Onze dias de remo e histórias de vida
Participação na Travessia "Três rios para una aventura",
promovida pelo Clube Náutico Yapú Guazú, de Corrientes
(em parceria com Rogério e Bernadete Baggio)
Essa viagem nasceu de um convite
do amigo Rogério Baggio, de Curitiba, que há alguns meses lançou um livro
contando suas várias expedições ao longo de 900 km pelo Rio Iguaçu, no Paraná
(a respeito do qual fiz neste blog um breve comentário, há algumas semanas, disponível neste link: "Destino Cataratas do Iguaçu"). Essas
suas histórias, vividas ao lado de sua esposa, Bernadete, chegaram ao conhecimento
dos nossos “hermanos” argentinos, que passaram então a convida-los para
participar da Expedição “Três rios para una
aventura”.
Rogério e Bernadete
No decorrer dos últimos dois meses
viemos conversando sobre como implementar a nossa participação nessa instigante
jornada. Primeiro decidimos que iríamos, depois passamos a pensar em como
fazê-lo. Uma das questões mais importantes era como levar os nossos barcos, já
que o ponto de concentração para a remada ficava na cidade de Corrientes,
distante cerca de 1.300 km de Curitiba. E como a Bernadete também iria,
tínhamos que levar os três caiaques.
A princípio isso não seria problema. Bastava acomoda-los bem sobre o carro e encarar a estrada. O entrave é que existe uma limitação legal quanto a tamanho de carga que pode ser transportada sobre carros, e a legislação argentina é diferente da brasileira. Considerando o tamanho dos nossos barcos e o do carro que utilizaríamos a questão que restava era que os barcos excediam em pouco mais de meio metro o limite permitido (os para choques traseiros do veículo).
Havia a alternativa de alugar os caiaques com a organização do evento, o que nos pouparia o trabalho e os riscos do transporte, mas acabamos achando que não era o caso de optar por essa solução, em função dos possíveis problemas que isso poderia acarretar, como a nossa dificuldade de adaptação a um barco que não conhecíamos. Assim, decidimos finalmente por transporta-los sobre o carro mesmo e contar com a “boa vontade” da fiscalização argentina em compreender a situação.
A princípio isso não seria problema. Bastava acomoda-los bem sobre o carro e encarar a estrada. O entrave é que existe uma limitação legal quanto a tamanho de carga que pode ser transportada sobre carros, e a legislação argentina é diferente da brasileira. Considerando o tamanho dos nossos barcos e o do carro que utilizaríamos a questão que restava era que os barcos excediam em pouco mais de meio metro o limite permitido (os para choques traseiros do veículo).
Havia a alternativa de alugar os caiaques com a organização do evento, o que nos pouparia o trabalho e os riscos do transporte, mas acabamos achando que não era o caso de optar por essa solução, em função dos possíveis problemas que isso poderia acarretar, como a nossa dificuldade de adaptação a um barco que não conhecíamos. Assim, decidimos finalmente por transporta-los sobre o carro mesmo e contar com a “boa vontade” da fiscalização argentina em compreender a situação.
Carro do Rogério, transportando os barcos
Havia ainda outras questões em
aberto. O fato é que mesmo depois de pesquisar tudo o que foi possível,
tínhamos várias dúvidas sobre como seria o evento. O que sabíamos é que era um raid coletivo, do qual participariam
dezenas de caiaquistas, e já estava em sua 28ª edição.
A proposta do Clube Náutico Yapu Guazú, organizador da empreitada, era percorrer 650 km pelos Rios Bermejo, Paraguay e Paraná (daí o nome “3 rios para una aventura”), ao longo de 15 dias, com um dia de descanso, acampando todas as noites.
O Clube oferecia a logística de alimentação de café da manhã e jantar, além da estrutura de segurança, acompanhamento médico e o planejamento em si da viagem. Todo o restante deveria ficar a cargo de cada participante.
Mas não conseguimos obter respostas para detalhes importantes, como quadro climático predominante na região, possibilidade de ressuprimento de itens de alimentação e água ao longo da travessia, como seriam os locais de pernoite, etc.
A proposta do Clube Náutico Yapu Guazú, organizador da empreitada, era percorrer 650 km pelos Rios Bermejo, Paraguay e Paraná (daí o nome “3 rios para una aventura”), ao longo de 15 dias, com um dia de descanso, acampando todas as noites.
O Clube oferecia a logística de alimentação de café da manhã e jantar, além da estrutura de segurança, acompanhamento médico e o planejamento em si da viagem. Todo o restante deveria ficar a cargo de cada participante.
Mas não conseguimos obter respostas para detalhes importantes, como quadro climático predominante na região, possibilidade de ressuprimento de itens de alimentação e água ao longo da travessia, como seriam os locais de pernoite, etc.
Banner com o projeto da travessia estilizado
Colocamos as dúvidas na conta do
espírito de aventura e resolvemos encarar a brincadeira na base do lema “o que vier nóis traça”! [risos]
O fato de ser um evento coletivo,
com bastante gente participando, era também algo que me preocupava, pois não é
exatamente o meu tipo de ambiente favorito. Mas pensei que às vezes é preciso
sair um pouco da tal zona de conforto pra conhecer coisas e pessoas novas, e
assim avaliei que valeria a pena fazer a investida.
Inscrição em um dos caiaques da travessia
Além do mais, o Rogério foi
extremamente gentil em me convidar como carona em seu carro, o que facilitou extremamente
o meu custo dessa logística, digamos assim. Era, enfim, uma oportunidade
valiosa de ter uma experiência diferente fazendo uma atividade das mais
prazerosas – remar e curtir a natureza.
Cumprimos a longa viagem de
Curitiba a Corrientes, no norte da Argentina, em dois dias, quase sem
incidentes. Apesar da cuidadosa e detalhista amarração dos barcos sobre o
carro, em um momento um deles se soltou dos suportes e começou a cair pela
lateral do carro! Paramos imediatamente e reforçamos a amarração. Felizmente
não passou do susto.
Outro problema foram as intervenções da policia caminera, que por duas vezes nos parou para fiscalizar a questão do tamanho dos barcos excedendo o limite permitido. Nas duas ocasiões o Rogério usou de toda sua paciência e capacidade argumentativa e conseguiu reverter a intenção inicial de aplicar multa ou outra providência mais drástica para “apenas” uma advertência verbal.
