância sem forma do universo descrita pelos
filósofos gregos. Esse era um novo tipo de Deus, tanto singular quanto pessoal.
Um Deus solitário sem forma humana que, no entanto, fez os seres humanos à sua
imagem. Um deus eterno e indivisível que exibe toda a gama de emoções e
qualidades humanas, boas e más.” (pág 121)
“Mas então João faz algo completamente inesperado. Ele afirma que essa
força primitiva é realmente um homem. De fato, todo o propósito do Evangelho de
João é demonstrar como a essência abstrata, eterna e divina da criação, que é
tanto separada de Deus quanto única com Deus, foi manifestada na Terra sob a
forma de Jesus Cristo. ‘E o logos se fez carne e habitou entre nós’ (João
1:14).” (pág 123)
“A humanização do divino e a divinização do ser humano são dois lados
da mesma moeda.” (pág 125)
“O que fez a deificação de Jesus diferente tinha menos a ver com ele do
que com a divindade que se dizia ser por ele incorporada. Pois enquanto todos
os outros deuses-homens do antigo Oriente Próximo eram considerados uma das
muitas manifestações humanas de um de muitos deuses, Jesus era considerado a
única manifestação humana do único Deus no universo.” (pág 126)
“Que tipo de Deus, ele [Marcião] se perguntava, faria um mundo tão
miserável – um mundo de carência, destruição, inimizade e ódio? Jesus não
disse: ‘Você os conhecerá por seus frutos’ (Mateus 7:16)? Se isso fosse
verdade, os frutos desse Deus pareceriam apodrecidos até o âmago. A única
resposta que fazia sentido para Marcião era que devia haver dois deuses: o deus
criador cruel da Bíblia hebraica, conhecido como Javé, Deus de Israel, e o Deus
amoroso e misericordioso, que sempre existiu como logos, mas que fora revelado
ao mundo pela primeira vez na forma de Jesus Cristo.” (pág 128)
“No final, foi Agostinho de Hipona (354-430 d.C.), o homem que, mais
que qualquer outro, moldaria a teologia cristã no mundo ocidental, quem teve a
última palavra. Deus é Uno, Agostinho declarou em sua obra prima ‘Sobre a
Trindade’. Deus é eterno e imutável. Mas, embora isso seja verdade, Deus existe
sob três formas: Pai, Filho e Espírito Santo. Nenhuma dessas formas está
subordinada à outra. Todas compartilham a mesma medida da divindade. As três
existiram no início dos tempos. E se essa ideia causar confusão, se ela desafiar
lógica e razão, se parece contrariar a própria definição de Deus, então é
tarefa do crente aceita-la como mistério e seguir em frente.” (pág 136)
(Fonte da imagem: Google)
“O que é Deus? Essa questão está no centro da busca humana do sentido
do divino desde o início. Deus é a força animadora que liga todos os seres
vivos, como nossos antepassados pré-históricos pareciam acreditar? Ou é a
natureza deificada, como pensavam os primeiros mesopotâmicos? Ou é uma força
abstrata que permeia o universo, como alguns filósofos gregos o descreveram? Ou
é uma divindade personalizada que olha e age como ser humano? Ou deus é
literalmente um ser humano?” (pág 151)
“(...) se, no início, não existisse nada além de Deus, como Deus
poderia ter criado algo, a menos que tivesse criado isso de si mesmo? E se Deus
criou a partir de si mesmo, isso não violaria a unicidade e a unidade de Deus,
por dividir deus entre o criador e a criação? A solução de Ibn al-Arabi para o
problema foi confirmar o que os sufis como Shams e Bayazid haviam dito todo o tempo: se Deus é
indivisível, então nada pode existir que não seja também Deus. (...) Portanto,
Deus deve ser, em essência, a soma total de toda existência.” (pág 151)
“Na verdade, para a maioria dos sufis, o erro do cristianismo não
consiste em violar a natureza indivisível de Deus transformando-o em ser
humano; antes, reside em acreditar que Deus é apenas um ser humano particular e
nenhum outro. De acordo com o sufismo, se Deus é verdadeiramente indivisível,
então deus é todos os seres, e todos os seres são Deus.” (pág 152)
“Deus não é o criador de tudo o que existe. Deus é tudo o que existe.”