Outro problema foram as intervenções da policia caminera, que por duas vezes nos parou para fiscalizar a questão do tamanho dos barcos excedendo o limite permitido. Nas duas ocasiões o Rogério usou de toda sua paciência e capacidade argumentativa e conseguiu reverter a intenção inicial de aplicar multa ou outra providência mais drástica para “apenas” uma advertência verbal.
Chegando a Corrientes tivemos
certa dificuldade para encontrar um hotel que atendesse às nossas necessidades
de qualidade e preço justo, além do detalhe de ter garagem que permitisse a
entrada do carro com os barcos em cima (em função da altura do aparato todo).
Dedicamos os próximos dois dias a
conhecer o Clube Yapu Guazú, sede do evento, e a esclarecer um pouco mais
alguns detalhes do que estávamos nos propondo a fazer, além de deixar os barcos
para serem transportados para o ponto de início da remada, comprar suprimentos
de alimentação e acertos finais de logística.
Além disso, o Rogério foi convidado
a fazer a apresentação do seu livro para alunos da Universidade de Resistência,
cidade vizinha, o que ocorreu na noite do primeiro dia que passamos por lá.
No dia 1º de setembro pela manhã
juntamo-nos finalmente ao grupo do qual faríamos parte nas próximas duas
semanas. Esse foi um dia de deslocamento. Deixamos o carro no Clube e,
embarcados em um ônibus, seguimos para o local em que teria início a expedição,
uma pequena cidade distante cerca de seis horas de viagem.
Pessoal reunido à saída do Clube, em Corrientes (1º Set)
O tempo estava incrivelmente frio
e cinzento, com uma chuva fina nada animadora. Chegamos à Vila Rio Bermejito no
meio da tarde e instalamo-nos no camping municipal, montando nossas barracas
sob a cobertura de um galpão que havia por lá, pra fugir um pouco da garoa que
insistia em cair.
Um chazinho quente, pra tentar esquentar um pouco, no primeiro acampamento (1º Set)
Esse primeiro contato com o
aspecto grupal da expedição foi, como imaginava, um tanto desafiante. Nesses
momentos o aconchego da solidão da barraca é um prazer muito bem vindo.
A noite foi gelada, o que foi uma
surpresa, pois não era o que esperávamos. Entretanto ficamos sabendo que se
tratava de uma extraordinária frente fria, que em breve se dissiparia e
teríamos tempo bom pela frente.
Acordamos no primeiro
dia da expedição ainda sob uma fina garoa e sensação térmica nada
convidativa a atividades náuticas. Nessas horas estar em um grupo grande ajuda,
pois há uma energia boa no ar que dissipa qualquer eventual desânimo.
Pessoal reunido pouco antes de entrar no rio: começando a brincadeira (02 Set)
Esse primeiro embarque da carga
nos caiaques é sempre um desafio a ser vencido. Após longos e exaustivos
cálculos do que levar e do que não levar, era chegada a hora de acomodar tudo
nos restritos compartimentos de carga dos barcos. Aí me lembrei que havia feito
esse planejamento apenas mentalmente. Mas com um pouco de paciência e jeito
coube tudo e por volta das nove e meia da manhã, após um entusiasmado discurso
de boas vindas dos nossos colegas argentinos, estávamos prontos pra partir.
Logística: muito trabalho pra "encaixar" tudo
O começo se deu pelo Rio
Bermejito, afluente do Rio Bermejo, com o qual nos encontramos cerca de duas
horas depois e que seria nossa via de deslocamento por cerca de noventa por
cento do trajeto previsto.
Havia, nesse momento, cerca de
sessenta pessoas iniciando a expedição. Todos utilizavam caiaques do tipo oceânico
(nenhum, portanto, do tipo ‘sit on top’,
tão popular no Brasil).
Curioso também ver a expressiva quantidade de mulheres participando, mais ou menos à proporção de metade do total. A faixa etária era visivelmente de pessoas já bem vividas, delineando um perfil bem mais contemplativo e conservador do que propriamente esportivo.
Curioso também ver a expressiva quantidade de mulheres participando, mais ou menos à proporção de metade do total. A faixa etária era visivelmente de pessoas já bem vividas, delineando um perfil bem mais contemplativo e conservador do que propriamente esportivo.
Os amigos Bernadete e Rogério, curtindo as primeiras remadas
Uma coisa boa do caiaque é o fato de ser uma atividade, digamos, amigável. Basta um pouco de paciência e boa vontade que as coisas rapidamente vão encontrando seu lugar e seu ritmo, e quando se coloca o remo n’água e o barco desliza rumo afora parece que cristaliza-se uma certa magia, um prazer todo especial, uma sensação de paz difícil de encontrar em outros esportes e atividades. E então todo o esforço pra se chegar até ali parece de repente ter valido a pena. Bom demais esse negócio!
Parada técnica para descanso
Confluência do Rio Bermejito com o Bermejo
A paisagem se mostrou algo
desoladora, talvez por causa do céu cinzento. Nesse dia fizemos apenas 20 km,
como forma de adaptação à mecânica da remada.
Deu pra sentir o ritmo em que as coisas se desenvolveriam. A equipe da organização deixava todos muito à vontade, cada um seguindo a sua tocada, sem pressa e sem pressão.
Deu pra sentir o ritmo em que as coisas se desenvolveriam. A equipe da organização deixava todos muito à vontade, cada um seguindo a sua tocada, sem pressa e sem pressão.
Chegamos ao local do acampamento
no começo da tarde. Havia ali umas três ou quatro casas bem simples, onde
vendiam água, cerveja e biscoitos. Acabamos almoçando um peixe ensopado em uma
dessas barraquinhas, já que estava à mão.
À tarde conhecemos três remadores
de quem já havíamos ouvido falar – Eduardo Narvaja, José Gomez e Pablo Garcia. Os
três já estavam no local desde o dia anterior, e vinham remando havia vinte e quatro dias
desde a Bolívia, tendo percorrido mais de 1.100 km até então. Se juntariam à
expedição a partir dali e, ao seu final, seguiriam remando por mais 700 km até
o seu destino final. Três pessoas com histórias e atitude especiais pra
compartilhar, com quem batemos longos papos.
Rogério e Bernadete conversando com o Pablo Garcia e Eduardo Narvaja (02 Set)
O Pablo era o mais jovem dos
três. Com 36 anos de idade, era o cozinheiro oficial da equipe. Conversamos por
mais de uma hora sobre suas técnicas de preparo de comida em ambientes outdoor, equipamentos, soluções para
pequenas questões logísticas, etc. Quando lhe perguntei que tipo de comida
preparava, ele respondeu com convicção: “comida gourmet”. Disse que fazia pizzas, carnes, panquecas, tudo ao ar
livre, sem maiores complicações. Mostrou-me seu caiaque e comentou que iniciou a
viagem com suprimento de alimentação para vinte e quatro dias, para os três membros da
equipe – carnes salgadas embaladas a vácuo, legumes in natura, farinha de trigo, etc. Uma verdadeira aula!
O José Gomez (59) tinha a
história peculiar de se fazer acompanhar por um cachorro, que navega com ele no
caiaque desde os três meses de idade (e tinha agora quase sete anos). Bom de papo,
contou-me detalhes de suas outras expedições, do seu caiaque e até de sua vida
pessoal. Revelou-me ainda como fazia para transportar o Benito (o cachorro) num
espaço tão exíguo como o de um caiaque (modus
operandi que eu veria pessoalmente nos próximos dias).
José Gomez e seu cachorro Benito: dupla dinâmica!
O Eduardo Narvaja, com 73 anos de
idade, é um decano da canoagem argentina. Uma lenda viva. Contou-me que já
navegou, em caiaque, cerca de trinta mil quilômetros, em diversas expedições, por diversos
rios, muitas vezes sozinho. De voz suave e olhar atento, é dessas pessoas que
cativam a atenção e tem uma energia especial. Ao longo dos próximos dias
teríamos excelentes conversas sobre suas viagens, sobre aspectos da vida, etc.
Ele escreve um blog em que conta um pouco de suas expedições e aventuras –
segue o link: Eduardo Narvaja Canotaje
Fim de tarde
O segundo dia amanheceu ainda cinzento, mas à tarde as nuvens começaram a se dissipar e o céu azul voltou a animar a luminosidade ambiente. Remamos 45 km nesse dia, totalmente sem pressa, saindo às 09:45 h e chegando às 17:10 h.
Preparando pra partir, na manhã do segundo dia (03 Set)
Começamos a entender um pouco
melhor o ritmo do grupo e a nos adaptar a ele. Não havia horários rígidos. Na
véspera perguntamos a um dos coordenadores qual seria o horário de saída no dia
seguinte. “Mais ou menos às nove...”, ele respondeu, naquele tom que sugere que
isso não era uma questão importante. Ao amanhecer do dia, cada um ia acordando,
saindo de suas barracas e já começavam as rodas de chimarrão.
O desjejum oferecido pela organização ficava pronto pouco depois, e consistia de água quente, com a qual podia-se preparar café solúvel, leite (em pó) ou fazer um chá, e pão.
Depois começava-se a desmontar acampamento, carregar tudo nos caiaques e então cada um ia zarpando a seu tempo, sem ordens ou maiores coordenações.
O desjejum oferecido pela organização ficava pronto pouco depois, e consistia de água quente, com a qual podia-se preparar café solúvel, leite (em pó) ou fazer um chá, e pão.
Depois começava-se a desmontar acampamento, carregar tudo nos caiaques e então cada um ia zarpando a seu tempo, sem ordens ou maiores coordenações.
Paisagem à beira do Rio Bermejo (03 Set)
O almoço era por conta de cada
um. Nós calculamos e nos preparamos pra fazer um lanche rápido (à base de pão,
queijo e salame), mas percebemos que nossos colegas de expedição tinham hábitos
diferentes. A parada pra almoço, normalmente por volta de uma hora da tarde, transformava-se
quase num outro acampamento. As pessoas montavam cadeiras, mesas, fogareiros, faziam comidas substanciosas, sempre em alegres rodas de conversas
e salutar convivência. Depois ainda tinha a hora da siesta, que, em função do calor que sempre fazia nessa hora, se
prolongava até umas duas e meia, às vezes três da tarde.
O Kayapó no seu caminho (03 Set)
Remadores em ação no Rio Bermejo (03 Set)
Nesse dia fez um belo fim de tarde,
e a partir daí o tempo se firmou e tivemos uma animadora sequencia de vários dias
ensolarados e céu perfeitamente azul, que contribuíram muito para elevar o
moral e dar um colorido especial à árida paisagem marginal.
Terminada a jornada diária, cada um
tratava de montar sua barraca, às vezes banhar-se nas águas do rio, e
naturalmente se reuniam pra contar histórias, conversar, dar risadas, unidos
pelo infalível chimarrão, até a hora do jantar, que ocorria por volta das 21 h.
É incrível o espírito gregário dos nossos irmãos argentinos! São extremamente unidos e fica claro que curtem muito essas oportunidades de fazer o que estávamos fazendo.
É incrível o espírito gregário dos nossos irmãos argentinos! São extremamente unidos e fica claro que curtem muito essas oportunidades de fazer o que estávamos fazendo.
Como era a 28ª edição dessa
travessia, havia muitos que já a haviam feito outras vezes, assim como havia
entre eles muitos laços de amizade que vinham de fora da canoagem, o que dava
ao grupo um ambiente muito familiar.
O terceiro dia amanheceu com o
sol despontando firme no horizonte, compondo um cenário muito bonito com a
névoa da manhã sendo dissipada aos poucos pela luz do dia, com o rio correndo
suave ali do lado. Foi mais um dia sem pressa, com saída apenas às 10:30 h e
chegada ao próximo acampamento às 15:00 h.
Nascer do sol (04 set)
O Rio Bermejo e seus arredores inóspitos
Conversa com os colegas de expedição, no final de tarde
O jantar desse dia foi em um
clube de pesca que havia próximo de onde estávamos. Churrasco tipo fogo de
chão, com muita conversa, cerveja, música e até um “arrasta pé” improvisado num
cantinho do galpão. A festa se estendeu até depois das 23:00 h.