(pág 152)
“Existe um termo moderno para essa concepção do divino: panteísmo, que
significa ‘Deus é tudo’ ou ‘tudo é Deus’. Na sua forma mais simples, o
panteísmo é a crença de que Deus e o universo são um e o mesmo – nada há fora
da existência necessária de Deus. Como o filósofo panteísta Michael P. Levine
diz: ‘Nada pode ser substancialmente independente de Deus, porque não há senão
Deus’. Em outras palavras, o que chamamos mundo e o que chamamos Deus não são
independentes ou distintos.” (pág 154)
“Pense em Deus como uma luz que passa por um prisma, refratando-se em
cores incontáveis. As cores individuais parecem diferentes umas das outras, mas
na realidade são as mesmas. Elas têm a mesma essência. Têm a mesma fonte. Dessa
forma, o que na superfície parece separado e distinto é de fato uma realidade
única, e essa realidade é o que chamamos Deus.” (pág 154)
(Fonte da imagem: Google)
“(...) pode-se encontrar a mesma crença em quase todas as tradições
religiosas. O panteísmo existe no hinduísmo, tanto nos Vedas quanto nos
Upanishads, mas particularmente na tradição Vedanta, que argumenta que somente
o brâman (realidade absoluta) é real, tudo o mais é ilusão.” (pág 155)
“Mesmo no cristianismo, a religião humanizadora por excelência,
encontram-se tendências panteístas nas obras dos pensadores místicos, como
Mestre Eckhart, que escreveu: ‘Deus é ser e dele vem diretamente tudo o que é’.”
(pág 155)
Pode-se chegar ao panteísmo não pela religião, mas pela filosófica. O
filósofo racionalista Baruch Spinoza (1632-1677 d.C.) é visto como
popularizador do panteísmo no Ocidente por argumentar que, como não poderia
haver mais que uma ‘substância’ com atributos infinitos no universo, quer essa
substância se chame Deus ou Natureza, ela deve existir como realidade única e indiferenciada.”
(pág 155)
“Também é possível ignorar completamente Deus e mirar a ciência e sua concepção
unificadora da natureza; na conservação da energia e da matéria, na natureza
inseparável das duas, o fato inalterável é que tudo o que existe hoje sempre
existiu e sempre existirá enquanto o próprio universo existir.” (pág 156)
“Para mim, e para inúmeros outros, ‘o Um’ é o que chamo de Deus. Mas o
Deus em quem acredito não é um Deus personalizado. É um Deus desumanizado: um
Deus sem forma material; um Deus que é pura existência, sem nome, essência ou
personalidade.” (pág 156)
“As pessoas não sabem como se comunicar com um Deus que não possui
características, qualidades ou necessidades humanas. (...) Talvez, em lugar de
nos preocuparmos com a tentativa de formar uma relação com Deus, devemos nos
tornar plenamente conscientes da relação que já existe.” (pág 156)
“Passei a maior parte da minha vida espiritual tentando superar o
abismo que eu imaginava existir entre mim e Deus, seja por meio da fé, seja por
estudos ou por uma combinação dos dois. Acredito agora que não há abismo porque
não há distinção entre nós. Eu sou, na minha realidade essencial, Deus
manifesto. Todos nós somos.” (pág 156)
“Como crente e panteísta, adoro Deus não com medo temor, mas com
reverência e admiração pelo funcionamento do universo – pois o universo é Deus.”
(pág 156)
“Reconheço a divindade do mundo e de todo ser nele existente, e respondo
a todos e a tudo como se fossem Deus – porque o são. E eu entendo que a única
maneira de conhecer verdadeiramente Deus é confiando na única coisa que eu
realmente posso conhecer: a mim mesmo. (...) ‘Quem conhece sua alma conhece o
seu senhor’.” (pág 157)
“Se permanecemos crentes, essa é, mais uma vez, nada mais, nada menos
que uma escolha. Pode-se escolher ver a crença universal da humanidade na alma
como nascida de confusão ou raciocínio falho: um truque da mente ou um acidente
de evolução. Na verdade, pode-se acreditar que tudo – o big bang, a
distribuição do espaço e do tempo, o equilíbrio entre massa e energia, etc. – é
apenas um acidente com átomos. A criação pode ter se originado puramente por
processos físicos que não refletem nada mais que a articulação das propriedades
mais básicas de matéria e energia – sem causa, valor ou propósito. Essa é uma
explicação perfeitamente plausível para a existência do universo e de tudo que
nele há. É de fato tão plausível – e tão impossível de provar – quanto a
existência de um espírito animador que está na base do universo, que une as
almas, sua, minha e de todos os demais – talvez de tudo o mais - , do que é,
foi ou tenha sido uma vez.” (pág 158)
“Acredite em Deus ou não. Defina Deus como você quiser. (...) Você é
Deus.” (pág 158)
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