No quarto dia saímos um pouco
mais cedo, às 09:30 h, e o percurso foi um
pouco mais longo (48 km). Na parada para o almoço juntei-me aos amigos
expedicionários Eduardo Narvaja e José Gomez, e tivemos uma ótima conversa
sobre expedições, bem como sobre a vida fora desse contexto. Compartilhamos
nossas refeições e nossas experiências, cada um interessado na visão de mundo
do outro. Muito bacana.
Eduardo Narvaja, compartilhando o almoço e histórias (05 Set)
Bernardo Leucke, em seu estilo próprio
Rogério Baggio
Bernadete Baggio
Miguel Quiña, um dos diretores do Clube Yapú Guazú
Pablo Garcia, o terceiro membro da equipe que vinha remando desde a Bolívia
José Gomez e o cão Benito
(Remo de madeira, muito comum entre os argentinos.
Tem como vantagem não atrair raios, como o de carbono (?))
(Remo de madeira, muito comum entre os argentinos.
Tem como vantagem não atrair raios, como o de carbono (?))
Eduardo Narvaja, o decano
(Caiaque na cor marrom, para se camuflar à beira do rio,
nos acampamentos solitários.)
(Caiaque na cor marrom, para se camuflar à beira do rio,
nos acampamentos solitários.)
Eduardo Narvaja (73) e Nicolas Persico (17) remando juntos - escola da vida
Curvas do Rio Bermejo
Os locais de acampamento eram previamente determinados pela organização, e eram normalmente em praias
à beira do rio, em locais que pudessem comportar a quantidade de
pessoas que compunham o grupo.
Nesses primeiros dias eram acampamentos totalmente “rústicos”, sem qualquer estrutura urbana. Mais à frente paramos também em alguns campings das cidadezinhas do caminho, mas esses eram tão simples quanto esses no meio do nada.
Nesses primeiros dias eram acampamentos totalmente “rústicos”, sem qualquer estrutura urbana. Mais à frente paramos também em alguns campings das cidadezinhas do caminho, mas esses eram tão simples quanto esses no meio do nada.
Fim de tarde no Rio Bermejo (05 set)
Companheiros chegando ao acampamento no finalzinho da tarde (05 Set)
Os jantares dependiam do lugar
onde estávamos. Sempre que possível, a organização procurava apoio de alguma
estrutura local, o que às vezes rendia uma refeição mais bem elaborada. Mas nos
acampamentos mais isolados o esquema era “jantar de campanha”, feito pelo
cozinheiro do grupo, num único panelão, sem requinte algum, mas suficiente para
a situação.
O quinto dia marcou o final da
primeira etapa da expedição, que estava dividida “didaticamente” em três. A
essa primeira fase chamaram “etapa ecológica”, a segunda, de mais cinco dias,
era a “etapa esportiva”, e a terceira e última, de quatro dias, seria a “histórica”.
Cada uma dessas etapas terminava
numa cidadezinha com um pouco mais de estrutura e havia ali várias pessoas que
deixavam a expedição, assim como outras que se incorporavam a ela. Nem todos
fizeram todos os quinze dias previstos, pelos motivos pessoais de cada um.
Começo de mais um dia (06 Set)
Benito, o cão navegador (muito bem equipado)!
Nesse último dia dessa primeira fase
remamos 37 km e chegamos à pequena cidade de Presidência Roca sob aplausos e
vivas da população local. Instalamo-nos no camping
local, à beira do rio, onde havia sempre muita circulação de pessoas do
vilarejo.
Chegada em Presidência Roca
Reunião de caiaques!
Acampamento em Presidência Roca (06 Set)
Os caiaques junto ao rio, em Presidência Roca (06 Set)
Fim de tarde no Rio Bermejo, em Presidência Roca (06 Set)
O dia seguinte foi de descanso. À
noite houve uma elaborada celebração chamada de “Festival Provincial de Canotaje de Travesia”, com muita gente do
povoado, música alta (até a meia noite!), apresentações de dança e teatro,
comidas típicas, etc.
Durante o dia fez muito calor e
havia muita poeira no ar. Comecei a sentir um pouco de dor de garganta e uma
leve dor no corpo, que era o prenúncio de uma gripe ou algo do tipo que ainda
iria me incomodar muito nos próximos dias.
Calçada em Presidência Roca: calor, ar seco e muita poeira
Foi bom dar uma parada para
reorganizar um pouco as coisas, mas, a rigor, seria melhor estar remando. A pouca privacidade do acampamento onde ficamos não
permitiu exatamente um descanso reparador, como seria desejável.
Em compensação, tivemos oportunidade de ir conhecendo outros membros da expedição, como o simpático Carlos Vaccarezza, que estava acompanhando a viagem no seu bote inflável a motor. Contou-me que estava fazendo a cobertura jornalística do evento, para o programa de TV a cabo que ele produz há 27 anos – chamado “A Toda Costa”! Muito interessantes suas histórias de vida.
Disse-me que sua “equipe” é ele e sua esposa. Nessa viagem ele estava fazendo toda a cobertura sozinho – filmava, fotografava, pilotava o barco, dava apoio aos canoístas que precisavam de alguma coisa e nitidamente se divertia com todo o processo. Comentou que já esteve várias vezes no Brasil, que já rodou 980 mil km com uma única moto (!!!), e outras histórias incríveis. Muito boa a conversa.
O Rogério escreveu um texto em homenagem a ele, em reconhecimento à sua atitude e espírito profissional:
"Encerrada a 28ª edição da “Travessia 3 Rios para una aventura”, realizada de 02 a 16 de setembro no Chaco argentino com a participação majoritária de argentinos, e minoritária de um uruguaio, três brasileiros e três paraguaios, totalizando quase uma centena de “raidistas”, faz-se necessário referenciar a excepcional atuação de CARLOS VACCAREZZA.
Profissional “periodista” da cidade de Rosário, produtor e apresentador do programa semanal “A Toda Costa” da televisão argentina, Carlos acompanhou a difícil e extenuante travessia, auxiliando a equipe organizadora do evento.
Integrou-se aos “raidistas” conhecendo cada um deles pelo nome e pela cidade e país de origem. Acompanhando-os nas atividades em terra e de navegação, cuidadoso e inteligente, teve a exata percepção do estado de saúde, do estado psicológico e das condições físicas individuais e coletivas dos canoístas.
Experiente, com seu barco a motor percorria a extensa flotilha colorida e, quando percebia algo perigoso e não rotineiro no rio ou no comportamento de alguém, alertava e fazia abordagens prestando esclarecimentos e oferecendo ajuda. Intensificou esses cuidados quando parte dos canoístas foi acometida de forte gripe com brônquio espasmos.
Não raro, cobrindo eventos de aventura, vê-se jornalistas interferindo e tentando impor aos aventureiros um script que facilite seu trabalho e que sirva exclusivamente aos seus propósitos. Isso fazendo, adulteram a essência do evento e causam um desserviço ao jornalismo. Esse não é o estilo do nosso homenageado.
Sutil, preciso e perceptivo, Carlos Vaccarezza cobriu o evento sem dar a perceber que o fazia. Foi o amigo, o apoiador e o companheiro de todos os “raidistas”.
A você Carlos, o nosso reconhecimento e o nosso muito obrigado; “muchas gracias”. Foi muito bom conhece-lo."
(Rogério João Baggio e Maria Bernadete Baggio)
Acampamento em Presidência Roca (06 Set)
Em compensação, tivemos oportunidade de ir conhecendo outros membros da expedição, como o simpático Carlos Vaccarezza, que estava acompanhando a viagem no seu bote inflável a motor. Contou-me que estava fazendo a cobertura jornalística do evento, para o programa de TV a cabo que ele produz há 27 anos – chamado “A Toda Costa”! Muito interessantes suas histórias de vida.
Disse-me que sua “equipe” é ele e sua esposa. Nessa viagem ele estava fazendo toda a cobertura sozinho – filmava, fotografava, pilotava o barco, dava apoio aos canoístas que precisavam de alguma coisa e nitidamente se divertia com todo o processo. Comentou que já esteve várias vezes no Brasil, que já rodou 980 mil km com uma única moto (!!!), e outras histórias incríveis. Muito boa a conversa.
Carlos Vaccarezza
(imagem retirada do Facebook)
O Rogério escreveu um texto em homenagem a ele, em reconhecimento à sua atitude e espírito profissional:
"Encerrada a 28ª edição da “Travessia 3 Rios para una aventura”, realizada de 02 a 16 de setembro no Chaco argentino com a participação majoritária de argentinos, e minoritária de um uruguaio, três brasileiros e três paraguaios, totalizando quase uma centena de “raidistas”, faz-se necessário referenciar a excepcional atuação de CARLOS VACCAREZZA.
Profissional “periodista” da cidade de Rosário, produtor e apresentador do programa semanal “A Toda Costa” da televisão argentina, Carlos acompanhou a difícil e extenuante travessia, auxiliando a equipe organizadora do evento.
Integrou-se aos “raidistas” conhecendo cada um deles pelo nome e pela cidade e país de origem. Acompanhando-os nas atividades em terra e de navegação, cuidadoso e inteligente, teve a exata percepção do estado de saúde, do estado psicológico e das condições físicas individuais e coletivas dos canoístas.
Experiente, com seu barco a motor percorria a extensa flotilha colorida e, quando percebia algo perigoso e não rotineiro no rio ou no comportamento de alguém, alertava e fazia abordagens prestando esclarecimentos e oferecendo ajuda. Intensificou esses cuidados quando parte dos canoístas foi acometida de forte gripe com brônquio espasmos.
Não raro, cobrindo eventos de aventura, vê-se jornalistas interferindo e tentando impor aos aventureiros um script que facilite seu trabalho e que sirva exclusivamente aos seus propósitos. Isso fazendo, adulteram a essência do evento e causam um desserviço ao jornalismo. Esse não é o estilo do nosso homenageado.
Sutil, preciso e perceptivo, Carlos Vaccarezza cobriu o evento sem dar a perceber que o fazia. Foi o amigo, o apoiador e o companheiro de todos os “raidistas”.
A você Carlos, o nosso reconhecimento e o nosso muito obrigado; “muchas gracias”. Foi muito bom conhece-lo."
(Rogério João Baggio e Maria Bernadete Baggio)
Também bati um bom papo com um
rapaz de Mar del Plata (cidade
litorânea ao sul de Buenos Aires), Nicolas Persico, de 17 anos de idade, que
estava participando da expedição com seu pai e sua irmã, de apenas 14 anos
(aliás, completados em um daqueles primeiros dias da viagem, com direito a
bolo, “parabéns” e muita festa no acampamento).
O seu pai remava um caiaque duplo (com a filha à frente e ele atrás), e ele um individual. Contou-me que era a segunda vez que estava fazendo essa travessia (a primeira foi em 2016), e que eles curtem também viagens de bicicleta, que já tinham outras viagens programadas para breve e coisa e tal. Linda família!
O seu pai remava um caiaque duplo (com a filha à frente e ele atrás), e ele um individual. Contou-me que era a segunda vez que estava fazendo essa travessia (a primeira foi em 2016), e que eles curtem também viagens de bicicleta, que já tinham outras viagens programadas para breve e coisa e tal. Linda família!
Os Persico - a família de Mar del Plata
No sétimo dia retornamos ao rio e
à nossa “rotina” de remar. Senti fortemente o impacto da inflamação na garganta,
que se instalara na véspera – aquela sensação de falta de energia, dor no corpo
e, no final do dia, febre. Remamos 42 km nessa jornada.
O lado bom ficou por conta do lindo dia de sol e do local em que montamos acampamento, uma simpática praia completamente isolada de qualquer vestígio de civilização. Depois da noite tumultuada da véspera, curtir o silêncio da beira do rio no final da tarde e à noite foi um luxo muito bem vindo.
Nascer do sol (08 Set)
Nascer do sol (08 Set)
Pessoal empenhado no resgate de uma vaca atolada na beira do rio (08 Set).
Essa situação ocorreu umas três vezes, ao longo da travessia.
O lado bom ficou por conta do lindo dia de sol e do local em que montamos acampamento, uma simpática praia completamente isolada de qualquer vestígio de civilização. Depois da noite tumultuada da véspera, curtir o silêncio da beira do rio no final da tarde e à noite foi um luxo muito bem vindo.
Acampamento (08 Set)
Acampamento (08 Set)
Belo acampamento à beira-rio (08 Set)
Cores!
Estar na natureza, em um ambiente
aberto, fazendo uma atividade tão lúdica como remar, é certamente muito legal,
mas, como tudo na vida, tem o seu preço. Evidentemente as condições de
conforto, higiene e alimentação são muito precárias, e esse contexto vai se somando
com o passar dos dias. A gente acaba aprendendo que é preciso buscar sempre um
estado de homeostase nas situações que vivemos. No entanto, esse é um precioso
estado nem sempre fácil de ser mantido.
Estar integrado ao ambiente, divertir-se com as situações, viver o presente, sem ansiedade em querer chegar logo ou que acabe logo, são alguns conceitos necessários nessas situações. Talvez ‘adaptabilidade’ seja o atributo chave! Muito bacana na teoria, mas viver esses desafios na prática costuma não ser tão fácil, ainda que seja muito instigante.
Estar integrado ao ambiente, divertir-se com as situações, viver o presente, sem ansiedade em querer chegar logo ou que acabe logo, são alguns conceitos necessários nessas situações. Talvez ‘adaptabilidade’ seja o atributo chave! Muito bacana na teoria, mas viver esses desafios na prática costuma não ser tão fácil, ainda que seja muito instigante.
O oitavo dia foi uma remada curta
de apenas 29 km. Às 13:30 h já estávamos no nosso local de destino, um camping junto a uma espécie de
restaurante rural, na localidade de El
Colorado. Música muito alta, muito calor e a garganta ainda doendo não
compuseram uma boa combinação para o descanso da tarde.
A Bernadete também não estava se sentindo bem, com sintomas de tosse e dores no corpo. À noite tivemos um jantar um pouco mais caprichado, feito pelo pessoal local. A música alta, no entanto, prosseguiu até tarde, tornando-se muito inconveniente para a situação.
A Bernadete também não estava se sentindo bem, com sintomas de tosse e dores no corpo. À noite tivemos um jantar um pouco mais caprichado, feito pelo pessoal local. A música alta, no entanto, prosseguiu até tarde, tornando-se muito inconveniente para a situação.
Nessas várias noites em que
passamos acampados, bem como nos diversos momentos ao longo dos dias, houve
inúmeras oportunidades pra conversar com as pessoas e se aproximar de algumas
delas. Acho que esse viés do relacionamento humano foi o ponto alto dessa
viagem, mais até, talvez, do que a curtição de remar, de apreciar a paisagem e
da vivência interior. Há pessoas incríveis por aí!
Em determinado momento conversei,
por exemplo, com o Norberto “El Paton” Luna, que era o homenageado dessa edição
da Travessia “3 rios para una aventura”. 68 anos de idade, com uma perna
amputada (usando prótese), roupas e barco gastos, semblante marcado pelas
adversidades da vida, com um leve sorriso constantemente nos lábios, me recebeu
super bem desde o primeiro “olá” que lhe disse, engatando uma franca conversa
como se nos conhecêssemos há anos.
Contou-me que vinha remando várias semanas antes de se juntar à expedição, e que continuaria cerca de vinte dias mais após o término, sozinho. Falou sobre sua paixão pelo caiaque de travessia, sobre sua vida, seus filhos (um servindo como padre católico em Manaus, no Brasil, outro como guia de montanha na região do Aconcágua, na Argentina), seus planos para o futuro. Quando lhe perguntei como fazia para lidar com as dificuldades do caminho quando estava sozinho, em função de sua limitação de locomoção, disse apenas que “tudo tem solução”, e que lidava com “um problema de cada vez”. Facilmente emocionável, chegou às lágrimas ao falar sobre o prazer que tinha de estar entre amigos, fazendo o que gostava. Camarada de espírito forte e alma leve!
Norberto Luna
Contou-me que vinha remando várias semanas antes de se juntar à expedição, e que continuaria cerca de vinte dias mais após o término, sozinho. Falou sobre sua paixão pelo caiaque de travessia, sobre sua vida, seus filhos (um servindo como padre católico em Manaus, no Brasil, outro como guia de montanha na região do Aconcágua, na Argentina), seus planos para o futuro. Quando lhe perguntei como fazia para lidar com as dificuldades do caminho quando estava sozinho, em função de sua limitação de locomoção, disse apenas que “tudo tem solução”, e que lidava com “um problema de cada vez”. Facilmente emocionável, chegou às lágrimas ao falar sobre o prazer que tinha de estar entre amigos, fazendo o que gostava. Camarada de espírito forte e alma leve!
Em outro momento me chamou a
atenção um caiaque meio diferente parado à beira do rio. Aproximei-me e notei
que era um barco realmente diferenciado, feito de lona em estrutura de madeira.
O dono, Gaston, estava próximo, e percebendo minha curiosidade, aproximou-se,
mostrando-se disponível à conversa. Contou-me então que ele próprio havia
construído o caiaque, cujo projeto havia comprado de um engenheiro naval na
Inglaterra. Mostrou-me detalhes da construção e algumas vulnerabilidades do
equipamento, como o risco da lona ser rasgada por galhos ou pedras. Mais uma
história peculiar a ser apreciada!
Outra pessoa com quem conversei várias vezes e que merece destaque é a Silvia Córdoba: 67 anos de idade, triatleta, corredora de montanha, estava fazendo essa travessia pelo 18º ano consecutivo! Animada, simpática, sempre alegre, sempre valorizando o que estávamos vivendo, é um verdadeiro exemplo de atitude positiva e temperamento aguerrido. Foi um prazer conhecê-la.
Gaston e seu caiaque construído por ele próprio
Outra pessoa com quem conversei várias vezes e que merece destaque é a Silvia Córdoba: 67 anos de idade, triatleta, corredora de montanha, estava fazendo essa travessia pelo 18º ano consecutivo! Animada, simpática, sempre alegre, sempre valorizando o que estávamos vivendo, é um verdadeiro exemplo de atitude positiva e temperamento aguerrido. Foi um prazer conhecê-la.
Silvia Cordoba: energia e disposição de sobra!
Silvia Cordoba no seu caiaque, seguindo em frente
O nono dia da travessia estava previsto para ser mais longo do que o habitual. Por isso deixou-se um pouco de lado a tranquilidade dos dias anteriores e às cinco e meia da manhã alguém “deu a alvorada” no acampamento. A intenção era que todos estivessem na água, saindo, às sete, “para evitar chegar à noite no próximo destino”, disseram. Acabamos saindo, mais ou menos todos juntos, às sete e meia.
O pessoal da organização evitava
falar em distância a ser percorrida. Preferiam usar como referência o tempo.
Assim, falavam em dez horas de remada para esse dia, incluindo as paradas. Maurício,
encarregado de coordenar a frente da flotilha, se fez mais presente nessa
jornada, cuidando pra regular mais os tempos de parada pra descanso, inclusive
para o almoço (apenas uma hora).
Parada técnica (10 Set, 12:16 h)
Foi um longo dia de remada
concentrada e introspectiva. Às seis da tarde avistei o local do acampamento. O
GPS marcava 69,5 km remados. Felizmente dei uma recuperada da gripe que me
incomodara nos dias anteriores e, com isso, tive um bom desempenho na jornada.
Final de tarde de um longo dia (10 Set)
Pôr do sol (10 Set)
Um pouco mais tarde tivemos um
bom jantar servido no galpão de uma instalação que havia cerca de um quilômetro
distante do local do acampamento. Dessa vez, sem música alta e sem maiores
invenções.
Décimo dia: retornamos à rotina
de horários mais folgados, com saída às 09:00 h e paradas pra descanso mais
descontraídas. A previsão era de “cinco a seis horas” de remo (no final,
chegamos ao nosso destino às 16:00 h, com 40 km remados). O tempo continuava
fantasticamente aberto, com um sol decidido, sem nenhuma nuvem no céu.
Preparando pra partir (11 Set)
Começando mais um dia (11 Set)
Nessa jornada, aproveitando os
longos períodos de silêncio e de estar sozinho em meio ao grupo, me diverti “revisitando”
memórias de passagens da minha vida, conduzindo a mente para cada fase que
vivi, cada cidade, pessoas, momentos. Incrível como o tempo passou rápido com
essa tática, e como essa questão do passado parece estranha, de certo ponto de
vista. Será mesmo que passei por tudo aquilo? Por que certos acontecimentos
permanecem na memória, enquanto outros simplesmente somem com o passar do
tempo? E aquela fase, que parecia que não ia passar nunca, hoje parece tão distante... (Boas) Lembranças trazem um ar de nostalgia, mas também,
de certa forma, de conquista e de satisfação com a vida [as lembranças “não tão
boas”... melhor nem lembrar... rsrsrs].
Mais um acampamento (11 Set)
Neste dia montei minha base dentro da mata, com direito a rede (11 Set)
Fim de tarde dourado (11 Set)
A próxima jornada marcaria o final
da segunda etapa. Saímos, como de costume, pouco depois das nove horas. O tempo
estava estranho, um pouco diferente dos dias anteriores. Céu um pouco nublado,
mas ainda muito quente.
Imagina-se que remar rio abaixo
seja fácil, que basta deixar a correnteza nos levar, mas, na verdade, não é bem
assim. De fato a correnteza ajuda, evidentemente, mas de forma irregular e só
um pouco. Há partes do rio que correm mais rapidamente e outras que são mais
estagnadas. É preciso entender como essa dinâmica funciona para se posicionar
de forma mais eficaz em certos momentos, como nas curvas, por exemplo. Às vezes
é melhor fazer uma curva mais aberta, aproveitando melhor a correnteza, do que
querer “cortar caminho” e pegar um trecho de água mais parada.
De qualquer forma, é preciso remar com certo vigor, porque apenas a “velocidade gratuita” da correnteza não é capaz de nos proporcionar a dinâmica necessária para cumprir as metas diárias. A média de velocidade ficava em torno de 7,5 a 9 km/h, dependendo do dia e das condições da água.
De qualquer forma, é preciso remar com certo vigor, porque apenas a “velocidade gratuita” da correnteza não é capaz de nos proporcionar a dinâmica necessária para cumprir as metas diárias. A média de velocidade ficava em torno de 7,5 a 9 km/h, dependendo do dia e das condições da água.
Bernadete e seu caiaque Chuí
Havia também, no Rio Bermejo,
vários locais com bancos de areia, que, se abordados inadvertidamente representavam
certa dificuldade ao deslocamento, isso quando não era necessário desembarcar e puxar o
barco para águas mais profundas.
As águas do rio, com se observa nas fotos, eram muito barrentas, assim como suas margens. No entanto, eram águas limpas, do ponto de vista de poluição urbana.
As águas do rio, com se observa nas fotos, eram muito barrentas, assim como suas margens. No entanto, eram águas limpas, do ponto de vista de poluição urbana.
Começando mais um dia (12 Set)
Às duas da tarde chegamos ao
nosso destino do dia. Percebia-se nitidamente certo cansaço coletivo no grupo.
Nosso local de acampamento era um camping
na localidade de Puerto Eva Peron. A
tarde estava muito quente, com aquele ar abafado, característico de mudança de
clima, que, soubemos em seguida, realmente estava prevista.
Camping na localidade de Puerto Eva Peron (12 Set)
Precisávamos comprar alguns itens
de alimentação para os próximos dias, pois nosso pequeno estoque de variedades
estava acabando. Assim, o Rogério e eu pegamos um “taxi informal” com o dono de
um barzinho que havia ali perto e fomos à cidade, distante alguns quilômetros,
fazer umas compras. Nesse ínterim senti que não estava lá muito bem... Um pouco
de dor de cabeça e novamente aquela sensação de fraqueza.
Retornando ao acampamento, fui a
uma tenda onde estavam fazendo o acompanhamento médico dos raidistas e fiz uma rápida consulta com os enfermeiros que lá estavam. Estava com febre novamente. Tomei um antitérmico e me recolhi
à barraca, para descansar.
Por volta das oito da noite
chamaram para o jantar, que foi servido num salão de um centro de convivência
local. Estava sem fome, muito embora não tivesse comido nada de consistente ao
longo de todo o dia. Estava também com forte dor de cabeça e aquela sensação de
que aquilo estava ficando sem graça... E o jantar ainda se transformou em um
evento, com discursos, agradecimentos, entrega de diplomas àqueles que estavam
encerrando sua participação e coisa e tal.
De volta ao acampamento, logo depois,
sentamos juntos - o Rogério, a Bernadete e eu - para avaliar a situação com calma. A Bernadete estava tomando remédios e com indicação médica para não fazer esforço pelo menos nos próximos
dois dias. Não haveria como ela prosseguir na próxima etapa. Além disso estávamos todos bastante cansados. Em função disso, o
Rogério achou melhor encerrar a sua participação, a fim de poder dar o
necessário apoio à esposa.
Eu decidi aderir à retirada da expedição, porque realmente não estava bem e avaliei que seria quase irresponsável prosseguir na base do risco (de não recuperar do quadro inflamatório e necessitar apoio médico onde poderia não haver).
Eu decidi aderir à retirada da expedição, porque realmente não estava bem e avaliei que seria quase irresponsável prosseguir na base do risco (de não recuperar do quadro inflamatório e necessitar apoio médico onde poderia não haver).
Assim, tratamos de coordenar o nosso
retorno e o dos nossos barcos ao Clube Yapú Guazú no dia seguinte e demos por
encerrada nossa participação na travessia.
Tomar esse tipo de decisão,
nesses momentos cruciais, é sempre difícil. Havia muitas variáveis a serem
consideradas. No fundo, no fundo, fica sempre a questão do orgulho de não
querer abdicar de um plano que havia sido traçado. Por outro lado, havia
critérios de bom senso e de segurança a serem respeitados. Visto em retrospecto, acho que foi a decisão certa.
No dia seguinte retornamos a Corrientes, o Rogério dirigindo o carro de um camarada que havia iniciado a
travessia naquele ponto e precisava de alguém pra levar o carro dele de volta à
cidade. Conforme previsto, choveu o dia inteiro em toda a região.
Ainda me senti indisposto, com
picos de febre e com uma insistente tosse por mais dois dias, mas depois disso
comecei a recuperar aos poucos.
No final das contas fica a grata
satisfação de ter participado dos onze dias dessa bela travessia. Sobretudo
devido às pessoas que tive oportunidade de conhecer e histórias de vida compartilhadas.
O que se constata, numa vivência como essa, é que os limites e referências humanos são mesmo muito relativos e pessoais. Quando a gente pensa que está fazendo algo arrojado e inovador, descobre que há pessoas muito à frente nesse caminho, e essa percepção é extremamente valiosa no sentido de nos fazer reavaliar os próprios critérios e pontos de vista.
O que se constata, numa vivência como essa, é que os limites e referências humanos são mesmo muito relativos e pessoais. Quando a gente pensa que está fazendo algo arrojado e inovador, descobre que há pessoas muito à frente nesse caminho, e essa percepção é extremamente valiosa no sentido de nos fazer reavaliar os próprios critérios e pontos de vista.
Agradeço sinceramente ao amigo Rogério
e sua esposa Bernadete, pelo convite e pelo apoio irrestrito durante a viagem. Conviver
com vocês nesses dias foi uma experiência totalmente gratificante. Que
nossa amizade prospere e que possamos fazer parceria para outros projetos!
Meu muito obrigado também a todos
que participaram da Expedição e com quem tive oportunidade de conviver em algum
momento. Vocês construíram essa história!
Viva a vida!
Veja, no link abaixo, um vídeo sobre a expedição:
- Itinerário dia-a-dia
Dia - data - trajeto - km remados - tempo total (incluindo paradas)
Dia 1 - 02 Set - Villa Rio Bermejito a Camping Pte Lavalle - 20 km - 3h 34min
Dia 2 - 03 Set - Camping Pte Lavalle a Parador Tio Cali - 46 km - 7h 23min
Dia 3 - 04 Set - Parador Tio Cali a Club Pira Yagua - 30 km - 4h 23min
Dia 4 - 05 Set - Club Pira Yagua a Estancia Las Lilas - 48 km - 7h 16min
Dia 5 - 06 Set - Estancia Las Lilas a Presidência Roca - 37 km - 7h 58min
Dia 6 - 07 Set - descanso em Presidência Roca
Dia 7 - 08 Set - Presidência Roca a Villa dos Trece - 42 km - 7h 44min
Dia 8 - 09 Set - Villa dos Trece a Camping El Colorado - 29 km - 4h 00min
Dia 9 - 10 Set - Camping El Colorado a Campo La Aurora - 69 km - 10h 30min
Dia 10 - 11 Set - Campo La Aurora a Los Limones - 40 km - 7h 04min
Dia 11 - 12 Set - Los Limones a Puerto Eva Peron - 34 km - 4h 40min
Total remado: 395 km
- Câmeras utilizadas:
- Canon EOS Rebel XTi (lentes 18-55mm/ 75-300mm)
- Nikon Coolpix AW 130
- Go Pro Hero 2
- Drone DJI Mavic
- Usei nessa viagem o caiaque da marca Ygará (site: http://www.ygaracaiaques.com.br/), modelo Kayapó, que possuo há já oito anos. Construído em fibra, com 5,5 m de comprimento e 24 kg de peso, só posso dizer que é um excelente barco, em todos os sentidos: espaçoso (tanto o cockpit quanto os compartimentos de carga), confortável, estável, veloz, resistente e... bonito [risos]. Cumpriu sua missão sem qualquer alteração ou ressalva. Esse é o barco!
"Há uma mágica nos rios.
Uma mágica móvel, um elemento vivo da própria terra,
pois seu começo é na terra,
das suas profundezas e de sua superfície."
(L. Gilpin)
A palavra caiaque significa 'barco de caça',
tendo sido desenvolvido pelas culturas
do Ártico norte-americano e da Groenlândia.
Para elas o caiaque era a sobrevivência.
Arqueólogos encontraram evidências sugerindo
que o caiaque tem pelo menos quatro mil anos.
Os caiaques eram justos ao corpo como uma luva,
de tal maneira que os remadores pudessem controla-lo.
Um barco frouxo no corpo era desastre na certa."
(A History of the kayak)
Gratidão
Força Sempre
Boa, mais uma bela história
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